É uma tradição madeirense em pleno Patriarcado de Lisboa. A Missa do Parto foi celebrada, pelo quinto ano consecutivo, na Paróquia de Alfragide, às 6h30 da manhã, precisamente a nove dias do Natal, pedindo o bom parto da Virgem Maria, que há-de dar à luz o Menino Jesus.
Pouco passava das 6 horas da manhã, o sol ainda não tinha nascido e o adro da Igreja da Divina Misericórdia, em Alfragide, começava a encher-se de fiéis que queriam rezar e pedir a Deus um bom parto para a Virgem Maria. É este o sentido da Missa do Parto, uma secular tradição da religiosidade popular e da cultura madeirense que começa a ganhar expressão também em Lisboa. “A Missa do Parto é uma proposta de pastoral urbana, cuja dimensão primeira é a própria celebração da fé, do mistério da fé. Depois, há também a dimensão do acolhimento e do convívio. As pessoas saem da Missa do Parto e do convívio, para as suas vidas, com alegria, paz e com um sentido de festa, de fé, que faz ecoar dentro delas algo de novo, diferente, para um Natal melhor”, refere ao Jornal VOZ DA VERDADE o pároco de Alfragide, padre Nélio Tomás, dehoniano, que trouxe para esta paróquia da Vigararia da Amadora esta celebração preparativa do Natal. “Cheguei a Alfragide em setembro de 2013. Pouco mais de um ano depois, em dezembro de 2014, era celebrada nesta paróquia a primeira Missa do Parto. Eu tinha esse desejo de organizar a Missa do Parto, mas nunca o tinha partilhado com ninguém. Pelo que, esta iniciativa, aqui em Alfragide, surgiu verdadeiramente a partir de um grupo de madeirenses que propôs a sua realização. Eu acolhi essa proposta e lancei-me na ideia”, conta este sacerdote madeirense, sublinhando que “muitos paroquianos da comunidade não tinham noção do que era a Missa do Parto”. “Expliquei-lhes qual o sentido da celebração, sobretudo na Madeira, com as novenas à Virgem do Parto, durante nove dias seguidos, antes do Natal”, salienta.
A celebração em Alfragide, na manhã de sábado, 15 de dezembro, teve início às 6h30. “Na Madeira, elas decorrem ainda mais cedo, algumas pelas 5h30 da manhã, outras pelas seis. Daí a curiosidade de muitos paroquianos, que quiseram saber como era a estrutura da liturgia, conhecer os cânticos próprios para a Missa do Parto”, refere o padre Tomás.
Madeirenses reunidos em Lisboa
Natural do Porto da Cruz, no concelho de Machico, na ilha da Madeira, o padre Tomás, de 46 anos, recorda, na sua infância, a participação nas Missas do Parto. “Na Madeira, as Missas do Parto sempre existiram em todas as paróquias. Na minha terra, enquanto criança e adolescente, lembro-me de ir à Missa do Parto com os meus pais e com a família. A partir das quatro ou das cinco da manhã, as pessoas dos vários sítios – ou aldeias, como vocês dizem cá –, iam pela estrada principal, cantando cânticos alusivos ao Natal. As luzes das casas iam-se acendendo e as pessoas preparavam-se e caminhavam, a pé, até à igreja, para a Missa do Parto”, recorda.
Salientando ter conhecimento de que “havia uma comunidade de irmãs Vitorianas, na Apelação, que tinha também a Missa do Parto”, este sacerdote dehoniano salienta que a Missa do Parto em Alfragide “é uma celebração que reúne madeirenses de várias paróquias do Patriarcado de Lisboa” e até “de lugares mais longe” de Portugal. “Para o ano, teremos nova Missa do Parto em Alfragide, muito provavelmente no dia 14 de dezembro de 2019, uma vez que esta celebração, aqui na paróquia, se realiza sempre no sábado da semana anterior ao Natal”, assegura o sacerdote madeirense.
Presépio, lugar de encontro
A Missa do Parto difere no horário, por ser celebrada ao início da manhã, antes ainda de o sol nascer, mas difere também na liturgia e no canto. Em Alfragide, o coro tinha flauta transversal, acordeão, órgão, guitarra, bandolim e cavaquinho. Pode-se até pensar que uma celebração às 6h30 da manhã não teria muitos fiéis. Puro engano. A igreja de Alfragide, na madrugada do passado dia 15 de dezembro, estava completamente cheia de cristãos, com a homilia do pároco, que presidiu à celebração, a focar-se precisamente no presépio. “Temos de olhar para o presépio e construir um lugar de encontro para todos, mas como lugar de transcendência. Neste Natal, quem não olhar para o presépio e redescobrir nele esse sentido de encontro com o mistério da Encarnação, alguma coisa falta para dar sentido, dar voz ao nosso Natal, em casa ou na família”, frisou o padre Nélio Tomás, considerando que, neste tempo de Advento, “o Deus encarnado é um vestimento na vida de cada um de nós”.
Três atitudes a aprender com Maria
Numa Missa do Parto, que reza pelo bom parto de Nossa Senhora, o padre Tomás destacou “três atitudes” que os cristãos podem aprender com a Virgem: a escuta, a honestidade e o serviço. “Maria é a mulher da escuta. Ela não está desligada, deixa-se visitar e revisitar, porque tem as portas abertas, tem o seu coração aberto a Deus, à transcendência. Por vezes, nós vivemos uma vida desligada do nosso mundo, da nossa realidade, do nosso ser, mas um Anjo só nos visita quando estamos disponíveis para o acolher, como Maria o fez”, começou por explicar. Sobre a segunda atitude, o pároco de Alfragide apontou que “Maria convida a olhar para a atitude da honestidade”. “Deus não é um ornamento para cada um de nós ou para a humanidade. É importante fazer perguntas, tal como Maria fez, e abrir o coração; mas também colocar lá a razão. A fé não pode ser vista apenas como um sentimento. É importante que cada um de nós procure ser honesto na sua vida espiritual, para redescobrir este sentido de plenitude”, salientou o sacerdote, destacando depois a terceira atitude: “Maria, neste encontro com o Anjo, está ao serviço de uma vida melhor. O Senhor chama-a a colocar-se ao serviço de uma felicidade maior. Que cada um de nós mostre, neste Natal, neste dia que estamos a celebrar a Missa do Parto, esta atitude como Maria o fez, diante do mistério de Deus, mas sobretudo saibamos olhar mais alto. Deus conta contigo. Por isso, saibamos contar sempre com a sua graça”.
