Artigos |
P. Duarte da Cunha
Tentar uma “compreensão radical da Nova Evangelização”
<<
1/
>>
Imagem

Dez anos depois da exortação apostólica Ecclesia in Europa, estamos em pleno Ano da Fé. A unir estes dez anos na vida da Igreja na Europa está a grande aventura da nova Evangelização. Como reavivar a fé naqueles que, sem terem perdido completamente uma certa relação com a Igreja, vivem como se Deus estivesse demasiado longe para ter que ver com a vida? A consciência desta missão, que se distingue do anúncio do Evangelho nos lugares onde nunca se ouviu falar de Jesus (missão ad gentes) e do empenho pastoral quotidiano nas paróquias e movimentos, nasce, de certo modo, com o Concílio Vaticano II, mas vai-se tornando cada vez mais evidente no magistério e na acção dos Papas, e de toda a Igreja Católica a partir dos anos 90.

Com a recente encíclica do Papa Francisco sobre a fé, mais uma vez somos colocados diante do facto que para um cristão anunciar e testemunhar a fé é parte integrante do ter fé. Não é possível acreditar em Jesus Cristo e ficar indiferentes a todos aqueles que procuram um sentido para a vida e que desejam uma vida verdadeira e vivem à margem da Igreja e da fé. Foi isso que também esteve na agenda da reunião dos Secretários Gerais das Conferências Episcopais da Europa que decorreu de 27 a 30 de Junho, em Varsóvia. Participaram 33 secretários vindos de toda a Europa, desde a Rússia à Irlanda, desde a Escandinávia a Malta. Apesar das muitas diferenças culturais e circunstanciais, a mesma paixão por Jesus Cristo e pela Sua Igreja e uma certa globalização do secularismo faz com que se torne muito evidente a prioridade que deve ser dada à Missão da Igreja.

A crise económica é mais um motivo para nos fazer pensar que falta Deus na vida e para renovar o empenho missionário dos crentes. Como dizia o secretário da Conferência Episcopal de Espanha, “se não queremos reduzir o homem a simples homo oeconomicus seu civicus, é preciso partir do pressuposto que na actual crise têm um certo papel – se não mesmo preponderante – problemas de outro género.” E, recordando Bento XVI, terminou a sua intervenção dizendo: “Sem Deus, o homem não sabe para onde ir e não consegue sequer compreender quem é. (…) O humanismo que exclui Deus é um humanismo desumano.”(Caritas in Veritate 78)

Numa tentativa sincera de procurar ter uma “compreensão radical da Nova Evangelização”, como propunha o secretário da Conferência Episcopal de Inglaterra, vemos que hoje, de modo ainda mais evidente do que há dez anos atrás, há uma sensação difusa de falta de esperança. Se a exortação apostólica de João Paulo II assentava toda ela na esperança, esta, de facto, como o Beato João Paulo II dizia, precisa de ser alicerçada não num optimismo social e económico mas na fé em Jesus Cristo. “Cristo é a nossa esperança”.

A nova Evangelização precisa de ser entendida como a urgente missão de reavivar a fé para que haja esperança. É certo que mesmo sem fé, ou seja, sem referência a Deus e sem acolhimento dos Seus dons, muita gente consegue pensar que tudo vai bem, desde que tenha dinheiro e saúde para não ter de pensar muito. Mas sem esperança nenhuma pessoa consegue viver? Então, a percepção da urgência da missão hoje nasce da descoberta da falta de esperança no nosso mundo. Como dar esperança aos nossos vizinhos e amigos? Com economia? Com sonhos? Mas o que me pode garantir uma economia, mesmo que esta fosse saudável e estivesse a crescer, que não seja apenas uma parte da vida? O ser humano, se queremos ser radicais – ou seja ir à raiz do significado da existência –, não se realiza plenamente apenas por ter muitas coisas ou por não ter problemas económicos. O completo bem-estar económico até podem levar a pessoa a ficar fechada em si e a esquecer os outros e os valores mais elevados que, de qualquer forma, o coração humano está sempre à procura. A pessoa para se realizar tem de estar aberta a Deus, ao futuro, aos outros. Aquele que se fecha a Deus também pensa que lhe basta disfrutar do presente sem empenho na construção do futuro e normalmente torna-se egoísta e fica indiferente ao outro.

O Papa Francisco disse-o de modo muito claro na sua recente visita a Lampedusa, “A cultura do bem-estar, que nos leva a pensar em nós mesmos, torna-nos insensíveis aos gritos dos outros, faz-nos viver como se fôssemos bolas de sabão: estas são bonitas mas não são nada, são pura ilusão do fútil, do provisório. Esta cultura do bem-estar leva à indiferença a respeito dos outros; antes, leva à globalização da indiferença.”

Na encíclica Lumen Fidei o Papa recorda, “fé, esperança e caridade constituem, numa interligação admirável, o dinamismo da vida cristã rumo à plena comunhão com Deus.” É preciso, portanto, que os cristãos, as comunidades e a Igreja toda sejam neste mundo sinal do outro mundo. A nova evangelização passa, por isso, por vivermos a fé numa relação pessoal com Jesus Cristo, para que a Sua graça nos transforme e possamos ser membros activos da comunidade cristã. A Igreja torna-se, assim, um farol para que todos os que têm a fé adormecida se sintam chamados a aportar e a redescobrir a exaltante vida da fé que enche de esperança e que reforça os laços sociais na verdade e na caridade. Esta pode ser a compreensão radical da nova Evangelização. Esta será a única possibilidade da Europa se tornar um continente de esperança.