Doutrina social |
Viagem do Papa a Mianmar e ao Bangladesh
Ele está no meio dos Rohingyas
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Porque a celebração do Natal nos introduz na realidade que toca o mais fundo da mente e do coração ficamos mais sensíveis para ler os sinais que ajudam a entender o mundo. O Papa foi a Mianmar e ao Bangladesh para afirmar que “a presença de Deus hoje também se chama Rohingya”.

 

De novo o “boat people”

Nos últimos meses um nome começou a repetir-se na comunicação social: rohingyas. Até então, como se diz, o que não aparece não existe. Mas já em Janeiro de 2009 saltaram para os títulos dos jornais quando estes apresentavam centenas de “boat people”, exaustas e aturdidas, resgatadas do mar e conduzidas para as ilhas de Andamã (Índia) e de Aceh (Indonésia). Mostravam a ponta do iceberg; antes de chegarem aí já tinham sido intercetadas em águas tailandesas, transferidas para ilhas desertas, torturadas e por vezes abandonadas no mar alto em barcos sem motor e com água e comida para escassos dias. Os relatos de alguns sobreviventes deixam-nos estupefatos sobre a maneira brutal como eram tratadas. Quem são essas pessoas? São uma minoria étnica que vive no Estado de Rakhine, Birmânia, junto à fronteira com o Bangladesh; são procedentes da Ásia do Sul, relacionados com os bengalis de Chittagong e muçulmanos. Isso os diferencia dos birmaneses, originários do sudeste asiático e budistas.

 

Porque são diferentes

Tais diferenças levaram a que, a partir do golpe militar de 1962 a exclusão se tenha acentuado. A Lei da Nacionalidade de 1982 confere o estatuto de cidadão a 135 “raças nacionais”. Não menciona os rohingyas, deixando-os na condição de apátridas, o que constitui uma forma cruel de exclusão, sem qualquer instância que os reconheça e proteja. É uma política deliberada dos militares para forçá-los a partir; entretanto ficam sujeitos a prisões arbitrárias, a extorsão, a violações, a trabalho forçado, a confiscação das terras; e, se conseguirem autorização para casar, têm que assinar um compromisso de não ter mais que dois filhos; se algum abandonar o país, o melhor é perder a esperança de lá voltar. Segundo relataram os Médicos Sem Fronteiras, entre 25 de Agosto e 24 de Setembro do corrente ano, morreram pelos menos 6.700 pessoas numa operação militar em Rakhine.

 

Dar voz aos sem voz

Quem esteve atento pôde aperceber-se que, com o agravar da situação, a chamada de atenção e a condenação da perseguição aos Rohingyas têm sido uma constante nos discursos e nas exortações do Papa Francisco. A visita aos dois países envolvidos neste drama não podia deixar de criar elevadas expetativas. Tudo foi claro e intencional. Em primeiro lugar estava o encontro com o povo, levando uma mensagem de esperança que passa pelo respeito da dignidade de toda a pessoa, pela tolerância para com os diferentes e na necessidade de um compromisso comum pelo bem da humanidade. A seguir queria levar o conforto fraterno de quem tem por missão confirmar a fé dos irmãos. E ainda, porque havia expetativas elevadas, era urgente deixar aos responsáveis políticos um sinal de que ele, pelas razões mais profundas da fé em Deus e na pessoa humana, tem que estar ao lado dos oprimidos e preconizar a sua libertação.

Por isso teve lugar o encontro com a controversa Aung San Suu Kyi, Prémio Nobel da Paz e, no momento, Conselheira de Estado, um cargo semelhante a Chefe do Governo, e por isso partilhando da responsabilidade por este drama. O encontro com Min Aung Hlaing, chefe do Exército de Mianmar não foi meramente protocolar, tendo o Papa afirmado que “não negociou” com a verdade. Foi uma iniciativa de “passo a passo”, procurando não outros interesses senão os dos mais desprotegidos. A defesa dos direitos das minorias, a alusão ao Estado de Rakhine (que na expressão de Suu Ki, “captou fortemente a atenção do mundo”), a dignidade e a solidariedade de todos independentemente da raça ou da religião, foram o mote dos seus gestos e das suas palavras, rejeitando aquilo que pode gerar ruido, mas que não resolve o sofrimento das pessoas, porque as denúncias “feitas de forma agressiva”, têm como resultado “fechar a porta” ao diálogo necessário para a superação dos problemas.

Para além de todas as palavras há o gesto do encontro com os refugiados rohingya em Daca, escutando-os, fazendo seu o sofrimento deles e não os deixando ir embora sem um pedido de perdão por aqueles que os perseguem e pela indiferença do mundo.

Sem o néon das avenidas e sem o frenesim das superfícies comerciais, deixou-nos um sinal de que Ele continua a não ter lugar na hospedaria. O que não nos pode deixar indiferentes.

texto por P. Valentim Gonçalves, CJP-CIRP
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