Lisboa |
Inauguração da nova casa da Ajuda de Berço, em Benfica, Lisboa
De milagre em milagre
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O Cardeal-Patriarca de Lisboa benzeu, no dia 13 de outubro, a nova casa da Ajuda de Berço, em Benfica, construída para continuar o objetivo de acolher bebés abandonados e de acrescentar mais uma valência, destinada a crianças com “doenças crónicas e incapacitantes”. Para a diretora, Sandra Anastácio, esta obra é fruto de “mais um milagre” que Deus fez na vida da instituição apoiada pelo Patriarcado de Lisboa.

 

Em 2018, por ocasião da comemoração dos 20 anos da Ajuda de Berço, a diretora Sandra Anastácio projetava, ao Jornal VOZ DA VERDADE, a construção da nova casa como “um desafio difícil”. Hoje, com o “sonho cumprido” e durante uma conversa que decorreu com vista para o jardim “amplo, verde, livre” que as crianças poderão, brevemente, “desfrutar todos os dias”, esta responsável considera este desafio como “mais um milagre” na história desta instituição que tem “dependido, desde a sua criação, do povo católico”. “Esta casa é a prova de um verdadeiro milagre. Sozinhos, não conseguimos fazer isto”, considera Sandra Anastácio, que sublinha a importância dos vários contributos que ajudaram a pagar esta obra, orçamentada em 2,3 milhões de euros. “Houve pessoas que foram fundamentais neste processo” e, para além das implicações do concurso público a que a obra esteve sujeita, também “encontrámos uma empresa de construção muito humilde e que nos permitiu fazer uma ‘ginástica’”. “O jardim, por exemplo, foi totalmente oferecido, desde as plantas às árvores, que agora ainda são bebés, mas que serão árvores de grande monta, daqui a 10 anos. Isto é mais um grande milagre”, considera, sorridente.

Ao longo do processo, Sandra Anastácio revela que pensou desistir, perante as dificuldades, mas a “força de Deus” levou a melhor. “Pensava sempre que esta obra não era minha, ela pertence ao Todo-Poderoso e pedi a Ele que me desse forças, porque isto é inimaginável”, assume. “Eu sei defender projetos de vida de crianças, portanto não tinha capacidade alguma para pôr uma casa de pé. A força que vem de Deus é mais um milagre! Como é que nós, servos inúteis, conseguimos fazer coisas fantásticas?”, questiona.

 

Um desafio

A história da nova casa da Ajuda de Berço em Benfica inicia-se com um desafio. “Em 2008, recebemos um menino muito doente e não tínhamos capacidade para o ter na nossa casa. Recorríamos várias vezes aos serviços de urgência e os médicos ficavam escandalizados como tínhamos recebido esta criança, sem condições. E nós dizíamos a verdade: ‘Somos uma associação que tem uma missão, um determinado perfil e que aceitamos as crianças que ninguém quer. Ninguém queria este menino e nós quisemos. Agora, queremos tratar dele, ajudem-nos!’. Perante a crítica de um médico, fiz-lhe um desafio: o de ele, comigo, construirmos uma casa melhor, para acolher crianças como aquela. E ele aceitou o desafio! Depois, não ficou no desafio, mas eu fiquei. Foi este o mote que fez construir esta casa”, explica a diretora.

Com esta casa, surge assim uma nova valência, destinada a acolher estes “meninos especiais” – como Sandra Anastácio prefere chamar. Para além de transitarem para este novo edifício os 20 bebés que residem na casa da instituição, localizada na Avenida de Ceuta (que vai encerrar), vão-se juntar outras 15 crianças, até aos 16 anos, que necessitam de “ajuda muito especializada”.

