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Pedro Vaz Patto
Um elo de unidade na família
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Tinha já enviado o texto desta minha habitual crónica, em que abordava um tema de atualidade que me parece de grande importância, quando um acontecimento de âmbito pessoal e familiar me levou a substituir esse texto. Na verdade, esse acontecimento (o falecimento de uma tia), para além de me causar particular emoção, suscita uma reflexão que me parece de igual importância e de um alcance que ultrapassa essa minha esfera pessoal.

A propósito do papel insubstituível da família e de cada um dos seus diferentes membros, tem-se enaltecido o papel da mãe, do pai, dos avós e dos irmãos. O testemunho da vida desta minha tia, que pode ser semelhante ao de outras, leva-me a enaltecer também o papel que em muitas famílias desempenham os tios.

A minha tia Madalena, solteira, que vivia na casa que foi dos meus avós, era um elo que, mais do que ninguém, unia uma família numerosa de oito irmãos e seus descendentes de várias gerações. Com muito amor e dedicação e superiores dotes culinários, reunia anualmente todos os membros da família, que se iam multiplicando de ano para ano e que ultrapassaram a centena. Para preparar esse almoço, tirava vários dias de férias. Ela mesma confecionava todos os alimentos, com a ajuda de uma empregada que também considerava da família (na verdade, foi ela quem cuidou dessa empregada durante uma prolongada doença). Fazia questão que nada faltasse, aliás, que houvesse muitas sobras, para que todos levassem para casa essas sobras (que davam para mais refeições).

Esses almoços serviam de elo de unidade de toda a família. Sem eles, muitos dos seus membros não se encontrariam, ou talvez até nem se conhecessem. Geravam um ambiente de alegria e comunhão que nunca deixou de existir entre todos.

Penso que a minha tia Madalena encontrou deste modo a sua autêntica vocação de serviço à família. Não será caso único. Aliás, uma outra minha tia solteira, com as características próprias de uma diferente personalidade, desempenha hoje um papel análogo, de elo de unidade desta família cada vez mais numerosa.

Quando a minha tia Madalena adoeceu, foi, naturalmente, alvo das atenções dos irmãos, sobrinhos e sobrinhos netos, que para com ela sentiam profunda gratidão. A sua doença exigiu, a partir de certa altura, o seu acolhimento num lar. Particularmente dolorosa terá sido esta última fase da sua vida, além do mais por causa das restrições de visitas (que antes da pandemia, eram muito frequentes). Não consigo imaginar a solidão que ela, como muitos outros na sua situação, possa ter sentido. Certamente esse seu sofrimento (como o de muitos outros idosos na sua situação, que só desse modo poderá ter sentido) serviu de preparação para o seu encontro pleno e definitivo com Deus.