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P. Gonçalo Portocarrero de Almada
As corridas de Maria Madalena

Para Maria Madalena, foi muito agitado aquele primeiro dia da semana. Ela e as outras santas mulheres que acompanharam Jesus até à sua sepultura, não tinham podido lavar e perfumar o seu corpo morto, porque a iminência do sábado as proibia desse piedoso exercício, sob pena de contraírem a impureza legal. Por isso, passado o sábado da Páscoa judaica, já no primeiro dia da semana, que não em vão antecede o dia que, entre nós, recebe o nome de segunda-feira, apressaram-se em direção ao túmulo de Cristo, no que foi a sua primeira corrida daquele dia memorável.

As santas mulheres não sabiam como retirar a pedra que fechava a gruta onde o corpo Senhor fora depositado. Talvez também temessem que os soldados, que ficaram de guarda à sepultura, lhes impedissem a entrada. Mas, para seu espanto, a pedra já tinha sido retirada, os soldados tinham debandado e o sepulcro estava vazio!

Ante esta inexplicável surpresa, Maria Madalena corre de imediato para Jerusalém, para avisar Pedro e João da ocorrência, que não tem dúvidas em interpretar como um roubo sacrílego: “O Senhor foi levado do sepulcro e não sabemos onde o puseram.” (Jo 20, 2).

A terceira foi logo a seguir, porque os apóstolos, surpreendidos pela notícia, não acreditaram em Maria Madalena, supondo que, talvez, se tivesse enganado em relação à sepultura de Jesus e, por isso, o tivesse procurado noutro que não o túmulo que José de Arimateia generosamente disponibilizara para este efeito. “Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo correu mais do que Pedro e chegou primeiro ao túmulo” (Jo 20, 4): João, a quem se atribui a autoria do quarto Evangelho, não deixou de registar esta sua vitória, que está longe de ser apenas um efémero triunfo desportivo.  

Com efeito, apesar de ter chegado em primeiro lugar, João não entra no sepulcro, pois entende que deve dar a prioridade a Pedro, porque foi ele que foi instituído pelo Senhor como primeiro Papa. Que maravilhosa delicadeza a do apóstolo que o Senhor amava e que, naquela circunstância tão singular, poderia ter julgado Simão indigno desse tratamento respeitoso! Com efeito, Pedro, apesar de jurar solenemente que nunca trairia o Mestre, por três vezes O negara e nem sequer assistira à sua morte na Cruz. Pelo contrário, João não só nunca negou Jesus, como esteve ao lado do Mestre quando este morreu na Cruz, depois de lhe ter entregue sua Mãe, Maria, como sua e nossa Mãe (Jo 19, 25-27). Mas João sabia que, embora apóstolo, não lhe cabia julgar Pedro, mas segui-lo como sempre seguira, fielmente, o Senhor.

Simão Pedro entrou, então, no sepulcro e, depois, também João o fez. Ambos observaram que o corpo morto de Cristo estava ausente, mas não assim as mortalhas que o tinham envolvido. Só então acreditaram, não ainda na ressurreição de Cristo, mas em Maria Madalena.

Enquanto Pedro e João, confirmada a ausência de Cristo do sepulcro, regressam a Jerusalém (Jo 20, 10), Maria Madalena permanece nas suas imediações, na esperança de encontrar quem a esclareça sobre o paradeiro do cadáver desaparecido. É então que descobre alguém, que pensa ser um trabalhador do campo, talvez até quem tirou do sepulcro o corpo do Senhor. Mas, quando interroga o estranho, descobre, para seu grande espanto, que é o próprio Jesus!

É significativo que a exclamação então por ela proferida – Rabbuni! (Jo 20, 16) – traduza o imenso respeito que Jesus lhe merecia, negando rotundamente as intimidades que alguns falsos exegetas pretendem agora atribuir à relação da discípula com o Mestre. Também o ‘distanciamento social’ que o glorioso ressuscitado lhe impõe – “Não me detenhas, pois ainda não subi para o Pai” (Jo 20, 17) – corrobora esta verdade histórica, que desmente categoricamente as fantasiosas suposições de um inverosímil romance entre ambos.

Já tinham sido três as vezes que Maria Madalena tenha feito, naquele dia, o percurso entre a cidade de Jerusalém e o Santo Sepulcro: a primeira, na companhia das santas mulheres; a segunda, quando foi avisar Pedro e João; a terceira, acompanhando-os, não sabemos se ao ritmo acelerado de João, ou à mais moderada velocidade de Pedro, até ao túmulo vazio de Jesus. Contudo, não lhe faltou a força, nem o ânimo sobrenatural, para a sua quarta corrida daquele dia, desta feita para anunciar aos apóstolos a boa nova da ressurreição: “Vi o Senhor!” (Jo 20, 18).  

Graças a estas suas corridas e por ter sido quem anunciou aos Doze o que eles deviam transmitir a todo o mundo, Maria Madalena, que foi a primeira grande maratonista da fé pascal, mereceu ser cognominada apóstola dos apóstolos. Não há, na Igreja, nenhuma missão mais urgente e universal do que esta, a que estão chamados todos os homens e mulheres cristãos: anunciar a Ressurreição do Senhor! Santa Páscoa!