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Um olhar diferente sobre a economia (por Pedro Vaz Patto)
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Luigino Bruni é professor da Universidade de Milão-Bicocca e tem-se dedicado ao estudo da Filosofia da Economia e, particularmente, da Economia Civil e Social. Não é difícil descortinar nalguns aspectos da encíclica Caritas in Veritate um reflexo do seu pensamento, o que, para além do mais, a este confere especial interesse.
Mas o que nos diz Luigino Bruni neste livro?
Para uma visão clássica da ciência económica, o mercado deve ser encarado como o espaço do anonimato em que o livre jogo dos interesses individuais conduz automaticamente, como uma “mão invisível”, ao interesse geral. São célebres as afirmações de Adam Smith: «não é da bondade do homem do talho (…) que podemos esperar o nosso almoço, mas do seu interesse pessoal.»; «a sociedade civil pode existir entre pessoas diferentes…baseando-se na consideração da utilidade individual, sem qualquer forma de amor recíproco ou de afecto». Esta visão da economia moderna, “ciência sem gratuidade”, “economia sem beneficência” filia-se numa perspectiva antropológica individualista (presente em Maquiavel e Hobbes), para a qual a vida em comum e o “outro” deixam de ser vistos (com o eram na perspectiva de Aristóteles e de São Tomás de Aquino) como uma “bênção” e passam a ser vistos como uma “ferida”.
Luigino Bruni não se assume como inimigo dos mercados ou da sociedade contemporânea. Considera o mercado, como espaço de encontro livre mutuamente vantajoso, uma conquista da civilização. Mas para que ele se torne plenamente humano, para que facilite o “florescimento” da pessoa, necessário se torna que se alie à gratuidade, ao amor desinteressado. Porque é no amor desinteressado (ágape) que a pessoa humana se realiza em plenitude. «As múltiplas experiências de economia social, civil e de comunhão (…) mostram-nos claramente que o mercado se pode tornar um espaço de verdadeiro encontro com o outro e de bênção, desde que se abra à gratuidade e desde que não fuja da ferida do outro».
Reflexo desta ideia, encontramo-lo na Caritas in Veritate (n. 36): «O grande desafio que temos diante de nós — resultante das problemáticas do desenvolvimento neste tempo de globalização, mas revestindo-se de maior exigência com a crise económico-financeira — é mostrar, a nível tanto de pensamento como de comportamentos, que não só não podem ser transcurados ou atenuados os princípios tradicionais da ética social, como a transparência, a honestidade e a responsabilidade, mas também que, nas relações comerciais, o princípio de gratuidade e a lógica do dom como expressão da fraternidade podem e devem encontrar lugar dentro da actividade económica normal.»
Sintoma do vazio criado por uma vida económica assente apenas na busca do interesse individual, são as conclusões dos estudos sobre a relação entre a prosperidade económica e a felicidade. O “paradoxo da infelicidade opulenta” revela, a partir de dados científicos, que, acima de um nível mínimo de satisfação de necessidades básicas, o grau de felicidade subjectivo das pessoas não aumenta com o crescimento do bem-estar material. Cabe, então, à ciência económica aprofundar o estudo de bens até agora descurados: os “bens relacionais”. A economia tradicional vê os bens como meios instrumentais, quando os bens relacionais não podem ser instrumentais. Há que recuperar a base antropológica que considera a necessidade de relacionamentos interpessoais não instrumentais para uma vida boa e feliz.
Conclui Luigino Bruni este livro com uma análise do significado económico e civil dos carismas. Por “carismas” entende, para este efeito, o dom de ter “um olhar diferente”, capaz de ver coisas que os outros ainda não vêm, aquele “já” que aponta para um “ainda não”. «A acção dos carismas é vasta e poderosa, cobre e impregna de si o mundo, é como o sangue que flui nas suas veias. Não o vemos, mas ele torna possível a vida. As religiões são lugares privilegiados onde os carismas florescem».
Nas ideias deste livro, como nas ideias da Caritas in Veritate, podemos encontrar este “olhar diferente” que dará origem a uma nova economia. Os tempos de crise são tempos de “passagem” que podem abrir caminhos novos.
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