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Ordenações presbiterais em Lisboa
“Os primeiros padres sinodais”
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Proveniências diferentes, histórias de vida distintas, um chamamento em comum. Francisco Simões e Manuel Charumbo, do Seminário ‘Redemptoris Mater’, recebem este Domingo, 29 de junho, a imposição das mãos pelo Patriarca de Lisboa que os vai confirmar sacerdotes numa Igreja Diocesana que inicia a sua caminhada sinodal.

 

Um tem nome de Papa e outro de Patriarca de Lisboa. Francisco e Manuel são alunos do Seminário Diocesano ‘Redemptoris Mater’ de Nossa Senhora de Fátima, em Caneças, e vão ser ordenados sacerdotes este Domingo, dia 29 de junho, Solenidade de São Pedro e São Paulo, na igreja do Mosteiro dos Jerónimos. Aos 30 anos, Francisco Simões, natural de Évora, recorda ao Jornal VOZ DA VERDADE uma parte importante da sua juventude e como se tornou mais forte o chamamento para servir a Igreja, ‘sem máscaras’, mas com a necessidade de contar a todos que Deus o ama tal como é. A timidez e o consequente fechamento aos outros são as principais características que recorda desse tempo. O facto de ter três tios sacerdotes não o dispensou de ser conhecido, na sua terra natal, como ‘o sobrinho dos padres’. Como consequência disso, procurou nos estudos uma forma de se abstrair do mundo que o rodeava. “Sempre fui bom aluno até porque era ‘o mundo’ onde eu me fechava”, refere. Por seu lado, Manuel Charumbo sempre preferiu, na sua adolescência e juventude, levar uma vida “normal e pagã”, fora do ambiente de Igreja, pelo qual nunca se tinha interessado. Hoje, com 38 anos, confessa que, naquele tempo, houve “uma experiência de encontro” que lhe mudaria radicalmente a vida e o faria entrar na Igreja, mesmo pertencendo a uma família que não era cristã. Nas ruas de Luanda, de onde é natural, Manuel recorda ao Jornal VOZ DA VERDADE a visita do Papa João Paulo II à sua cidade, em 1992: “Fui vê-lo passar no Papamóvel porque tinha curiosidade e, passados uns tempos, estava a iniciar a caminhada de preparação para o batismo”. Durante esse tempo, decidiu também “aceitar o convite de uma amiga para assistir a umas catequeses”. Foi este o momento que o fez entrar para o Caminho Neocatecumenal, onde, segundo conta, foi ajudado a “centrar a vida mais na palavra e a descobrir um sentido pleno de Igreja”.

Francisco sempre foi cristão, mas foi também no Caminho Neocatecumenal que este jovem encontrou, a partir dos 13 anos, uma nova forma que Deus ‘utilizou’ para lhe “abrir os ouvidos para uma vida cristã centrada no seu essencial”. Nessa época, durante o cancro que sua mãe padeceu, Francisco recorda o testemunho dos membros da comunidade neocatecumenal a que os seus pais pertenciam. “Eles deixavam os trabalhos e as suas casas para irem rezar connosco. Isso fez-me questionar o porquê daquilo acontecer”, conta este futuro padre, garantindo que esses momentos provocaram-lhe “uma mudança de vida”. “Quando Ele vem à nossa vida podemos chorar, mas nunca desesperar, porque Cristo venceu a morte!”, diz, recordando as palavras de um membro daquela comunidade.

 

