No passado dia 7 de Março, 50 anos depois daquele que ficou conhecido como “Domingo Sangrento” por causa da violência dos polícias e civis brancos contra a multidão de cidadãos de cor que se manifestavam pela igualdade de direito ao voto, o Presidente Obama atravessou a Ponte Edmund Pettus, tornando presente o sonho dos que arriscaram a vida pela sua concretização.
A ponte que se tornou um símbolo
Junto ao Presidente estava John Robert Lewis, presente na primeira marcha de 1965, que afirmou: “Quando estávamos a atravessar esta ponte, se me tivessem dito que um dia voltaria cá para vos apresentar o primeiro Presidente afro-americano, teria dito que estavam doidos.” Agora de regresso a Selma, atravessado a mesma ponte, carregava consigo a função de membro da Câmara dos Representantes, cargo que ocupa desde 1988. E tem a consciência do que mudou dizendo: “Quando alguém me diz que nada mudou, eu digo-lhes que se ponham no meu lugar e me deixem mostrar-lhes as mudanças”.
A presença de muitos ativistas da primeira marcha, cujo valor emblemático é óbvio, adquire um valor acrescido com o discurso de Obama que, entre o entusiasmo pelo que já foi alcançado e o inconformismo perante o que ainda há para fazer, deixou bem claro que a marcha de Selma para Montgomery não está terminada. O futuro aqui fica assinalado.
O homem que deu asas ao sonho
No começo deste ano de 2015 foi lançado o filme “Selma” do realizador Ava DuVerbay, retratando o drama vivido numa significativa fase da longa marcha pela liberdade, liderada por Martin Luther King, figura luminosa que honra a Humanidade, que é dos nossos tempos e que permanecerá ao lado de outros grandes mestres como Gandhi ou Nelson Mandela, demonstrando que a grandeza da pessoa humana não consiste no poder material ou bélico mas antes na verdade interior que configura a sua vida. Gandhi, a referência do poder da não violência, que, com os seus concidadãos desprovidos de armas, em outras marchas como a Marcha do Sal em Março de 1930, enfrentou as tropas do mais poderoso império e conseguiu vencê-las, levou King a educar interiormente os que o seguiam a resistirem com determinação, mas de uma forma não violenta, exatamente como aconteceu na ponte Edmund Pettus; Nelson Mandela aprendeu de ambos que a vitória se consegue pela resistência mantida dentro de si mesmo, sem se deixar abater pela violência exterior.
Para entendermos estes acontecimentos não podemos esquecer o coração da pessoa que foi King. É filho de uma família cristã, onde bebia as razões que davam consistência à sua vida. Quando em 1955 recebeu o grau de doutor em teologia pela Universidade de Boston, estava convencido de que a resistência pacífica era uma das armas mais poderosas ao alcance dos oprimidos na sua busca da justiça social. Na autobiografia organizada por Clayborne Carson escreve: “Jovem, com a maior parte da minha vida pela frente, cedo decidi entregar a minha vida a algo de eterno e absoluto. Não a esses deuses menores que hoje estão connosco e amanhã já não estão. Mas a Deus que é o mesmo ontem, hoje e sempre”. Por isso não estranha que nas suas palavras encontremos um eco do anúncio messiânico de novos tempos. Só uma pessoa embebida e alimentada na Bíblia poderia proferir aquele discurso que se tornou um símbolo, quando em 1963, na Marcha sobre Washington, repetiu, fazendo lembrar o profeta Isaías, “Eu tenho um Sonho”.
A marcha que tem de continuar
Quando somos confrontados com os repetidos episódios de violência em que aparecem as forças de segurança e cidadãos de cor – lembre-se de passagem o caso de Michael Brown morto pela polícia de Ferguson em Agosto de 2014 e os vários episódios que se seguiram - temos de concluir que a besta da discriminação racial ainda não morreu, mas apenas dormita. O Presidente o afirmou em Selma: “Basta abrir os olhos, os ouvidos, os corações para saber que a sombra da história racial deste país continua pairando sobre nós… Sabemos que esta marcha ainda não terminou”.
E se ele se referia ao seu país, o mesmo se poderá dizer em relação a outros. O que se tem passado em França e na Alemanha é disso uma demonstração. E os cristãos não podem ser espetadores indiferentes ao que se passa. A Encíclica Alegria do Evangelho regista que a conversão cristã exige rever “especialmente tudo o que diz respeito à ordem social e consecução do bem comum” (EG nº 182).
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