Entrevistas |
Frei Fabrizio Bordin, delegado provincial dos Frades Menores Conventuais em Portugal
JMJ é “uma grande oportunidade” para mostrar Santo António aos jovens
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Frei Fabrizio Bordin acredita que a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023 é a oportunidade para dar a conhecer, entre os jovens, a figura “mais desconhecida” de Santo António, aquela que vai para além do “folclore”. Em entrevista ao Jornal VOZ DA VERDADE, este religioso da Ordem dos Frades Menores Conventuais afirma que a “opção preferencial pelos pobres” é um “grande desafio” e destaca a sensibilidade dos leigos para porem em prática os apelos do Papa na encíclica Laudato si’.

 

No ano passado, assinalaram-se os 800 anos da vocação Franciscana de Santo António. Nessa altura, o frei Fabrizio publicou vários textos, na revista ‘O Mensageiro de Santo António’ – dos Frades Menores Conventuais –, onde assinalava que ainda há uma parte da vida de Santo António por descobrir. O que falta então conhecer?

Este ano, saiu um livro, na edição italiana, com o título ‘Santo António desconhecido’, escrito por um realizador. Conta parte das origens de Santo António, aqui, em Lisboa, e sobretudo em Coimbra, utilizando um pouco de ficção – por não se encontrarem dados – a partir das tradições existentes na Igreja e na sociedade da Idade Média. Temos três décadas importantes que precisávamos de conhecer melhor: em primeiro lugar, a infância e a juventude, em Lisboa. E nós sabemos que os primeiros anos da nossa vida, o nosso contexto familiar, social, eclesial, são muito importantes para descobrir e entender a personalidade de qualquer pessoa, e também de um santo; depois, sobre o tempo passado em Coimbra, onde temos António na Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho. Toda a sua formação académica, cultural, religiosa, a ordem do sacerdócio e, depois, a passagem para a Ordem Franciscana; por último, temos outra década, que corresponde ao tempo que António passou entre Itália e França. Aliás, por estes dias, nós, franciscanos, celebrámos os 800 anos (30 de maio de 1221) do encontro entre Francisco e António, em Assis. Foram anos tão intensos, que o tornaram naquilo que é hoje o santo amado por todo o mundo, pela sua proximidade, pregação...

 

É por isso que, ainda hoje, em Itália, quando se referem a Santo António, referem-se apenas a ‘O Santo’…

É interessante, porque isto raramente nasce dos contextos mais eclesiais. É dentro da vida do povo, e foi o povo quem batizou o santo, na cidade de Pádua. Como vemos, na cidade de Lisboa, há uma maneira de viver Santo António que pertence ao povo e outra que pertence ao mundo clerical, da Igreja, da cultura.

 

Faz falta trazer um pouco mais desse conhecimento de Santo António que não está tão enraizado no povo?

Eu acho que o povo ficou esquecido, abandonado, na sua devoção. Parece-me que não há um diálogo mais próximo entre a devoção popular – que é feita de muitas formas, tais como casamentos, tradições, ou a lembrança de recorrer a Santo António quando a pessoa está com algum problema na sua vida –, e tudo aquilo que nós, nestas últimas décadas, conhecemos através dos sermões, onde podemos conhecer mais a sua espiritualidade, a sua riqueza, o mundo em que vivia, a maneira de pregar, de anunciar o Evangelho. Aproveitamos pouco tudo isto para conhecer mais por dentro a figura de Santo António. Há quem diga – e eu concordo – que temos dois Antónios: o António da devoção, do folclore, e o António histórico, doutor da Igreja. Não podemos mantê-los separados.

 

O caminho de preparação da Jornada Mundial da Juventude poderá ser uma oportunidade para apresentar a vida deste santo aos jovens?

Eu acho que é uma grande oportunidade! Desde que foi anunciada a Jornada Mundial da Juventude em Lisboa, houve vários frades que me interpelaram e a Igreja italiana também se mostrou interessada, através dos responsáveis da pastoral juvenil, junto dos nossos frades, para criar um laboratório sobre Santo António, de forma a preparar os jovens para a Jornada Mundial da Juventude. Depois, com a situação de pandemia, não foi possível organizar um encontro entre representantes dos jovens e dos frades de alguns países da Europa, aqui em Lisboa, para se encontrarem com o nosso Patriarca e os nossos frades e iniciarem esse laboratório. Achei uma ideia muito boa, porque não podemos apresentar António aos jovens do alto para baixo, ou seja, sermos nós a dizer o que representa Santo António para os jovens do nosso tempo. Nós podemos ajudar na leitura histórica, mas precisamos dos jovens para traduzirem a figura de António aos seus colegas.

 

Para si, enquanto frade, o que mais o impressionou na vida deste santo?

Eu escrevi, na revista ‘Mensageiro de Santo António’, que nós não temos muitas informações sobre Santo António porque, nos seus sermões, ele nunca fala de si mesmo, não é um homem autorreferencial. Acho que este é um aspeto muito importante. Porque é que nós sabemos pouquíssimo da sua infância? Primeiro, porque quem escreveu as biografias não tinha os testemunhos dos familiares próximos, dos frades que tinha conhecido, etc... mas também porque António não andou a falar muito da sua vida. Não digo que não tenha falado por estar envergonhado ou outras coisas, mas pelo sentido de discrição, de humildade, de uma pessoa que não está centrada em si mesma. Tornou-se tão famoso, mas não se construiu, como é um pouco o estilo de hoje, na nossa sociedade.

