Lisboa |
D. Manuel Linda, Bispo das Forças Armadas
A proximidade do capelão “é a chave de toda a pastoral”
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No ano em que o Ordinariato Castrense de Portugal comemora os 50 anos do primeiro curso de capelães, o jornal VOZ DA VERDADE falou com o Bispo das Forças Armadas e das Forças de Segurança, D. Manuel Linda, sobre a história da diocese e o projeto pastoral para o próximo ano 2017-2018, que é dedicado aos jovens. Fazer crescer a Missão País e o Curso Alpha é um dos planos do Bispo.

Nos 50 anos do primeiro curso de capelães militares apresentou um projeto pastoral sobre os jovens e a fé. Qual a razão?

Atendendo a que estávamos na proximidade do Sínodo, que tem como tema os jovens, a fé e discernimento vocacional, não podíamos andar à volta de outro tema que não a pastoral juvenil. A realidade da secularização, do abandono da prática eclesial e até da perda da fé, é infelizmente, uma realidade de todos os dias.

 

No documento sobre o projecto pastoral do próximo ano escreve: “Tenho visto muitos e muitos jovens que vivem a sua fé de uma forma que me espanta: portadores de uma espiritualidade assinalável, dedicadíssimos aos outros, verdadeiros testemunhos de fé, de alegria e de esperança”.

Sim, claro. Há vários artigos e livros que falam em pós-cristianismo, outros, no fim do cristianismo. Não é nada disso. Acredito no cristianismo e no futuro. É evidente que por ser um organismo vivo tem os seus ciclos. Nesta fase, de facto, particularmente entre a gente nova, talvez hipnotizada pelo imenso sucesso da técnica, notamos uma retracção. Agora, esta retracção não significa o fim do cristianismo e, portanto, sou optimista. Cito aí também, a dado momento, como hipótese para trabalharmos este ano, a Missão País. Aí encontrei jovens que se dedicam de forma absolutamente espantosa e que vivem uma espiritualidade que, às vezes, quase me envergonha a mim.

 

Destaca também o curso Alpha. Porquê?

O curso Alpha já foi lançado, na Força Aérea, na base da Ota, há dois anos. Ficou enraizado e continua a haver grupos que se reúnem. Gostava que, de facto, isso se espalhasse. Não estou ligado a nenhum desses movimentos [o Alpha e a Missão País], mas sei das suas potencialidades.

 

Refere também a importância de cada capelão conhecer os militares. A proximidade, de que fala tanto o Papa Francisco, é a chave desta pastoral?

É a chave de toda a pastoral, em particular do Ordinariato Castrense. Se o capelão passar todo o dia no seu gabinete – mesmo que celebre uma Missa – e não tiver contacto com as pessoas, não exerce. Não é capelão verdadeiro. E essa tem sido, graças a Deus, a chave do nosso êxito. Estou convencido de que o número excepcional de Baptismos de adultos, que temos tido, tem a ver com isto e com esta relação personalizada com o capelão. A iniciação cristã, a nível do Baptismo e do Crisma, tem sido muito significativa.

 

Por funcionar em hierarquia, o meio militar acaba por cultivar a distância entre as pessoas. Muitas vezes, não se fala sobre religião que é vista como um tema do foro privado. O que pensa sobre isto?

Os nossos militares são filhos da sociedade portuguesa, tal como ela é. Uns não têm provavelmente muita formação religiosa, mas outros apresentam uma exigência religiosa espantosa. Nessa linha, recorre-se ao capelão para a formação, discernimento, e cultivo desta fé que vai sendo formada.

 

No mesmo documento sobre a pastoral do próximo ano, refere também a importância das redes sociais na evangelização dos jovens. A Igreja tem de se adaptar à forma de comunicação em vigor?

A Igreja institucional – Bispos, Padres, organização eclesial (dioceses e paróquias) – ainda vive muito na ‘Galáxia de Gutenberg’, como se estivéssemos no século XVI. Acreditamos que os nossos jornais são os melhores, que sem a publicação de um livro ou de um caderninho, as coisas não vão lá. Acredito que esta mentalidade já não diz muito à juventude. Como faremos a passagem? Não sei. Claro que a solução não será os Bispos passarem o dia a mandar tweets ou a postar fotos no Instagram. De qualquer maneira, os cristãos podem ser óptimos evangelizadores trazendo Jesus Cristo às redes sociais, falando d’Ele. Estou convencido de que uma das chaves da nossa pastoral tem de ser um uso mais criterioso das redes sociais, não tanto da hierarquia, dos Bispos, dos Padres, mas de todos os cristãos que trazem a fé ao debate do dia-a-dia.

 

O Ordinariato Castrense é composto por várias capelanias (Marinha, Exército, Força Aérea, PSP e GNR). Quais são as especificidades de cada pastoral?

