Lisboa |
Paróquia de Loures recebe Círio Saloio
“Estar com Maria, para que Jesus nasça no mundo”
<<
1/
>>
Imagem

O Cardeal-Patriarca de Lisboa considera que a presença em Loures da imagem de Nossa Senhora do Cabo – conhecida como Círio Saloio – vai “encontrar em muitos corações a disponibilidade e a confiança” para que “a obra de Deus continue no mundo”.

 

É assim desde o século XV, de 26 em 26 anos. Uma paróquia da zona saloia de Lisboa – dos atuais concelhos de Lisboa, Sintra, Cascais, Mafra, Loures, Odivelas e Oeiras – recebe durante um ano a pequena imagem de Nossa Senhora do Cabo Espichel. Foi o que aconteceu no dia 1 de outubro, com a paróquia de Belas a entregar o Círio Saloio à paróquia de Loures, que se ‘vestiu’ de branco e azul para receber Nossa Senhora. Multidões, festa e encontros marcam por estes dias a presença de Maria nesta terra às portas da cidade de Lisboa. “É connosco, e é agora! Tenho a certeza que a presença da Senhora do Cabo, aqui em Loures como em todos os outros sítios por onde tem passado, encontrará em muitos corações a disponibilidade e a confiança para que esta obra continue e para que este mundo novo, de que Deus não desiste, passe por nós e aconteça Jesus no mundo – o que quer dizer reconciliação plena com Deus, reconciliação plena com todos, vida nova, o que Deus quer”, manifestou o Cardeal-Patriarca de Lisboa, no passado Domingo, 2 de outubro, na Missa em honra de Nossa Senhora do Cabo.

Na igreja matriz de Loures, que foi pequena para acolher todos os fiéis que queriam ver Maria, D. Manuel Clemente lembrou que “Deus não desiste do mundo”. “Mas este mundo que Deus criou e cria sem nós, não recria sem nós. Ele quer repartir connosco o seu poder criador. Todos nós que aqui estamos, temos as dificuldades que temos, sentimos as dificuldades que sentimos, por nós, pelos nossos, pelos outros, pelos que não têm ninguém… estamos aqui e tudo isso tem nome, tem figura, tem sítio e situação, mas nós queremos estar do lado de Deus, nós queremos estar com Maria, para que Jesus nasça no mundo. E depois, a pouco e pouco, com o nosso ‘sim’, desdobrando-se dia após dia a resposta de Deus, as coisas acontecem”, assinalou.

 

“Isto são factos!”

O cardeal português destacou ainda o papel de Maria na história da salvação. “Há 2020 anos atrás, em Nazaré da Galileia – que era uma aldeola, com umas centenas de pessoas a viver meio em grutas, meio em casas –, uma jovenzinha chamada Maria percebeu, como nunca ninguém tinha percebido, e como nós até temos dificuldade em perceber, que Deus esperava da sua fé a recriação do mundo. Ela era como que uma terra nova e intacta, e por isso mesmo virginal, onde podia aparecer a humanidade nova, e disse: ‘Faça-se’. E nós estamos aqui, 2020 anos depois, porque nove meses depois nasceu aquele Menino… nós estamos aqui por causa disso. Isto não são fábulas, não são histórias de encantar crianças ou de entreter ociosos. Isto são factos!”, garantiu.

Nesta celebração em honra de Nossa Senhora do Cabo, que foi concelebrada por muitos sacerdotes da Vigararia de Loures - Odivelas, D. Manuel Clemente apelou ainda à atenção ao outro: “O Menino cresceu e depois saiu da sua terra e andou, enquanto o deixaram andar, a dizer que era possível, que a partir de Deus o mundo se pode reconstruir, como a sua Mãe acreditara. E tendo atenção às coisas mais pequenas, abeirando-se de tudo e de todos, a partir de Deus, com aquela absoluta confiança no seu Pai, que Ele nos quer transmitir”.