 

Como é que a inspiração franciscana, pela qual se apaixonou Santo António, pode estar presente, hoje, nas paróquias de Santa Beatriz da Silva e do Vale de Chelas, onde é pároco?

Procuramos transmitir a presença de uma comunidade franciscana que tenha o olhar preferencial também pelos mais pobres. Mas é fácil encher a boca com esta expressão... Vejo um grande desafio, sobretudo, nestes últimos tempos em que, quer o Papa Francisco, quer a realidade que se criou neste tempo de pandemia, obriga-nos a sair mais para fora, a não viver só da organização, do dia a dia da paróquia, dos grupos e de todas as atividades. Eu digo sempre que o cartório não está entre as quatro paredes da igreja, mas na rua, onde encontramos gente que faz as perguntas mais variadas... Aqui, vejo o António de Lisboa, de Pádua, hoje, 800 anos depois.

 

Como é que a encíclica Laudato si’, do Papa Francisco, inspirou a vida das suas paróquias?

Sinto-me desafiado por uma sensibilidade muito forte no que diz respeito ao cuidar da casa comum e que a encíclica Laudato si’ propõe – e é uma magna carta, nesse sentido. Sinto-me muito desafiado pelos leigos que são sensíveis a esses temas e esperam muito também de nós, franciscanos.

Na paróquia de São Maximiliano Kolbe temos um foco ecológico (ver caixa), graças a Manuela Silva [economista falecida em outubro de 2019], que eu tinha convidado para falar aos frades. Ela ficou entusiasmada e não largou a ‘presa’, e, assim, demos início ao foco ecológico. Nestes últimos tempos, houve uma sequência de acontecimentos, a começar pelo Papa, que não desiste de um compromisso, uma conversão ecológica a todo o campo, a todo o terreno, e, portanto, também nas paróquias, nas comunidades religiosas e nas famílias. Também se assinalaram os cinco anos da encíclica, com o Ano Laudato si’, que concluiu com a criação de uma plataforma para uma ação concreta. Portanto, ou fechamos os olhos e os ouvidos, ou fazemos alguma coisa para cuidar do ambiente. Vejo que essa sensibilidade, a nível de rede, está a entrar nas famílias, na catequese, nos grupos... mas é um caminho longo. Não é de um dia para o outro que saímos da nossa zona de conforto.

 

O exemplo de mobilização da paróquia para os desafios colocados pelo Papa Francisco, na Laudato si’, pode ser um exemplo a seguir por outras realidades juvenis, sobretudo neste caminho de preparação da JMJ?

Sei que já nas últimas jornadas começou a entrar este tema da conversão ecológica. Embora não tenha estado presente no Panamá, em janeiro de 2019, sei que se criou uma aldeia Laudato si’, em que os franciscanos estavam envolvidos. Acho que temos de ver a Jornada Mundial da Juventude com esta dimensão de saída para fora, não no sentido de um bom momento para os católicos com o seu pastor, mas algo de novo no nosso tempo. O tema do ambiente, mas também o tema da economia de comunhão e outros, e também o contributo das religiões para a paz, são os grandes desafios para a Jornada Mundial da Juventude e penso que, nisto, é importante envolver os jovens para serem eles a encontrarem uma linguagem mais própria para transmitir essa sensibilidade a outros jovens.

Num encontro das famílias da nossa comunidade, dedicado ao Ano Laudato si’, enquanto os pais faziam um trabalho sobre alguns temas, os filhos fizeram a mesma coisa, e foi interessante ver como os filhos foram buscar formas de poluição que nem os pais pensaram... Foram coisas que eles propuseram onde, nós, adultos, nem nos damos conta. O perigo é escrevermos isto em documentos e não entrarmos numa escolha mais concreta. Aqui, se calhar, a JMJ pode marcar uma diferença.

 

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Foco Ecológico de Marvila

Cuidar da casa comum “é mais do que seguir as boas práticas ambientais”

 

O Foco Ecológico de Marvila nasceu em resposta aos desafios deixados pela encíclica Laudato si’, do Papa Francisco. Através do apoio dado por Manuela Silva, da Rede Cuidar da Casa Comum, o desafio “é muito mais do que seguir as boas práticas ambientais e passa também pela mudança de comportamento com os outros e encontrar coisas muitos concretas que nos ajudem a concretizar esse objetivo”, partilha, ao Jornal VOZ DA VERDADE, Cláudia Amaral, uma das responsáveis por esta iniciativa, que ressalva haver ainda “um bom caminho para andar”.

Das iniciativas já realizadas e que congregam, habitualmente, vários grupos da comunidade paroquial e de instituições locais, Cláudia destaca o ‘Terço ecológico’, a partir de reflexões da Laudato si’, que decorreu no passado mês de maio, no Parque da Bela Vista. Mas as respostas aos desafios também se concretizam “na entrega de alimentos a famílias necessitadas”, “projetos específicos sobre o Ano Laudato si’ na catequese e na Pastoral Familiar”, e até compostagem, cujo material resultante “é distribuído pelo parque hortícola que temos junto às nossas igrejas”, conta esta leiga.

Para o futuro, Cláudia Amaral deseja que a “conversão ecológica” vá além “de um gesto bonito, de uma boa ação”. “É mesmo necessário mudar comportamentos, mas mudar vindo do interior, com a preocupação e consciência de cuidar da casa comum e, todos juntos, fazermos o que nos compete”, sublinha. “E rezar, porque nada disto é fácil, sobretudo devido ao nosso comodismo do dia-a-dia”, acrescenta.

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