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Brotéria #2
Os abusos sexuais e a gestão de crise
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Mais ou menos sofisticadas, as regras sobre como lidar com crises têm de ser adaptáveis a situações de natureza diversa, tanto mais complexas quanto à necessidade de enfrentar os factos se acrescenta a urgência de lidar com percepções. Mas há preceitos genéricos, simples, que, se não forem entendidos como paliativos, mas como um esforço genuíno para corrigir um mal, se podem mostrar genericamente pertinentes na gestão comunicacional de crises. Em La Communication de crise, Michel Ogrizek e Jean-Michel Guillery apresentam um conjunto de «grandes princípios»:

1. «Agir rapidamente», não demorando a reagir, mas não confundindo rapidez com precipitação.

2. «Antecipar a médio prazo», prevendo o que pode vir a suceder.

3. «Ser uma fonte de informação credível», o que supõe que a informação fornecida é precisa, completa, coerente e fiável. «O ideal é conseguir “falar a uma só voz”», havendo «uma só e única porta de entrada e de saída para gerir a circulação das informações».

4. «Estar em sintonia com a percepção da natureza do acontecimento». Isto torna «indispensável analisar e ter em conta a componente emocional – e por vezes simbólica – do risco evocado». Quando tal não sucede, emerge o «ridículo» de basear a comunicação, «como se vê ainda muito frequentemente», em comparações deslocadas ou em argumentos estatísticos.

5. «Posicionar a crise». Tal impõe a afirmação dos valores fundamentais da instituição. Perante uma crise, os responsáveis da instituição «devem comportar-se em função dos seus valores éticos».

6. «Responder imediatamente às acusações e às confusões». Como «quem cala consente», é preciso uma resposta rápida, argumentada, não uma simples denegação.

7. «Mobilizar e coordenar os recursos internos e externos». Impõe-se evitar «a vontade de manter uma confidencialidade, aliás ilusória», mobilizando os meios e as competências internas. Também é essencial ter «uma estratégia de aliados» e apelar a recursos externos, designadamente especialistas.

8. «Promover acções que influenciem o curso da crise». De facto, «o papel da comunicação não se deve limitar à difusão de informações factuais, com algumas mensagens e explicações, e à elaboração de respostas coerentes e credíveis. Mais importante em situação de crise é a capacidade de imaginar e promover acções susceptíveis de terem um impacto positivo na própria crise». Para manifestar uma atitude responsável ou uma vontade de transparência, será decisiva uma acção que tenha «um valor simbólico forte».

Os «grandes princípios» tornam-se dispensáveis quando se souber evitar qualquer abuso de poder ou quando foram atempada e adequadamente prevenidas as causas que fazem surgir as crises. Mas, se alguma advier, torna-se essencial comunicar com rigor – nem uma palavra a mais, nem um gesto a menos. É fundamental falar verdade, evitando silenciar, negar, desvalorizar, amalgamar ou atribuir responsabilidades a terceiros. Havendo vítimas, todo o respeito lhes é devido. Respeito e genuíno esforço de reparação do mal causado. Bem o explicou o Papa Francisco, no dia 24 de Fevereiro de 2019, no incontornável discurso proferido no âmbito do Encontro A proteção dos menores na Igreja. Disse o Papa que «é necessário mudar a mentalidade combatendo a atitude defensivo-reactiva de salvaguardar a Instituição [eclesiástica] em benefício de uma busca sincera e decidida do bem da comunidade, dando prioridade às vítimas de abusos em todos os sentidos».

Quando se declara que as vítimas importam mais do que a instituição, pressupõe-se, simultaneamente, que a instituição é susceptível de se engrandecer se e quando, em vez de se acantonar numa trincheira defensiva, sabe como lidar com o sofrimento provocado em seu nome.

 

Eduardo Jorge Madureira Lopes
Excerto do artigo “A Igreja Católica Portuguesa, os abusos sexuais e a comunicação de crise”, em Brotéria 196-4 (2023): 381-392.

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