Missão |
Miguel Meneses, Movimento ao Serviço da Vida
Esvaziar o coração para tudo o que se vai viver em missão
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Miguel Meneses nasceu em 1995, em Lisboa. É licenciado em Ortóptica, pela Escola Superior de Tecnologias da Saúde, trabalha atualmente no Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Benavente e em outros dois sítios particulares. Vive em Lisboa, é membro do Movimento ao Serviço da Vida e já realizou diversas missões dentro e fora de Portugal.

 

Diz-nos que tem “a graça de ter uma família bem numerosa, tanto do lado da mãe como do lado do pai”. O seu percurso sempre foi realizado num ambiente católico: estudou nos Salesianos de Lisboa (da 1ª classe até ao 6º ano), frequentou a catequese, ia com frequência à Missa, etc. “As principais figuras foram talvez a minha mãe e a minha avó, do lado da mãe. Não havia sequer hipótese de ousar faltar à Missa! Claro que refilava muito porque era bem mais confortável ficar em casa a ver um filme, enrolado a uma manta quentinha, em vez de ir para uma igreja enorme, gelada, sem almofadas nos bancos, ouvir umas palavras complicadas que não ficavam muito tempo na minha cabeça. Obviamente que cedia porque a minha mãe dizia que ficava triste se não fosse e que miúdo é que consegue resistir a palavras destas ditas por uma mãe? Lembro-me de me ir questionando sobre o porquê de a minha mãe se comprometer tanto com uma coisa que não tinha aparentemente interesse nenhum para um miúdo entre os 6 e os 8 anos. Fui crescendo e tudo o que nas Missas de Domingo ouvia, foi fazendo gradualmente sentido. Todas aquelas histórias de Jesus iam despoletando algum interesse dentro de mim, mas questionava-me muito pouco ou nada sobre aquilo. Aceitava e por ali me ficava. Só quando conheci um grupo, chamado Movimento ao Serviço da Vida (MSV) e do qual faço parte nos dias de hoje, é que comecei a olhar para o Evangelho e a reconhecer a enorme potencialidade que este tem em poder ser aplicado no dia-a-dia”, partilha.

 

“Gastar forças naquilo que realmente importa”

No final de 2014 foi, com o MSV, a Alcoutim e considera que foi um marco muito importante na sua vida. “Mas só depois de me ter comprometido seriamente com o grupo, a meio de 2015, é que comecei a gastar forças naquilo que realmente importa. Até lá não fazia ideia do que era estar realmente envolvido e comprometido com alguma coisa. Atualmente, sou um dos responsáveis do Grupo de Ação e Fé (GAFE), isto é, o grupo de jovens do MSV. O GAFE tem como proposta anual reuniões de oração, de tema e de partilha, de 15 em 15 dias, uma peregrinação a Fátima, um fim-de-semana por mês a visitar os montes em Alcoutim, e ainda um Projeto de Verão, a decidir no início de cada ano. E digo-vos que tem sido um caminho bastante desafiante! É bonito olhar hoje para trás e perceber que tudo isto começou porque, sem pensar muito, aceitei um dia antes, o convite de um grande amigo meu para experimentar ir um fim-de-semana aberto em Alcoutim. E foi a partir desse momento que Alcoutim passou a fazer parte de mim. Em Alcoutim, as pessoas não vivem todas juntas na vila. Vivem nos chamados montes, e a grande maioria muito afastadas umas das outras, sem forma de se visitarem mutuamente. Vemos Jesus naquelas pessoas pela humildade, pela simplicidade, pela beleza, pela cumplicidade… Foi a partir daí que me comecei a aperceber da beleza e o poder dos pequenos gestos, dos outros e dos meus, principalmente daqueles que são executados sem a intenção de serem vistos por todos”, partilha. Desde que teve esta experiência, diz que a sua forma de “saborear a vida, o meu compromisso e o meu discernimento sobre as minhas ações têm vindo a ser constantemente aperfeiçoadas e a ser postas à prova. Coordenar a minha vida pessoal, com o MSV, com organizações pontuais da Missão País e ainda ensaiar todas as semanas com um grupo musical que tinha, foram autênticos desafios e confesso que em 2017, antes, durante e depois do meu primeiro projeto de verão fora de Portugal, utilizei grande parte das ferramentas que ganhei durante todo esse tempo”.

