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A Semana em Caparide
A Fé em Exercício!
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Mais de uma dezena de jovens, provenientes de toda a diocese, participaram, entre os dias 14 e 21 de julho, na Semana de Verão, promovida pelo Seminário de Caparide. Carlos Antunes foi um dos jovens que participou nesta atividade, deixando na primeira pessoa o seu testemunho.

 

“Completo na minha carne o que falta à paixão de Cristo” (Col. 1,24) foi o tema escolhido pela equipa formadora do Seminário Patriarcal de São José, em Caparide, para a semana de verão que pretendia acolher jovens provindos de vários pontos da Diocese de Lisboa, para convívio e aprendizagem com os seminaristas daquela casa.

O meu percurso tem um princípio remoto de vocação. Desde muito pequena idade que a minha vontade em servir a comunidade de cristãos que compõe a Igreja, se vem a notar. Todavia, como será comum a muitos outros, as responsabilidades familiares e o carreirismo da Sociedade em obrigar os jovens a ter um “ofício civil” que lhes dê uma profissão, foi-me afastando desta minha Mãe que é a Igreja.

Ainda assim, como o chamamento de Deus sempre me acompanhou, a vontade acabou por culminar na entrada definitiva na vida da Igreja e no contacto com Senhor Reitor do Seminário dos Olivais, Padre José Miguel, para que, no acolhimento que me quisesse fazer, pudesse vir a ter um início de caminho.

Neste encontro com o Padre José Miguel, as questões, os dilemas, as necessidades, surgem inevitavelmente e sobretudo a minha ideia que tenho muito a evoluir, desde logo para a começar a andar.

A Igreja não me abandonou! Foi perante este meu dilema vocacional que o Padre José me convidou a estar presente na semana de verão em Caparide com jovens cuja ideia vocacional também lhes ocupa a mente e com os irmãos seminaristas, cujos primeiros passos na vocação poderiam ser o empurrão que todos nós precisávamos.

Aceitei o convite e com a extrema alegria de quem era convidado a passar uma semana o mais próximo possível desta Igreja que me chama e que me ama.

 

Já na Semana em Caparide

A Semana começou no dia 14 de Julho e durou até ao Domingo seguinte dia 21. No dia combinado lá nos encontrámos: jovens sacerdotes, seminaristas e ‘semanistas’, com o objectivo de partilhar a nossa vida, ainda que pelo curto espaço de tempo que durava a semana, mas com a intensidade que a fé nos exigia.

O acolhimento foi tão fácil como simplesmente estar na presença das pessoas. Não foi necessário qualquer esforço para que encetássemos conversações uns com os outros e nos sentíssemos como conhecidos de longa data. É óbvio que nos primeiros dois dias tivemos o dilema, nomeadamente para mim, de adquirir a vida em seminário, suas regras e funções. Coisa que senti com facilidade porque a palavra caridosa e confortante dos irmãos seminaristas estava lá para me confortar (tal como a todos os outros) e ensinar.

Senti-me verdadeiramente em casa e comecei a experienciar um sentimento (que no final deu lugar a uma melancólica saudade própria da vida em sentimento) de total pertença àquele grupo. Ainda, há um momento daquela semana que muito contribuiu para este sentimento, cuja memória gostaria de partilhar com todos, não para que estas palavras possam resultar em muitas outras conversas que instruam na boa de forma de estar em Igreja, como, quem o sabe, possam servir de empurrão aos que também sentem esta voz que nos chama ou até, para aqueles que nunca colocaram a questão da vocação, para que reflitam sobre o tema, orando ao Senhor.

Como disse, há um momento desta semana que marca a minha presença lá e cuja mensagem me dá ânimo de continuar. É claro que aquela semana está repleta de coisas novas cujos ensinamentos poderíamos estar horas a discutir. Aprendi a ter uma relação mais pessoal e menos intermediada com o Senhor nosso Deus; compreendi como organizar o meu dia para dar ao Senhor o tempo que ele precisa de mim; pude experimentar a graça da Reconciliação com Deus pela confissão, sobretudo através de um treino no exame de consciência que me ajudou a encontrar as falhas na minha vida; compreender que a fraqueza não é má quando estou em perspectiva desta relação com Deus, pois só quando vivo (pretensamente) sozinho é que a fraqueza é um mal.