Em busca de uma vida autêntica

O tempo de namoro e os estudos foram importantes nos percursos destes dois seminaristas. Francisco Simões foi estudante no curso de Bioquímica e sempre se destacou por tirar boas notas. Namorou três anos com uma rapariga que tinha conhecido no grupo de teatro e sentia que “Deus dava tudo aquilo” que sonhava. Até que o ‘sobrinho dos padres’ passou por ‘louco’, entre os amigos. Foi em 2005, num encontro vocacional que decorreu em Amsterdão: Francisco decide oferecer-se para ser padre e sente-se disponível a ir “para onde Ele quisesse”. Tomada a decisão de entrar no seminário, ‘calhou’ em sorte ao jovem Francisco ir para o seminário de Lisboa do Caminho Neocatecumenal. Ao longo destes anos de formação, o futuro padre saiu apenas para dois anos de missão no Uruguai e um em Israel. Hoje, a poucos dias de ser ordenado presbítero, Francisco Simões recorda-se com um sorriso da reação dos seus amigos à notícia da sua entrada no seminário: “Pensaram que a minha ideia em entrar num seminário seria algo passageiro, tal como num ‘Erasmus’. Ou seja, que iria passar depois de alguns meses de experiência”. Atualmente, e já conformados com a decisão, os amigos de Francisco, “mesmo alguns que não professam a fé católica”, já lhe asseguraram presença na sua ordenação. Da parte da família, este seminarista de Évora viu a sua vocação ser “bem aceite” pelos pais, até porque pouco tempo antes eles viram-se “confrontados” com a entrada da sua irmã num convento de clausura em Campo Maior. “Isso ‘facilitou-me’ as coisas”, confessa.

O momento em que Manuel Charumbo contou à família que queria entrar no seminário trouxe “grande sofrimento” em casa: “A minha mãe não aceitou muito bem. Essa situação fê-la sofrer, até porque na cultura africana é muito complicado aceitar que o primogénito deixe a sua geração”, admite. Perante a vontade em “não ver a mãe abatida”, abandonou a ideia de entrar para o seminário durante algum tempo. Foi nesse período, enquanto namorava e consciente de que “a vocação foi e continua a ser um processo”, que começou a perceber que lhe “faltava alguma coisa”. O desejo “de uma vida autêntica” fez com que “procurasse respostas” para a vocação” e viu como “o Senhor sempre foi fechando as portas para outra vocação que não fosse o presbiterado”.

 

Um investimento que deu os seus frutos

“Dispostos a ir para qualquer parte do mundo”, estes dois jovens apresentaram-se em Porto San Giorgio, Itália, para um dos habituais encontros com os iniciadores do Caminho Neocatecumenal de onde são enviados os candidatos para os seminários ‘Redemptoris Mater’ de todo o mundo. ‘Calhou-lhes’ o seminário de Lisboa. Para chegar a esse momento, foram necessários ‘investimentos’. “O melhor investimento que os meus pais fizeram, com toda a certeza, foi ajudarem-me no pagamento das várias Jornadas Mundiais da Juventude. Desde 2000 que participo e foi nelas que vi confirmar-se a minha vocação”, refere Francisco. Estes encontros de jovens foram também importantes para ver que “a Igreja era mais do que aquilo que a imaginava em Évora”. Durante a preparação para a JMJ de Colónia, no ano 2005, ficaram gravadas na memória deste jovem as palavras do então recém-eleito Papa Bento XVI: ‘Não tenhais medo de Cristo! Ele não tira nada, ele dá tudo. Quem se doa por Ele, recebe o cêntuplo’. “A partir daí, pensei que Deus me tinha dado tudo aquilo que eu queria para eu perceber que isso não era o melhor para mim”, refere Francisco Simões.

Para Manuel Charumbo, a frase proferida por um dos seus catequistas ficou-lhe gravada no coração como algo que “desejava muito viver”: “Quem está em Cristo tem uma vida autêntica”. Esta “vida autêntica” traduziu-se numa participação mais intensa nas atividades de Igreja e isso trouxe-lhe “muitas reações negativas” dos seus amigos. “A forma como anteriormente via as outras pessoas que iam à Igreja era exatamente a mesma visão que os meus amigos passaram a ter de mim. Por isso me revi naquela história”, confessa o seminarista angolano. Este futuro padre, que deixou por concluir o 2º ano de Engenharia Geográfica para entrar no seminário, recorda a dificuldade de adaptação no primeiro ano que estudou em Lisboa: “Sempre gostei da área das ciências e quando vim estudar letras, filosofia, línguas e teologia aconteceu uma viragem muito grande”, observa. No entanto, passado um ano de adaptação ao país, recorda que “tudo começou a sair bem”. Para esta adaptação, contribuiu a comunidade neocatecumenal na paróquia de Caxias-Laveiras, que se reúne semanalmente em celebrações da palavra e da Eucaristia e, normalmente, uma vez por mês, organiza um Domingo em convívio.