 

Uma igreja bonita, a reaparecer

Nos últimos anos, a paróquia de Loures tem procurado cuidar, de forma particular, das obras na igreja matriz, um templo construído em meados do século XV, no local onde existiu a anterior igreja medieval que pertenceu aos Templários. Na sua presença em Loures, o Cardeal-Patriarca não esqueceu este dado, dando “os parabéns” a toda a comunidade. “Foi uma agradabilíssima surpresa verificar como estas obras de restauro da igreja têm continuado, como os retábulos vão aparecendo na sua beleza original, como as colunas são restauradas com tanto critério, não adulterando a pintura que estava mas avivando-a. Nós sabemos que, mesmo em tempos de dificuldades, quando nos juntamos para fazer uma obra que é uma casa de todos para todos, também crescemos – e não é apenas a obra material que se dignifica, é a obra espiritual em nós que cresce também”, observou D. Manuel Clemente, no início da celebração, a propósito da igreja que classificou de “tão bonita”.

Sobre a igreja matriz – que após o terramoto de 1755 foi votada ao abandono, mas no século seguinte foi sujeita a obras de restauro, tendo sido declarada monumento nacional em decreto de 16 de junho de 1910 –, o pároco de Loures, padre Francisco Inocêncio, salienta ao Jornal VOZ DA VERDADE que a paróquia criou um grupo, os ‘Amigos da matriz’, que tem permitido avançar com as obras de restauro. “Amigo pode ser quem se torna sócio e paga uma quota anual, mas depois há um núcleo duro de amigos que promove diversas iniciativas, que têm sido bem acolhidas e reconhecidas pelas pessoas e, por isso, depois de termos conseguido o restauro da primeira nave lateral, vendo o trabalho já realizado, foi mais fácil obter ajuda, quer junto do poder oficial, quer junto de mecenas”, descreve este sacerdote, de 49 anos.

 

Um ano reforçadamente mariano

A última vez que Loures tinha recebido o Círio Saloio foi há 26 anos. O padre Chico, como é conhecido, está presente nesta paróquia há 14 anos e explica que na última visita “a opção pastoral foi diferente, não valorizando tanto a dimensão da religiosidade popular, mas a dimensão mais de festa, de arraial”. “Mesmo a procissão foi mais contida”, refere o pároco, assinalando que “a memória que as pessoas têm dessa visita é um pouco mais difusa”. “A imagem chegou numa carrinha, igualmente de Belas, ficou no centro paroquial, de onde no dia seguinte partiu em procissão rumo à igreja”, descreve.

Sobre o significado de receber a pequena imagem de Nossa Senhora do Cabo em Loures, o padre Francisco Inocêncio sublinha o duplo sentido. “Para nós significa, por um lado, o reforçar da consciência do papel e do lugar de Nossa Senhora. Loures já é, ela mesmo, uma paróquia consagrada aos cuidados de Maria – porque a sua padroeira é Nossa Senhora da Assunção – e a igreja é chamada Igreja de Santa Maria de Loures, além de que estamos nas comemorações do Centenário das Aparições. Por isso, este ano vai ser reforçadamente mariano. Por outro lado, esta visita significa sentirmo-nos parte de uma comunidade de fé, que depois se materializa por 26 paróquias por onde vai correndo o Círio Saloio. Caminhamos em conjunto nesta corrente, de quem recebe e depois entrega a imagem à paróquia seguinte da região”, aponta este sacerdote.

 

Congregar os filhos

Presente nesta paróquia desde 2002, e tendo como coadjutor, há quatro anos, o padre Duarte Nuno Morgado, o padre Chico frisa que estão a ser organizadas diversas iniciativas para decorrerem ao longo deste ano que a imagem de Nossa Senhora do Cabo vai estar em Loures. “A imagem habitualmente vai estar presente nas celebrações da igreja matriz e depois também nos restantes sete lugares da paróquia. De uma forma programada, estando uma semana num lugar e depois noutro, e também nos momentos de festa das várias comunidades. Estamos a organizar ainda manifestações culturais e religiosas”, destaca, acentuando a capacidade de congregação de Maria: “A paróquia de Loures é, geograficamente, bastante extensa e, de alguma maneira, dispersa, com várias comunidades além do centro urbano, mas Nossa Senhora, como Mãe, tem essa capacidade de congregar os filhos”.