 

A Missão em Puebla del Rio

De 31 de julho a 31 de agosto de 2017 esteve em Puebla del Rio, “uma povoação perto de Sevilha, na qual reside uma comunidade e com uma missão tremendamente bonita. Estivemos na comunidade da Mãe de Deus, ou Onuva, como eles lhe chamam”. Sobre esta experiência, partilha: “Onuva significa ‘terra de misericórdia’ e é formada por casais consagrados, sacerdotes, irmãs consagradas, leigos consagrados e voluntários que decidam ajudar durante determinado período de tempo. A principal missão é acolher todos os que vivem marginalizados pela sociedade: acima de tudo sem-abrigo, pessoas com algum tipo de problema psicológico ou psiquiátrico e ainda pessoas que tenham problemas físicos evidentes. Estas pessoas, conhecidas como os ‘residentes’, estão lá voluntariamente, mas estão lá acima de tudo ou porque viviam sozinhas ou então porque a família não os conseguia sustentar. Neste momento, vivem lá cerca de 25 residentes e ao todo devem ser à volta de 40. Lá existe tudo: casas de banho, quartos, lavandaria, alimentação, medicação, acompanhamento médico personalizado todas as semanas… no fundo é como se fosse uma espécie de lar, mas é bem mais do que isso. Lembro-me bem de que aquele primeiro choque com a simplicidade daquela comunidade foi uma espécie de abanão que Deus me estava a dar para avisar de que era melhor que começasse já, naquele momento, a esvaziar todo o meu coração para conseguir receber tudo o daquele mês fosse viver. Em comunidade, em serviço e em oração. Naquela região perto de Sevilha, era raro o dia de verão em que fizesse menos de 33 graus à sombra, e uma das coisas sobre a qual eu me questionava quase todos os dias era, como é que toda esta organização tem água para durar mais de 20 anos, sem ter canalização de um outro local? Porque aquela ‘miragem’ está tão afastada de tudo que era demasiado dispendioso fazer-se uma rota de canalizações só para aquele sítio. Foi então que vim a saber que desde que aquela comunidade existe, a água tem vindo de um enorme lençol de água subterrâneo e que nunca deu mostras de estar perto do fim. E onde há água, há vida, e lá consegue-se abrir o coração para se conseguir dar ouvidos à vida que nos rodeia. A simplicidade com que lá se vive é de uma complexidade desmedida. A entrega total, diária, dos cuidadores, a maneira como eles dialogam entre eles sobre os “tabus” mais comuns da sociedade, a forma muito própria que eles têm de superar os contratempos e a naturalidade com que assumem um compromisso de uma vida são aspetos verdadeiramente cativantes e renovadores. Apenas o estar e o escutar pareciam bastar pois eles, talvez por me verem meio atrapalhado, sustentavam-se no meu silêncio e isso parecia ser o mais importante para eles. As caras deles reconfiguravam-se e esboçavam microexpressões de felicidade, mas que, para mim, significavam um pequeno virar de página. Eles lá são como uma família muito grande. Mas há sempre tanto mais para tirar do nosso coração e tenho noção de que aquele mês foi apenas um simples e inicial exercício de profundo discernimento. Mas tal como acontece com Alcoutim, o desafio posterior está em concretizar tudo isso que ganhamos em missão no nosso dia-a-dia. O desafio está em pôr de lado os maus hábitos e fazer valer somente os bons. Dar mais ênfase às virtudes do que aos defeitos. Hoje em dia, é-me tão especial e natural esta forma de se estar ao serviço, em oração e em comunidade, porque com toda esta estrutura que conheci há quatro anos atrás, consegui não só criar em mim uma base sólida para recomeçar, como também consegui aperceber-me de que todos os dias são bons dias para se recomeçar: connosco, com os outros e com Jesus”.

texto por Catarina António, FEC | Fundação Fé e Cooperação
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