Contemplando a presente instabilidade financeira, o nervosismo político da velha Europa, as guerras demolidoras na Síria, no Iraque e extravasando para toda a região, o processo constantemente reiniciado e sempre frustrado da pacificação entre Israel e a Palestina, a loucura inaudita do fundamentalismo religioso, as vagas crescentes de emigrantes e refugiados arriscando a vida pela sobrevivência, o levantar de novos “muros da vergonha” como o projetado na Hungria, a já como que aceite fatalidade das desigualdades crescentes entre os poucos que muito têm e os muitos que nada possuem, ficamos mais sensibilizados para entender Jesus e a sua reação perante as multidões que o procuravam.
Olhar com paixão
No Domingo passado, o texto de Marcos registava que, diante desse cenário, “Ele compadeceu-se de toda aquela gente, porque eram como ovelhas sem pastor” (Mc 6,34). Jesus não verifica apenas o que se passa, como que se tudo lhe fosse alheio; não se remeteu a algo como as análises frias à base de números que nos servem todos os dias, justificando até o injustificável. Ele “compadeceu-se”, isto é, assumiu como seu tudo o que dizia respeito à vida das pessoas, desde os seus anseios e alegrias até às suas frustrações, desesperos e sofrimentos. É a atitude do Mestre que é proposta ao discípulo.
Segue nessa linha o Papa Francisco, despertando as consciências para as exigências da fé no que toca à construção do Reino. Não basta ficar nos belos e elaborados discursos, em palavras sonoras escritas nos gabinetes e proferidas da cátedra, mas que passam por cima da cabeça dos ouvintes, por falta de proximidade das situações concretas e encobertas pelo receio de sujar as mãos no terreno revolvido e confuso do mundo. Como ele escreveu “os evangelizadores contraem assim o ‘cheiro de ovelha’, e estas escutam a sua voz” (E.G.24).
Voltar à fonte
A doutrina que ele prega não é nova; é apenas o voltar à fonte da Palavra e anunciá-la com paixão. Quando há poucos dias visitou os três países sul-americanos mais carenciados de desenvolvimento ele o deixou claro, como na visita que fez ao bairro de Bañado Norte, com 30 mil residentes, na periferia da capital uruguaia: foi ao encontro de uma realidade gerada pela primazia do lucro e pela força do egoísmo e, às pessoas privadas das suas terras, dos seus laços e da sua segurança, quis dizer que estava com elas, quis escutá-las e dar-lhes a oportunidade de se fazerem ouvir e depois utilizou a sua voz como que dando-lhes a eles a voz que não têm perante as autoridades.
Afirmar o Evangelho
Desde o início do seu ministério de confirmar os irmãos na fé, ele pôs em primeiro lugar os pobres de bens terrenos e de poder, sabendo que essa é a pedra de toque da evangelização. Deu-lhes prioridade, não para os consolar e manter onde estão, mas para reforçar a consciência da sua dignidade e da sua responsabilidade em não se resignarem perante o que contradiz o projeto de Jesus; para fortalecer “um coração que não renuncia ao bem possível, ainda que corra o risco de se sujar com a lama da estrada” (E.G.45). Por isso as primeiras visitas foram a Lampedusa, ao centro de imigrados em Roma, ao encontro de desempregados da Córsega, e, no Vaticano, a lugares como o refeitório do pessoal, tomando uma refeição normal com os funcionários.
Comentando as últimas visitas, alguns afirmam que ele foi reforçar o catolicismo como religião dos pobres. Penso, porém, que o que ele fez foi reforçar a posição dos pobres, não para ficarem numa situação de inferioridade perante os outros, mas para deixarem Deus reinar dentro deles e assim irem fazendo da vida social um espaço de fraternidade, de justiça, de paz, de dignidade para todos. Dando-lhes esse lugar reforça-se o Evangelho. O tema central da pregação de Jesus não era a Igreja, mas sim o Reino de Deus. Como escreve J. A. Pagola, aí todos se devem sentir comprometidos em três grandes tarefas: curar a vida, sarando feridas e tornando sã a sociedade; aproximar-se dos mais pobres, esquecidos e indefesos; trabalhar por uma sociedade mais acolhedora onde os mais fracos não sejam esquecidos e ninguém fique excluído. Então a Igreja se torna mais autêntica.
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