Permitam-me que diga só mais uma coisa relativamente a esta fraqueza que é força porque aprendi a sua razão de ser nesta semana que agora partilho convosco. A ideia de fraqueza sempre me foi de complexa compreensão, desde logo pelo peso que a palavra tem. Todavia, quando me comecei a integrar com os outros que compõem esta Igreja, percebi que no assumir da fraqueza está o ganho de ter Deus, mesmo que através do próximo, a elevar-nos à condição de fortes.

É-me difícil, nas palavras que a Humanidade me dá, em descrever verdadeiramente a alegria que sinto ao perceber que sou mais feliz servindo o outro do que sendo servido.

A Fé, para mim, não é algo que se aprende apenas com a educação, mas com a intervenção de Deus em nós, nem que seja através dos outros. Percebi que estava a tornar-me no homem novo quando me deparava com comportamentos meus que não me pertenciam, mas que sentia terem-me sido provocados pela mão de Deus. “Eu, sozinho, não agiria assim”, é uma das reflexões que muitas vezes faço. Como é bom sentir a existência de Deus em nós!

 

Caminhada de grupo

É tradicional, quando começamos a conversar com sacerdotes, seminaristas e amigos em geral, ouvirmos a referência a caminho. Constantemente apelamos à ideia de percurso, de caminho, de estrada, para nos referirmos ao encontro com Deus.

Ora, se a ideia no início era algo misteriosa para mim, começou a deixar-se entender com aquela terça-feira. De facto, a equipa formadora do Seminário não faz as coisas pelo acaso, mas, como nos corrigia o Padre José, pelo sinal. As coisas têm uma simbologia que vamos aprendendo quando as vivemos. Aqui percebi que a fé percebe-se quando a experimentamos.

Naquela agradável terça-feira fomos para as zonas rochosas entre Malveira da Serra e o Cabo da Roca. Paisagens absolutamente maravilhosas e simultaneamente assustadoras. A caminhada começou em direcção a uma pequena praia enterrada entre as falésias, cujo piso era de pedra, mas que permitia estar agradavelmente ao fresco do mar. Nesse momento, fui chamado pela primeira vez ao Senhor com a oração das Laudes. Cada um de nós, acompanhado pela Liturgia das Horas, dedicava aquele momento a Deus.

Posteriormente às Laudes tivemos oportunidade de tomar um banho naquelas águas de luz. Nova caminhada que começou com uma meditação nas palavras daLumen Fidei e apelo à reflexão solitária posterior, levou-nos a um ponto alto das rochas. O cansaço começou a fazer-se sentir desde logo pelo carácter consideravelmente acentuado da orografia. Parados que estávamos, iniciou-se a celebração da Eucaristia. Aqui foi um momento onde a alegria potenciava o lacrimejar, principalmente pela novidade daquela actividade. De facto, o celebrar a Eucaristia sobre o imenso azul foi um apelo a começar a compreender esta Igreja, potenciando a conclusão a que mais tarde chegarei.

Naquela Eucaristia que é ritualisticamente igual a tantas outras, tudo soube a novo, pelo escutar da palavra, o ouvir da homilia, o orar as preces ao Senhor ao ar livre onde o céu é o telhado deste grande templo que é o mundo. Cada um de nós trazia na sua mochila um elemento para que se celebrasse a Eucaristia e naquele momento juntamo-nos em contemplação.

Também naquele momento presenciei algo que me obrigou a pensar no que é participar no Corpo de Cristo que é a Igreja: um dos seminaristas, ao ver uma senhora que se encontrava perto do local escolhido para a missa, prontamente se resolveu a convidá-la a participar na mesma. É de facto um imenso amor que se sente nos seminaristas presentes. Uma caridade para todos, exortando-nos a participar com eles na cruz de Cristo.

Participados no Corpo e Sangue de nosso Senhor, ali ficamos por mais uns instantes para o almoço que cada um deslocava na sua mochila ou saco.

