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A difícil construção da paz na República Centro-Africana
Impossível esquecer
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Há dias, um ataque armado contra uma igreja em Bangui, a capital da República Centro-Africana, causou dezenas de mortos. O país está num caos terrível e teme-se um verdadeiro genocídio. Mas há quem ainda acredite na paz. É o caso do Padre carmelita Aurelio Gazzera.

 

Ninguém vai esquecer nunca mais. A violência que tomou conta da República Centro-Africana parece que enlouqueceu as pessoas. Na última quarta-feira de Maio, a Igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Bangui, a capital do país, estava completamente a abarrotar de pessoas. Eram milhares de refugiados. Pessoas em fuga. Isso percebia-se pelo olhar assustado, pelas conversas que iam sempre parar a algum episódio de violência, à morte de alguém, à destruição das suas casas. Estavam ali quando, de súbito, um grupo de homens armados irrompeu pela igreja dentro, disparando rajadas de metralhadoras e lançando granadas. Foi o caos. Trinta pessoas morreram logo, mas muitas outras ficaram feridas. Ninguém vai esquecer isto nunca mais. Por causa deste ataque, horas mais tarde, um grupo de homens deitou fogo a uma mesquita situada no mesmo bairro. Pelas ruas, erguem-se agora barricadas. As populações procuram defender-se. Todos acusam as autoridades e as forças internacionais de paz, na sua maioria de países africanos, de agirem com demasiada lentidão ou mesmo de não fazerem nada. No meio do caos, sobra apenas o apoio dos sacerdotes e as estruturas da Igreja. Mas, mesmo aí, ninguém parece estar a salvo, como o ataque à Igreja de Nossa Senhora de Fátima demonstrou.

 

País fracassado

A República Centro-Africana é um país fracassado. Desde a independência, em 1960, sucederam-se inúmeros golpes de Estado. De pouco vale à sua população os diamantes, ouro e urânio que se escondem no subsolo. No Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas, apenas 6 países no mundo estão pior classificados. O dia 24 de Março de 2013 também não será facilmente esquecido. Foi nesta data que uma força rebelde, conhecida como os Seleka, derruba o Governo instituído e consegue tomar conta da capital, o último bastião que lhe faltava para dominar por completo o país. Demoraram apenas três meses. O presidente deposto fugiu para o estrangeiro. A República Centro-Africana ficou a saque. Maioritariamente muçulmanos, estes rebeldes Seleka espalharam o terror por todo o lado. As paróquias e missões católicas foram objecto de uma violência impensável. Hoje em dia, há dioceses onde a Igreja não dispõe de um único veículo. Foi tudo destruído numa enorme vaga de violência que tinha por objectivo declarado a instauração de uma “República islâmica”, apesar de 66 % da população ser cristã.

 

A caminho do genocídio

A violência exercida sobre as populações foi de tal dimensão que as próprias Nações Unidas decidiram, em Outubro do ano passado, aprovar uma intervenção militar na República Centro-Africana, encabeçada por militares franceses, a antiga potência colonial. A violência provoca violência. As populações começaram a organizar-se, procurando a própria defesa. Aos poucos, foram-se constituindo grupos chamados de anti-Balaka e falsamente conotados como sendo de cristãos. Mas a verdade é que surgiram enfrentamentos entre os Seleka e os anti-Balaka a tal ponto que a comunidade internacional chegou a temer um genocídio. Desde Dezembro do ano passado calcula-se que mais de 1 milhão de pessoas tiveram de fugir de suas casas por causa dos confrontos, da violência, dos actos de vingança. Agora, depois do ataque mortífero contra a Igreja de Nossa Senhora de Fátima, em Bangui, percebe-se que os templos e as igrejas já não são mais santuários de paz, lugares de refúgio. O medo está em todo o lado.

 

Mudar mentalidades

O mundo tem de acordar para esta tragédia. Em Abril, a convite da Fundação AIS, o Padre Aurelio Gazzera, responsável pela missão de Bozoum, esteve em Bruxelas, para explicar aos responsáveis da União Europeia que a comunidade internacional tem de compreender a amplitude desta catástrofe para que alguma coisa possa efectivamente mudar. O Padre Aurelio disse que, “mais importante do que as armas, é a perseverança que pode fazer a diferença”. Há demasiadas armas na República Centro-Africana. Há demasiadas pessoas em lágrimas, enfurecidas, com vontade de vingança. Disparar um tiro é fácil. Matar alguém demora apenas o tempo de premir o gatilho da pistola ou da metralhadora. Fazer a paz não se decreta, diz este padre que conhece como poucos a cidade de Bozoum, que tem cerca de 25 mil habitantes e fica situada a mais de 300 quilómetros a norte da capital. Em Bozoum não há vestígios de elementos das forças de segurança ou de soldados franceses. Depois de meses de violência bárbara contra populações cristãs, houve retaliações, também violentas, contra grupos muçulmanos. A paz é aqui um equilíbrio frágil, mas o Padre Aurelio é persistente e não desiste. Reuniu-se com os cabecilhas dos grupos armados Seleka e anti-Balaka, convenceu os responsáveis das comunidades muçulmanas e evangélica a juntarem-se neste esforço e conseguiu que o diálogo prevalecesse ao ódio. A paz, neste país africano, nunca será conseguida sem verdadeira reconciliação. A Igreja, que tanto tem sofrido nestes meses de absurda violência, é a única instituição que pode ajudar a essa verdadeira reconciliação. “Temos um enorme trabalho pela frente”, disse o Padre Aurelio na União Europeia. “É preciso despertar e levantar este país, sobretudo no que diz respeito à consciência das pessoas. Temos de trabalhar para transformar esta crise numa oportunidade, pois sabemos que só a cruz leva à ressurreição”.

 

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5 a 9 de Julho, Domus Carmeli

 

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