 

Uma casa portuguesa

Situada no centro de uma das freguesias mais populosas do concelho de Lisboa – Benfica, a nova casa/sede da Ajuda de Berço começa por recordar, a quem entra, o imaginário de uma “típica casinha portuguesa”, desenhada por uma criança, “com um telhado e um quadradinho”. “É uma casa que é feita de amor, de afetos, de cuidados, de ternura. Nesse espaço, há uma receção e gabinetes para receber as visitas que os pais fazem às crianças. Depois, a quem é dado acesso a entrar mais dentro da casa, desce ao primeiro piso e encontra a casa propriamente dita, com duas alas distintas, cada uma com cinco quartos. Do lado esquerdo, os quartos dos meninos crescidos doentes e, do lado direito, a casa dos bebés. Depois, descemos mais um piso e encontramos a área de serviços, armazéns e escritórios, onde vão ficar as várias equipas. Este último piso terá também vista para o jardim que as crianças irão desfrutar todos os dias. Era um sonho ter um espaço verde, livre, amplo para que as crianças pudessem correr livremente”, revela.

 

À espera de mais um milagre

E porque “na Ajuda de Berço o Natal é sempre”, existe ainda mais um “milagre” à espera de acontecer. “A casa está acabada, mas pronta para ser equipada”. A inauguração da nova casa, marca também o início da campanha de angariação de fundos para a compra do equipamento necessário para acolher as crianças. “Como somos uma instituição particular sem fins lucrativos, continuamos a precisar de ajuda, quer para equipar a casa, quer para, mais à frente, continuar a alimentar a casa no dia-a-dia, nas suas necessidades”, explica Sandra Anastácio, apelando à generosidade de todos [ver caixa]. “Temos um orçamento de 300 mil euros para a compra desses equipamentos. Essa é a nossa meta até dezembro. Estou certa de que será outro milagre”, garante.

O trabalho desta instituição é realizado por 69 pessoas, divididas entre equipa técnica, equipa de cuidadoras e serviços gerais e está previsto um “reforço” da equipa de cuidadores para dar resposta à nova valência que também necessita de um novo protocolo com a Segurança Social. “Também aí esperamos um milagre”, refere a diretora, frisando que a instituição passa a “dar resposta” a uma necessidade que o Estado “não consegue dar”, que é a de “acolher crianças em situação de abandono e que tenham uma doença crónica associada”. “Muitas destas crianças não têm uma família biológica, não são candidatas para adoção e não cabem no acolhimento familiar”, refere. “É preciso que o Estado português se responsabilize, juntamente connosco, e nos ajude a tomar conta das crianças”, reforça.

 

Marca da pobreza

Sandra Anastácio está nesta instituição desde a sua criação, há 23 anos, e destaca os principais problemas que levaram – e continuam a levar – as crianças a entrarem na Ajuda de Berço. “A negligência dos pais, os problemas socioeconómicos e habitacionais”, a que se veio juntar, nos últimos anos, “uma grande incidência de problemas de saúde mental” são os principais motivos pelos quais as crianças entram na instituição. Em todos os casos, existe a marca comum da “pobreza”. “Há uns anos atrás, encontrávamos muitas crianças indesejadas, que acabavam abandonadas. Isto, hoje, não acontece ou acontece muito pouco. Nem todos os pais são bons pais e quando falta a saúde mental é difícil ser bom pai. A nossa postura é, em primeiro lugar, tentar perceber e ajudar a família. Quando uma criança entra aqui, as primeiras pessoas a quem temos que ajudar são os elementos da sua família. A criança entra sozinha, mas traz, atrás de si, uma ‘bagagem’ que é a família”, aponta. “É preciso agarrar a família e acompanhar com todas as outras estruturas que estão na comunidade: segurança social, serviços de saúde, paróquias e outras instituições de solidariedade e criar uma rede de apoio para as pessoas que precisam de ajuda. Esse é o nosso objetivo”, assume.