Há preocupações comuns a todas, como o acompanhamento personalizado e a realização de celebrações – peço aos capelães para celebrarem, pelo menos, uma Missa por semana. Depois, há aspectos específicos. É evidente que as quatro escolas de formação (a Escola Naval, para a Marinha; a Academia Militar para o Exército e a Guarda Nacional Republicana, a Academia da Força Aérea e o Instituto Superior de Forças Policiais e Segurança Interna para a Polícia de Segurança Pública) têm exigências próprias. Supõe-se que o capelão que lá esteja colocado tenha essa sensibilidade porque esses jovens estão muito ocupados, quer ao nível da formação, quer ao nível das actividades militares e físicas.

Depois, evidentemente que a forma de viver a religiosidade no Minho – e uma parte significativa dos que estão no Regimento de Cavalaria de Braga são da zona – é muito distinta da que existe em Évora, no Regimento de Infantaria nº. 1. Cada capelão deve descobrir essa especificidade.

 

Falando agora sobre a sua experiência. Era Bispo Auxiliar de Braga antes de se ter tornado Bispo Castrense. Como viveu esta mudança da realidade civil para a militar?

Fiz vida militar como capelão nos princípios da minha vida de padre e fiquei entusiasmado. Só não continuei a atividade, porque o meu Bispo tinha outros projectos para mim e mandou-me estudar no estrangeiro. Ainda assim, fiquei sempre ligado aos militares de Vila Real, que me convidavam quase sempre para as suas festas e celebrações. Quando fui para Braga, como Bispo Auxiliar, e atendendo à minha idade, não estava à espera que me chamassem depois para o Ordinariato Castrense. Houve um certo espanto. Custou-me sair de Braga, para ser sincero. Uma coisa é servir uma unidade em Vila Real, outra é servir o País, com o que isso representa, até de relação com altas chefias, autoridades políticas e governamentais. Graças a Deus, a tarefa está a revelar-se mais fácil do que pensei.

 

Estamos a comemorar os 50 anos do primeiro curso de capelães, mas a assistência religiosa, no meio militar, é uma realidade mais antiga…

O Ordinariato Castrense de Portugal foi criado há 51 anos, no dia 29 de Maio de 1966, pelo Papa Paulo VI. Foi no seguimento da criação deste serviço, que na altura se chamava Vicariato Castrense, que no ano seguinte se fez o primeiro curso de capelães – faz agora 50 anos. Mas a presença de padres no meio militar é mais antiga. A seguir à Primeira Guerra Mundial, sempre houve alguma assistência religiosa nos quartéis. Os capelães acompanhavam soldados, mas essa assistência não fazia parte do sistema porque o governo era anticlerical. Com o tempo e a mudança de regime começou a haver outra presença da Igreja – até já com nomeação canónica – nos quartéis. Ainda assim, não havia um serviço que congregasse todos estes padres, que lhes desse unidade, que de alguma maneira se responsabilizasse por eles. Foi com a criação do Vicariato Castrense que esse serviço se organizou e se estabeleceu, com cada uma das dioceses a contribuir com determinado número de padres.

 

Como surgiu a necessidade de criar um curso?

O curso dura cerca de três semanas. Dá aos capelães um enquadramento para que conheçam melhor o meio militar, desde a história à forma de organização de cada um dos ramos das forças de segurança, passando também pelas especificidades da ordem castrense (como se coordena com as dioceses territoriais, por exemplo). É ministrado por oficiais do exército ou da guarda, professores da academia e padres ou bispos.




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A diocese militar 

Ordinariato Castrense ou Diocese das Forças Armadas e das Forças de Segurança é o nome da instituição canónica que acompanha os fiéis no sector militar e policial. É composta por cinco capelanias (Marinha, Exército, Força Aérea, GNR e PSP) e entre 1966, data da fundação, até maio de 2000, teve como Ordinário Castrense de Portugal o Cardeal-Patriarca de Lisboa, acumulando as duas funções. Em maio de 2001, D. Januário Torgal foi nomeado Bispo das Forças Armadas e das Forças de Segurança, tornando-se assim o primeiro Bispo a governar esta diocese de forma exclusiva. Em 2013, foi substituído por D. Manuel Linda, que assumiu o cargo em outubro do mesmo ano.

Mais informações: http://ordinariato.castrense.pt

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Testemunho Ser cristão no quartel   Vítor Calado é militar desde 1986. Católico – chegou a frequentar o seminário na juventude – sempre esteve empenhado nas atividades da paróquia, em Albufeira, onde vive. Em 2014, quando veio para o Comando Geral da GNR, no quartel do Carmo, em Lisboa, disponibilizou-se com naturalidade para ajudar nas atividades da capelania. “Não era capaz de ser cristão, ter vida paroquial, e não me envolver nas atividades pastorais do sítio onde trabalho”, conta o tenente-coronel, de 54 anos. Todas as quartas-feiras participa na Missa semanal, no seu local de trabalho. É acólito e leitor, serviços que exerce também nas Missas festivas da instituição, como acontece no dia de Nossa Senhora do Carmo, padroeira da GNR, ou na Missa de Natal. Admite que nem sempre é fácil ser cristão ali. “É mais difícil ser testemunha no quartel do que na vida civil”, diz Vítor, explicando que a farda e as hierarquias da vida militar acabam por distanciar as pessoas.

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