Do mais pobre Estado da Índia, Orissa, tem chegado ao mundo a lição de que o sofrimento nunca é inútil. Vítimas de extremistas hindus, os Cristãos de Orissa têm-nos ensinado que o perdão sincero supera tudo. Mesmo a humilhação mais profunda. Namrata Nayak tem o rosto desfigurado pela explosão de uma bomba. Terá ela também perdoado aos seus agressores?

Namrata Nayak, de apenas 10 anos, estava aterrorizada. Desde o dia 24 de Agosto de 2008, que no Estado de Orissa, na Índia, os cristãos estavam a ser perseguidos, maltratados, agredidos e mortos. A onda de violência foi tão grande que milhares de pessoas fugiram para as florestas para salvar as próprias vidas, deixando tudo para trás, desprotegendo as suas casas, tudo o que tinham. Milhares de cristãos fugiram apavorados.

Minutos de terror

Namrata Nayak estava em casa, numa aldeia pequena e pobre, Panchayati Sahi. Tinham passado já dois dias desde que os ataques começaram. De repente, começam a ouvir gritos na rua, num crescendo de ódio que se percebia nas palavras, nos murros na porta da rua. Apavorada, Nayak e as irmãs escondem-se na casa de banho. As palavras são dela: “Eles entraram em nossa casa e foram destruindo tudo a cada passo. Eu e as minhas irmãs estávamos escondidas na casa de banho. Contínhamos a respiração com medo que nos descobrissem”. Calcula-se o terror destas crianças ainda com a imaginação sobressaltada pelos relatos tremendos que corriam de boca em boca, pelas histórias de vizinhos e amigos assassinados há apenas algumas horas, e ali, naquele instante, absolutamente indefesas, encolhidas a um canto.

De repente… uma explosão!

Lá fora, no resto da casa, percebia-se que estava tudo a ficar num pandemónio, móveis derrubados, loiça partida, tudo destruído. Cada estilhaço no chão aumentava o sobressalto das meninas. Até que tudo ficou em silêncio. Os gritos foram desaguando na rua, provavelmente a multidão iria agora descarregar a fúria noutra casa, noutra família Cristã. O silêncio ficou e as crianças resolveram entreabrir a porta. Uma pequena fresta apenas. Do que viam, confirmava-se tudo. Lá fora, era o caos. Mas, ao menos, não estava ninguém. Saíram. Tudo estava a arder. Não tinha bastado a destruição: era preciso acabar de vez com o sustento e a memória daquela família. Namrata Nayak dirige-se com as irmãs para a porta. Está assustada, em lágrimas. De repente, uma explosão. “Não me recordo de mais nada.”

Mapa da tragédia

Este poderia ter sido o fim da história. Mas não. Namrata foi levada para o hospital de Berhampur ainda inconsciente e gravemente ferida. Foram 45 dias a recuperar. O seu rosto ficou gravemente desfigurado com a explosão. A bomba foi deixada junto a uma cómoda pelos extremistas hindus. A explosão queimou o rosto de Namrata e cravou-se em estilhaços em grande parte do seu corpo. Ainda hoje, quatro anos depois, o rosto desta menina é uma cicatriz dessa violência terrível que se abateu sobre os Cristãos de Orissa. Namrata Nayak provavelmente nunca mais irá esquecer esse terrível dia 28 de Agosto de 2008. Basta olhar-se ao espelho, ou ir ao poço buscar água para se ver reflectida como se fosse ela própria o mapa de uma tragédia. Mas o espelho que lhe mostra as cicatrizes da bomba revela também um sorriso bonito e bondoso.

Oferecer o perdão

Namrata poderá nunca esquecer o que lhe aconteceu, mas já perdoou a quem lhe fez mal. Sempre que se aproxima o Natal, como agora, esta menina não se esquece. E agradece: “Natal é tempo de agradecer ao Menino Jesus que me salvou do fogo e salvou o meu rosto que estava ferido e desfigurado”.
Em Orissa não haverá uma família Cristã que não esteja enlutada por causa da onda de violência de 2008. Há imensas histórias incríveis de horror puro que se abateu sobre aquela comunidade. Mas o mais extraordinário de tudo é a forma serena como hoje estes Cristãos olham para trás e perdoam. Mulheres que foram violadas, que perderam os maridos, pais que ficaram sem os filhos, famílias despedaçadas. Todos eles perdoam. Como Namrata Nayak. Estes Cristãos ensinam-nos, com o seu exemplo, que o sofrimento nunca é inútil.