 

___________________


O ‘Círio Saloio’

O culto a Nossa Senhora do Cabo Espichel, ou Santa Maria da Pedra de Mua, é documentalmente mencionado pela primeira vez numa carta régia de D. Pedro I, datada de 1366, e constitui uma das mais antigas e interessantes manifestações de religiosidade popular em Portugal. Divulgado o miraculoso achamento da imagem de Nossa Senhora no espigão rochoso do Cabo Espichel, rapidamente o culto cresceu, não só entre as localidades mais ou menos vizinhas da margem sul do Tejo, mas sobretudo na margem norte do rio, recobrindo praticamente todo o território da região saloia. Aqui viria a atingir assinalável relevo, ficando conhecido pela designação de “Círio Saloio”.

Não se trata de um culto individual, mas de um verdadeiro voto coletivo, de um ato ritual espontâneo feito por toda a comunidade e por ela assumido. Na origem do “círio” está a proteção contra catástrofes naturais, ligadas aos flagelos da agricultura ou às epidemias de peste; por esse motivo, e porque o perigo é ou foi coletivo, também a promessa o é, devendo ser paga pela comunidade como um todo ou por uma Confraria em seu nome, ao longo de sucessivas gerações de romeiros.

No dealbar do século XV estava já edificada (ou reedificada) a pequena capela de Santa Maria do Cabo ou Santa Maria da Pedra de Mua, atualmente conhecida por Ermida da Memória, que acolhia grandes romarias. Estas peregrinações populares foram crescendo de importância e, em 1430, trinta freguesias da zona saloia – dos atuais concelhos de Lisboa, Sintra, Cascais, Mafra, Loures, Odivelas e Oeiras – combinaram organizar-se entre si, instituindo um ‘giro’ anual: cada uma delas iria, anualmente e à vez, prestar culto ao Santuário do Cabo Espichel.

No início do século XVIII retiraram-se quatro freguesias, pelo que o ‘giro saloio’ é, desde então, constituído por apenas 26 localidades: São Vicente de Alcabideche, Linda-a-Velha, São Julião do Tojal, São Pedro de Penaferrim, Nossa Senhora da Misericórdia de Belas, Santa Maria de Loures, São Lourenço de Carnide, São Pedro de Barcarena, São Pedro de Lousa, Santo Antão do Tojal, Nossa Senhora da Purificação de Oeiras, Nossa Senhora do Amparo de Benfica, São Domingos de Rana, São João das Lampas, Nossa Senhora da Purificação de Montelavar, Nossa Senhora de Belém de Rio de Mouro, Nossa Senhora da Ajuda de Belém, Ascensão e Ressurreição de Cascais, Santíssimo Nome de Jesus de Odivelas, São Martinho de Sintra, São Pedro de Almargem do Bispo, Santo Estêvão das Galés, Nossa Senhora da Conceição da Igreja Nova, São João Degolado da Terrugem, São Saturnino de Fanhões, Santa Maria e São Miguel de Sintra. Desta maneira, o círio de Nossa Senhora do Cabo Espichel é recebido por cada freguesia de 26 em 26 anos, tendo a paróquia de Santa Maria de Loures a honra de o receber em 2016.

in www.facebook.com/sradocaboloures

texto e fotos por Diogo Paiva Brandão
A OPINIÃO DE
Guilherme d'Oliveira Martins
Quando Jean Lacroix fala da força e das fraquezas da família alerta-nos para a necessidade de não considerar...
ver [+]

Tony Neves
É um título para encher os olhos e provocar apetite de leitura! Mas é verdade. Depois de ver do ar parte do Congo verde, aterrei em Brazzaville.
ver [+]

Tony Neves
O Gabão acolheu-me de braços e coração abertos, numa visita que foi estreia absoluta neste país da África central.
ver [+]

Pedro Vaz Patto
Impressiona como foi festejada a aprovação, por larga e transversal maioria de deputados e senadores,...
ver [+]

Visite a página online
do Patriarcado de Lisboa
EDIÇÕES ANTERIORES