Em tempo de Natal, o padre Tomás terminou a homilia da Missa do Parto apelando ao encontro com o Deus Menino. “Não basta fazer. É preciso fazer com amor. Não basta preparar. É preciso fazê-lo com alegria, com entusiasmo. Não basta caminhar. É preciso aplanar, limar arestas. Não basta converter-se. É preciso dedicar-se, é preciso ser generoso. Vamos chegar ao presépio na medida em que sentimos que ele vai nascendo dentro de nós. Só podemos reconhecer Aquele que nasce, se já o trouxermos nascido no fundo da nossa alma. Construir o presépio como encontro pessoal com Ele e encontro pessoal com todos, neste Natal”, desafiou o pároco de Alfragide, na homilia da Missa do Parto.
A celebração terminou e o convívio começou. Pela hora a que estávamos, cerca das 7h30 da manhã, havia torradas. Mas havia também carne vinha d’alhos, a poncha, a broinha de mel, o bolinho da Madeira. Tudo, tal como manda a tradição madeirense.
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Uma celebração para preparar o Natal
No início da Missa do Parto em Alfragide, Eduardo Franco deixou uma breve explicação sobre a celebração. “Esta é uma tradição madeirense que agora ressurge, no século XXI, em força. Vem de uma novena que se realizava a partir dos dias 16, 17 de dezembro, para preparar o Natal, e chegou à Madeira, certamente, pelas mãos dos Franciscanos. As Missas do Parto acabam por ser uma metáfora usada como estratégia pastoral para preparar as celebrações do Natal. As pessoas trabalhavam de sol a sol e esta celebração, ao início da manhã, ajudava-nos a imaginar a ajudar Nossa Senhora para o parto. A metáfora significa precisamente a preparação de cada um de nós para nascer com Jesus, no Natal”, explicou.
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NEC Madeira organizou três Missas do Parto em Lisboa
Foram três Missas do Parto, em dias consecutivos, sempre às 6h30, e em locais distintos de Lisboa. A organização pertenceu ao NEC (Núcleo de Estudantes Católicos) Madeira, um grupo que reúne jovens católicos madeirenses que estão a estudar na capital portuguesa. “Trouxemos a Missa do Parto, que é uma tradição muito forte na ilha, e assim criámos espírito de grupo no próprio NEC Madeira. Ao mesmo tempo, as celebrações ajudaram a divulgar o grupo, dando-o a conhecer a outros jovens”, salienta Pedro Pita, do NEC Madeira, ao Jornal VOZ DA VERDADE, explicando que as Missas do Parto decorreram durante a semana, nos dias 11, 12 e 13 de dezembro, “para não se sobreporem à Missa do Parto em Alfragide, que é uma celebração que já existe há mais tempo e que acaba por congregar muita gente”.
Nas três celebrações, participaram “mais pessoas” do que no ano passado. Primeiro, no dia 11 de dezembro, a Missa do Parto decorreu na Igreja de Nossa Senhora do Amparo, em Benfica. “A celebração em Benfica surpreendeu-nos e deixou-nos muito contentes, porque não estávamos à espera que aparecesse tanta gente, por ser uma paróquia longe das faculdades”, refere Pedro. Seguiu-se, no dia 12, a Missa do Parto na Paróquia do Campo Grande. “A celebração no Campo Grande é sempre a Missa do Parto mais universitária. Tivemos jovens de outros NEC’s e movimentos da Igreja, que convidaram colegas madeirense das suas faculdades a participar. Acabaram por aparecer jovens que disseram estar em Lisboa há três ou quatro anos e que, neste tempo, nunca tinham ido a uma Missa ou à igreja… Para nós, foi marcante”, assume. A 13 de dezembro, a Paróquia de São Tomás de Aquino, que tem como pároco um sacerdote madeirense, o padre Nélio Pita, recebeu a terceira Missa do Parto. “Em São Tomás de Aquino, que foi a última e costuma ser a mais forte, a celebração decorreu na capela lateral e tivemos acordeão, o cavaquinho, houve grupos que dançaram, as pessoas trouxeram coisas para partilhar no final da Missa e apareceram também muitos adultos madeirenses, que estão cá a trabalhar, e algumas irmãs religiosas da Madeira. Foi muito bom”, garante Pedro Pita, um jovem de 22 anos, natural da Calheta, na Madeira, que está em Lisboa há cinco anos, estando atualmente no 4º Ano de Teologia, na Universidade Católica.
Fundado em setembro de 2017, o NEC Madeira reúne jovens católicos madeirenses que estão em Lisboa a estudar. “A nossa sede é no Campo Grande, apesar de também realizarmos atividades fora da paróquia. O nosso objetivo é criar uma marca católica nos jovens madeirenses. Este grupo pretende fomentar a amizade entre as pessoas e integrá-las nas paróquias”, refere Pedro Pita, um dos fundadores do NEC Madeira, que tem atualmente “cerca de 30 elementos, sendo que 15 são muito ativos”.
Informações: www.facebook.com/nec.diocesedofunchal
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