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Henrique Joaquim
“O sentido da Humanidade Comum”
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A expressão é da mensagem do Santo Padre para esta Quaresma. Tomo-a porque me parece estar a esmorecer entre nós este sentido da humanidade que a todos nos une e, por isso, nos deveria ser comum.

Este é o tempo da transformação interior e de que maneira precisamos dela. Nestes últimos tempos, são inúmeros os sinais de que nos estamos a afastar do essencial desta humanidade. É enorme a facilidade com que nos implicamos em discussões superficiais despoletadas por mensagens que não lemos ou que se lemos não aprofundamos (veja-se polémica recente em torno da mensagem do Senhor Patriarca). É impressionante como julgamos, como criticamos e até nos insultamos, antes de interiorizar, aprofundar, discutir, discernir para então dialogar.

Tem sido grande a tentação de impor em vez de propor, de penalizar em vez de compreender e cuidar e, até mesmo, amar. Refiro-me à última tentativa de criminalizar as famílias que supostamente abandonam os seus familiares mais velhos ou à nova tentativa de legalizar a eutanásia.

Numa como noutra situação está em causa, no meu modo de ver, a necessidade de nos focarmos e aprofundarmos este sentido de humanidade que a todos nos deveria ser comum. Como podemos resolver um problema de necessidade de cuidados e de apoio através da criminalização? Repare-se que a legislação já prevê este tipo de crime. Como podemos supostamente terminar o sofrimento terminando com uma vida?

Numa como noutra questão julgo que o sentido de humanidade que nos poderá unir enquanto comunidade (porque tem um sentido comum) passa antes de mais por compreendermos e acolhermos cada pessoa e cada família nesta situação. Sem dúvida, temos hoje mais respostas para apoio às famílias e às pessoas idosas e temos hoje mais serviços de apoio a um fim de vida digno. Mas estamos ainda muitíssimo aquém das necessidades existentes mas isso não se resolverá criminalizando ou administrando a morte.

Será que uma e outra hipótese nos trarão mais vida e uma vida mais humanizada? Não, sem dúvida que não, embora aparentemente resolvam as situações.

Antes de criminalizar as famílias porque não exigimos um sistema de resposta e de proteção mais eficaz? Se o sistema de proteção revela insuficiências, porque não nos envolvemos na criação de respostas pelo menos às pessoas e famílias que nos sejam próximas? Se hoje a medicina tem conhecimento e capacidade técnica para evitar a dor e proporcionar um fim de vida digno, porquê permitir a morte?

Quando procuramos resolver a nossa incapacidade de viver os nossos desafios humanos através da lei é sinal de que efetivamente algo está a fazer “esmorecer o sentido da humanidade comum”. É sinal de que efetivamente precisamos de, juntos, nos deixarmos interpelar pela voz interior que nos chama à Vida; é sinal de que necessitamos saber como nos desprender desta força exterior que subliminarmente nos vai desumanizando; é o momento de compreender que só dando‑nos mutuamente podemos realizar e desfrutar desta condição humana, pois só assim poderemos reconstruir e desenvolver “o sentido da humanidade comum”.