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Seminarista raptado em 2020 recorda Michael Nnadi morto em cativeiro
“Viver sem medo…”
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Tinha 19 anos quando homens armados invadiram o seminário e o levaram. Foram raptados mais três jovens. Um deles, acabaria por ser assassinado em cativeiro. Kanwai Tablat assistiu a tudo. Os quatro seminaristas eram chicoteados quando os obrigavam a telefonar para as famílias pagarem o resgate. Foi uma experiência aflitiva, mas Tablat mostra-se hoje mais seguro da sua vocação: ser sacerdote…

 

“Era um dia como outro qualquer à excepção do frio.” As memórias de Kanwai Tablat vão parar muitas vezes a esse dia 8 de Janeiro de 2020. Estava no Seminário Maior do Bom Pastor, no estado de Kaduna, na Nigéria. Tinha acabado de adormecer há uns dez, quinze minutos, quando escutou um grande estrondo. Levantou-se, abriu a porta e viu uma arma apontada. O seminário estava a ser atacado. Todos os seminaristas na Nigéria estão cientes de que a Igreja Católica se tem vindo a tornar num alvo cada vez mais frequente de grupos armados, sejam eles terroristas ou simples malfeitores. Tablat também sabia disso. No entanto, nunca imaginara que um dia iria mesmo passar por uma experiência dessas. Mas esse dia chegou. Foi a 8 de Janeiro de 2020 e fazia muito frio. “Vi uma arma apontada e disseram-nos para sair. Eu pensei: ‘Uau, estamos a ser raptados’.”

 

Dias de tortura

Mal podia saber os tormentos que estavam para vir. Foram quatro os seminaristas levados pelos malfeitores. Kanwai Tablat, Peter Umenukor, Stephen Amos, e Michael Nnadi, que era o mais novo. Tinha apenas 18 anos de idade. Todos acabariam por ser libertados ao fim de poucas semanas de cativeiro menos Nnadi, que seria assassinado a tiro pelo líder do gangue que atacou o seminário. Já passaram três anos, mas, mesmo assim, continua a ser doloroso espreitar as memórias desse tempo de cativeiro. Tablat diz mesmo que a sua experiência “no covil dos ladrões” foi algo que ninguém pode desejar sequer “ao seu pior inimigo”. Foram dias de tortura. O rapto destes quatro seminaristas teve apenas um propósito: conseguir dinheiro, muito dinheiro das famílias assustadas com a sorte dos seus filhos. Para que ninguém duvidasse do propósito dos ladrões, os jovens eram chicoteados sempre que tinham de telefonar para as suas casas implorando aos pais que pagassem tudo o que era exigido para que as suas vidas fossem poupadas.

 

A ousadia de Michael

Tablat era seminarista. Naqueles momentos de provação, como é que resistiu a sua fé? “Se eu acho que Deus estava lá? Eu sei que Ele estava realmente lá connosco”, diz agora, olhando para trás, revivendo cada instante, lembrando tudo o que aconteceu. Especialmente o que aconteceu com Michael Nnadi. Mais tarde, a sua história acabaria por galgar para as primeiras páginas dos jornais, quando o líder dos assaltantes foi preso. Mustapha Mohammed assumiu ter assassinado o seminarista por ele ter procurado converter alguém durante o rapto. Isso irritou-o. Numa breve declaração a um jornal nigeriano, o Daily Sun, pouco depois de ter sido detido, o cabecilha do grupo disse que “não gostou da confiança” demonstrada pelo jovem cristão e que, por isso, decidiu matá-lo. Mas foi mesmo assim que tudo aconteceu? Kanwai Tablat confirma que Michael procurou ensinar um “irmão muçulmano”, que estava também raptado, a rezar o Pai Nosso e que isso terá chegado aos ouvidos dos bandidos armados. “Ou eles ouviram ou foram informados. Seja como for, deve ter sido essa a razão da sua morte”, diz o seminarista, acrescentando cheio de convicção: “sangue de mártires é semente da Igreja”.

 

Memorial aos mártires

A experiência de cativeiro foi dramática. Infelizmente, são cada vez mais os casos de pessoas raptadas na Nigéria nos últimos tempos. É uma ameaça que cresce quase diariamente porque o pagamento dos resgates está a transformar-se num autêntico negócio, mas também por motivos de radicalização religiosa por parte de grupos jihadistas como tem acontecido com o Boko Haram. A verdade é que nenhum sacerdote ou religiosa ou catequista ou destacado membro da comunidade cristã está a salvo. Para Kanwai Tablat, que foi raptado num dia frio de Janeiro de 2020, a certeza da fé que o levou até ao seminário está mais robusta do que nunca. “Esta Igreja não morrerá. Quanto mais eles matarem mais ela crescerá. Portanto, devemos viver sem medo e ser fiéis à nossa vocação cristã.” Michael Nnadi era colega de Tablat, sonhava como ele com o dia da sua ordenação sacerdotal, mas esse sonho foi interrompido por uma bala assassina. A comunidade cristã da Nigéria que o viu crescer, que o viu empenhar-se nos estudos, que o conheceu feliz como seminarista, não quer esquecer o seu exemplo. Com a ajuda da Fundação AIS está a ser erguido em Kaduna um Memorial dos Mártires, para manter viva a memória não só de Michael, mas de todos os que, nestes dias de turbulência que se vivem na Nigéria, são vítimas do terrorismo, são perseguidos e dão, a todos nós, um extraordinário exemplo de coragem e de fé.

 

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Nesta Quaresma, lembre-se dos cristãos perseguidos na Nigéria. São vítimas de grupos armados, de terroristas islâmicos, e precisam da nossa ajuda, das nossas orações. E lembre-se dos seus sacerdotes. Eles precisam da nossa ajuda.

texto por Paulo Aido, Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
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