 

Enviados sem fronteiras

Para os dois seminaristas, que se vão tornar nos primeiros padres ordenados por D. Manuel Clemente enquanto Patriarca de Lisboa, as experiências de missão fora do país, e aquelas que foram confiadas como trabalho pastoral neste último ano em paróquias da diocese como diáconos, vieram confirmar as suas caminhadas vocacionais. Para o seminarista Manuel Charumbo, os anos de missão que foram passados no seu país de origem, em São Tomé e Príncipe e na Terra Santa, foram um “tempo de tocar a realidade, na periferia, tal como pede o Papa Francisco”. “Vi a necessidade que o povo tem da palavra e do amor de Deus”, salienta. Precisamente a mesma necessidade que experimentou durante o trabalho pastoral no seu último ano nas paróquias de Campelos, Marteleira, Santa Bárbara e Lourinhã. Durante as habituais visitas ao lar de idosos, numa das suas paróquias, recorda que “cada vez que conversava com uma pessoa que ali estava, via que essa pessoa sentia-se amada, sentia-se única”. Isso, refere Manuel, ajudou-o a tornar-se “próximo do povo”.

Na comunidade neocatecumenal de São Domingos de Benfica, e ao trabalhar nas paróquias do Bombarral, Roliça e Vale Covo, Francisco Simões experimentou as palavras de Bento XVI que estiveram na origem da sua caminhada vocacional. “Nestas missões comprovei que Deus não tira nada, mas dá tudo”, garante. Deste último ano pastoral como diácono, destaca o facto de ter presidido a mais de trinta funerais. “Somos chamados a anunciar Cristo aos que estão à nossa volta porque a vida de um cristão está projetada para a vida eterna”, realça.

 

Gratidão a D. José Policarpo

“Sem medo do futuro e preparado para me deixar surpreender por Deus”. Assim se projetam as expectativas de Francisco Simões. Nesta Igreja de Lisboa que agora inicia a caminhada sinodal, querendo chegar a todos, este candidato ao sacerdócio defende que “a criatividade da Igreja” assenta na “fidelidade ao magistério da Igreja”. “Não vem de fazermos coisas diferentes do que fazemos agora, mas sermos fiéis. Porque a identidade cristã é nossa e é o que de mais valioso temos para dar aos outros, quando saímos em missão”, garante. Recordados das palavras de D. Manuel Clemente, que particularmente os definiu como sendo “os primeiros padres sinodais”, Manuel Charumbo coloca a confiança no Espírito Santo para que possa “suscitar na Igreja Diocesana novas formas de chegar a todos que têm sede e fome do amor de Deus”.

A poucas horas de ser ordenado padre, Francisco Simões sublinha o sentimento de “agradecimento a Deus pela história que tem feito” na sua vida e “por tudo o que permitiu viver”, deixando um agradecimento especial a D. José Policarpo, antigo Cardeal-Patriarca, falecido em março último. “Se este ano existem ordenações, é graças ao senhor D. José, por ter tido a inspiração para trazer para a diocese, no ano 2000, o Seminário Diocesano ‘Redemptoris Mater’”.

 

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“Uma fonte de muitas graças para a diocese”

O reitor do Seminário ‘Redemptoris Mater’ de Lisboa, padre Fernando André, considera que “a espiritualidade oferecida pelo Caminho Neocatecumenal na formação de futuros padres tem sido fundamental para alcançar a ‘ovelha perdida’ e fazer surgir uma fé adulta” em todas as paróquias onde os seminaristas e padres são enviados. Ao Jornal VOZ DA VERDADE, este sacerdote sublinha que o Sínodo Diocesano 2016 surge “num momento muito especial para a vida da Igreja” e assegura “a participação ativa do seminário”, até porque “este um seminário missionário que pretende chegar a todos”.

O Seminário ‘Redemptoris Mater’ de Nossa Senhora de Fátima existe em Lisboa desde o ano 2000 e atualmente tem 21 seminaristas de 14 nacionalidades diferentes. Desde a sua criação já foram ordenados 9 padres para a Diocese de Lisboa, aos quais se vão juntar agora Francisco Simões e Manuel Charumbo.

 

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Francisco Miguel Simas Simões

30 anos

Natural de Évora

 

 

Manuel André José Charumbo

38 anos

Natural de Luanda, Angola

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