Após a refeição breve e simples, retomámos a caminhada, com paragens direccionadas à meditação e ao breve silêncio para mais do que compreender as palavras que eram dadas, tentar entranhá-las. Naquele momento senti como a partilha com Deus pode acalmar todas as dores e pode ajudar-nos a compreender a experiência que vivemos.

Já a caminhada ia longa e, na altura, já as forças se tinham derramado pelas encostas acidentadas da zona, quando percepcionamos uma pequena praia, cujo acesso só em miragem se vislumbrava. Perante a vontade de alguns em experimentar aquela graça, todos assentimos em descer até à praia para depois subir até ao destino final.

A descida ocorreu prenhe de peripécias, mas sempre com boa disposição e fé naquilo que nos levava àquela semana.

Depois do bom momento da praia, uma subida em escalada levou-nos a experimentar a dor, mas também a comunhão com os outros.

Os mais lestos de pernas paravam repetidamente para esperar pelos mais aflitos e dar-lhes a força moral a continuar (não que houvesse qualquer outro remédio dado o local onde estávamos) Nestes momentos, não consegui esquecer a frase do Padre Hugo quando olhando para trás, disse aos que o seguiam, “ajudem o Carlos”. Prontamente o amigo Rui levou a mala que já antes havia sido levada pelo Pedro. Foi uma sensação extraordinária, o sentir da preocupação do próximo, numa fraternidade desinteressada e caridosa.

Chegámos ao Cabo da Roca, não sem antes fazer uma reflexão última e posterior momento de silêncio. No meu caso, cheguei ao destino com os aplausos dos colegas porque, com eles e através deles pude superar-me e buscar no próximo a força de seguir. Verdadeiramente eram eles quem merecia os aplausos, mas o corpo já se derrotara em excesso o que me proibiu o espírito de se lembrar desse meu dever.

Esta caminhada foi o marco da semana, tendo sido o tema de conversa acompanhante e inspiração de muitas brincadeiras.

O que se extrai daquele dia? Bom, todos nós tiramos muita coisa, mas centralmente, como bem alertou um irmão lá presente, a caminhada deu lugar a um percurso comum. De início cada um estaria caminhando ao lado do outro mas não com ele. À medida que íamos meditando e evoluindo no cansaço, começámos a sentir a necessidade do outro, daquele que conforta. Muitas vezes quando parava para renovar forças, senti que os demais paravam, diziam algo de reconfortante.

Esta caminhada ensinou-me a estar em Igreja e foi, talvez, o maior contributo da semana para mim. Se pensar bem, vejo ali a integração na comunhão com outros. Primeiro é preciso começar a andar e isto significa, antes de mais, ir ao encontro da Igreja; em segundo é preciso ir meditando e reforçando a nossa relação com Deus, por exemplo através dos outros; em terceiro, quando assumo uma partilha com outros, viver com ele em comunhão, é preciso que eu esteja atento às suas necessidades, olhando para ele e receber dele esse mesmo gesto (o que senti abundantemente ao longo do dia!); Também percebi que a vida em comunhão deve fazer-se cedendo ao outro para o bem de todos. Foi o que aconteceu na segunda praia: perante a vontade de vários, todos anuíram e nessa partilha fomos todos felizes. Por último há que chegar sem deixar ninguém para trás. Podemos chegar mal, mas há que chegar na companhia de todos e isso dá-me um pouco desta história da Igreja.

Daquele dia tirei a máxima de que os pés são meus, mas a força é de Deus. Quando comecei a fazer esta caminhada vocacional tinha muitas tribulações para a entender. Actualmente, sinto-me confortado porque me foi dado a perceber que para servir há que conhecer o serviço. É integrando-me que sou integrado e para servir plenamente a Deus tenho de o fazer num horizonte colectivo e comum que é a Igreja.

Percebi também que a Igreja é onde estão os crentes em reunião e não apenas nos locais de culto. É fazendo a Igreja que ela existe para mim.

A todos quantos me deram a graça desta semana, que o Senhor nosso Deus esteja com eles e haja em todos nós e em mim a vontade e necessidade de servir o próximo, amando-o como o Senhor nos amou e nos ama.

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