Para a diretora da Ajuda de Berço, continua a ser difícil “ver o sofrimento das crianças ao entrar na instituição”, mas o desejo de todos os colaboradores é o de que as crianças saiam dali para “aproveitar a infância onde é normal: numa família”. “Pretendemos que caminhem sem ‘bangalas’, sem nós”. “Em 422 crianças recebidas, as que voltaram atrás para pedir ajuda foram muito poucas. Ao recuperar uma criança, recuperamos uma família!”, destaca.

 

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“O cuidado das crianças é um sinal do Reino”

Na inauguração da nova casa da Ajuda de Berço, o Cardeal-Patriarca de Lisboa agradeceu o contributo de todos os benfeitores e referiu que o Reino de Deus “começa, precisamente, pela atenção aos mais pequenos”. “Esse é o lugar de Deus como criador de todas as coisas”, prosseguiu. Antes do descerramento da placa, D. Manuel Clemente apelou ainda à “confiança”, que ajuda a explicar a concretização desta obra que foi inaugurada na tarde de dia 13 de outubro – data em que se assinala a última aparição de Nossa Senhora aos Pastorinhos. “É a partir dessa confiança que a vida vai acontecendo. Se não temos este treino na confiança da paternidade divina, começando pelos seus sinais na maternidade e paternidade humanas, dificilmente crescemos”, avisou o Cardeal-Patriarca.

Na sua intervenção, o Presidente da República agradeceu o papel “incansável” do Cardeal-Patriarca de Lisboa no processo de construção da nova casa da instituição.  “Acreditou muito e proporcionou, no Patriarcado, a contribuição para esta obra. Também aí traduziu, em atos, aquilo que era uma intenção”, observou Marcelo Rebelo de Sousa.

Começando por enquadrar o nascimento da Ajuda de Berço, em 1998, num “momento de reflexão e decisão na sociedade portuguesa que tinha por centro o debate acerca da vida”, o chefe de Estado disse compreender o papel daqueles que continuam a agir em defesa da vida. “Todos os dias há desafios à causa da vida, ou no começo, ou no termo, ou ao longo dela. Por isso, é perfeitamente natural que aqueles que estão sensíveis a essa causa, não se esqueçam dela nem um segundo”, afirmou. Por último, o Presidente da República partilhou a reflexão acerca da discussão na sociedade “sobre a melhor forma de enquadrar as crianças nas situações de risco, que são a razão de ser da Ajuda de Berço”. “A última grande discussão é se não é o caminho preferível, abandonar a via da institucionalização e apostar no enquadramento familiar, pensando nas famílias de origem, mas, em muitos casos – cada vez mais –, em famílias adotivas ou de acolhimento. Ultimamente, tem havido programas públicos, mesmo a nível orçamental, orientados para essa finalidade. Nenhuma dessas várias pistas anula as outras. É muito importante que haja uma aposta em mais famílias de acolhimento, com mais meios para esse acolhimento. Não é isso razão para, nomeadamente, a Segurança Social deixar de ver com apreço o testemunho e a obra daquelas instituições, baseadas no voluntariado, que criaram verdadeiras famílias de acolhimento. Teremos que conjugar as diversas dimensões, não deixando ninguém para trás, aproveitando o contributo de todos”, afirmou.

Já a diretora da Ajuda de Berço, Sandra Anastácio, salientou que a nova casa é “fruto do poder da amizade e da fé” e garantiu o compromisso da instituição no cuidado das crianças a seu cargo: “A Ajuda de Berço compromete-se a dar tudo o que que tem e sabe para proteger as crianças que nos são confiadas”, assegurou.

 

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Como ajudar a Ajuda de Berço?

Pode efetuar a sua contribuição monetária através do site www.ajudadeberco.pt ou pedindo mais informações através do email ajudadeberco@ajudadeberco.pt. Pode também acompanhar a página da Ajuda de Berço no Facebook (www.facebook.com/AjudaDeBercoOficial), para saber quais os bens mais necessários para cada mês. É ainda possível entregar bens na nova casa/sede da instituição, na Rua Jorge Barradas, 12, em Benfica.

texto e fotos por Filipe Teixeira
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