Assistimos hoje a uma defesa (muitas das vezes claramente exagerada) da vida animal – daquela selvagem e também dos chamados “animais domésticos”.
Olhando para os exageros, dou não raras vezes comigo a pensar que a vida animal é hoje mais bem defendida que a própria vida humana. Fora os casos de solidão (que não são raros) em que os animais constituem uma companhia, muitas vezes os bons tratos para com eles constituem simplesmente uma forma de ostentar riqueza, poder. Os animais são mostrados como jóia de luxo, “ornamento”, mostrando a todos o poder dos respectivos donos. Os outros seres humanos, os pobres que se encontram pelas ruas ou os doentes, são por aqueles tratados como um nada: é que a vida dos pobres ou dos doentes não é sua propriedade, escapa ao seu controle, não pode ser ostentada como “ornamento” – ainda que pobre ou sofredora, é uma vida que vale por si mesma.
É que a dignidade própria de cada vida humana, qualquer que ela seja e qualquer que seja o modo como ela possa ser vivida está muito acima daquilo que alguma lei possa declarar ou reconhecer: aliás, a vida humana é o fundamento da própria lei. Se não a defendemos desde o início no ventre materno até ao seu fim natural pomos em causa todo o viver em sociedade. Passamos a ser “lobos” uns dos outros.
Toda a vida humana (e só dela podemos afirmar isto) vale a pena ser vivida. O sofrimento não faz com que a vida humana se torne menos digna; as dificuldades de comunicar e de estar com os demais por causa de alguma doença tornam a vida mais frágil, mas não nos desobrigam da sua responsabilidade – pelo contrário. E não se trata apenas da responsabilidade que o próprio tem de a defender, preservar e viver, mas também da responsabilidade de toda a sociedade.
De um cão, somos donos (já nos querem fazer acreditar que somos apenas “tutores”!). Podemos e devemos decidir sobre ele – certamente, com o dever de o tratarmos sempre com humanidade, não esquecendo que isso implica considerá-lo como “animal”, como cão. Mas da vida humana ninguém, nem o próprio nem a sociedade (e muito menos o Estado) se podem arrogar o direito de decidir. Não somos donos da vida de ninguém, nem sequer da própria vida. Como gosta de recordar o Papa Francisco, não existe vida humana descartável: nem a dos imigrantes, nem a dos pobres, nem a dos doentes, ainda que terminais.
É verdade que a superioridade de uma civilização se mostra também no modo como trata os animais. Contudo, a grandeza de uma civilização mostra-se, antes de mais, no modo como defende a vida humana em todas as suas dimensões. E a nossa civilização (o nosso modo de viver) ocidental tem estado, claramente, a resvalar para o abismo.
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