05.06.2011
Entrevistas |
Padre Arsénio Isidoro, pároco da Ramada
"A caridade é evangelizadora"
É o pároco da Ramada, mas o seu campo de missão alarga-se até ao Bombarral e… à Ilha do Príncipe. A sua principal preocupação? As crianças. Sempre as crianças. À VOZ DA VERDADE, o padre Arsénio Isidoro conta como “a caridade é o vínculo mais visível da compaixão de Jesus pelo Homem”.
Chegou à paróquia da Ramada em 2005. Que realidade social encontrou nesta freguesia de Odivelas?
Quando cheguei, cheguei para ver, para conhecer, para aprender. Encontrei uma comunidade viva, empenhada, que tinha acabado de consagrar a igreja. É uma igreja grande, com uma estrutura pesada, que tinha à sua volta uma comunidade que se aproximava dos 18 mil habitantes, com muitas crianças e muitos casais jovens. Estava projectado um bairro novo, com 98 portas de prédio, o que representava mais cinco ou seis mil pessoas – é um bairro que neste momento já está pronto! No fundo, encontrei uma comunidade aberta à freguesia, com um carisma de serviço missionário e social muito forte. Quais foram então as suas prioridades pastorais? Deixei-me ‘empurrar’ por este comboio, de uma comunidade crente, que estava aberta aos outros e que tinha (e tem) uma intervenção social muito forte. Nesta freguesia da Ramada, lendo a carta social do concelho, encontrei imediatamente duas prioridades: as crianças e jovens em risco e também as pessoas com deficiência – dentro da percentagem normal do país, 10% das pessoas do concelho são portadoras de deficiência, o que representa muita gente sem estruturas e sem equipamentos de integração. A catequese tem sido então uma das preocupações pastorais ao longo destes anos. É muito importante a Igreja conseguir transmitir a fé a tantas crianças, concorda? Temos inscritas na catequese 900 crianças, para mais de 60 catequistas. É um trabalho enorme, porque temos de nos desdobrar com as 13 salas de catequese. Todos os dias, de terça-feira a Domingo, temos catequese na paróquia! É uma alegria receber estes miúdos e sobretudo através deles chegar aos pais. Ao contrário do que era suposto – ser a família a primeira catequista das crianças – acontece muito as crianças trazerem os pais de volta à prática dominical, à inserção na comunidade, ao empenhamento na missão da Igreja! Quando os pais se aproximam da Igreja por causa dos filhos, vêem a Igreja, vêem a comunidade… vêem o Corpo de Cristo Ressuscitado! Sentem-se eles próprios atraídos a um mistério que desconheciam. Foram praticantes nos seus tempos de juventude, mas agora despertou a semente, germinou! Que trabalho tem sido possível desenvolver com estes adultos? Nós temos três grupos de catequese de adultos. Alguns seminaristas do Seminário dos Olivais realizam na Ramada o seu trabalho de apostolado e garantem a formação de um grupo de adultos; o diácono Alcino acompanha outro e um catequista mais velho acompanha o terceiro grupo. Os adultos – e estamos a falar de gente na casa dos 30, 40 anos – querem esclarecer a sua fé. É gente que não se limita a uma prática dominical e quer aprofundar a sua intimidade com Jesus. O dinamismo pastoral compreende também mais de 200 jovens inseridos em movimentos… Os jovens fazem um trabalho muito bonito na paróquia! Porque eles têm um âmbito de intervenção cultural, social. Os jovens inserem-se como voluntários nas nossas instituições sociais e depois, através da arte, da música, da poesia, participam em muitas animações fora da paróquia. Fazem teatro de intervenção, teatro de rua. Inclusive, o nosso grupo de jovens está muito participativo na vida activa política da freguesia e do concelho. Ao nível da caridade, a paróquia da Ramada é reconhecida pelo seu Centro Comunitário Paroquial, que tem 17 valências, 83 funcionários e mais de 600 utentes diários. Neste tempo de crise, é uma resposta da Igreja aos problemas sociais da freguesia. Considera a caridade evangelizadora? O nosso Centro Comunitário Paroquial tem 10 anos! Eu falava há pouco do bairro que ia ser construído – e foi mesmo – e nós criámos uma creche e uma capela de Santa Teresinha nesse espaço. Marcámos presença e temos visibilidade! Portanto, vamos estando atentos às necessidades da comunidade e vamos respondendo. Os problemas sociais são os problemas do Homem e o caminho da Igreja é o Homem, porque esse é o caminho de Deus. Mais do que solidários, somos testemunhas do amor de Deus, que é próximo, envolvente e que salva e cura. Acredito, por isso, que a caridade é evangelizadora. A caridade é o vínculo mais visível da compaixão de Jesus pelo Homem. É nessa misericórdia que nós participamos, aproximando-nos daqueles que necessitam. África é também uma das preocupações da paróquia, que tem uma geminação com a paróquia de Nossa Senhora da Conceição da Ilha do Príncipe. Que projecto é este? O Santo Padre Beato João Paulo II, na altura do Jubileu do ano 2000, desafiou as paróquias europeias a serem irmãs de comunidades pobres pelo mundo. Nesse âmbito, o meu antecessor, padre Daniel Batalha, participa numa viagem a São Tomé, conhece a Ilha do Príncipe, e comove-se com aquela realidade. Encheu-se de compaixão e, escutando o apelo do Papa, decide criar em 2001 uma geminação, que não é mais do que uma intenção de fraternidade, de partilha. E estas coisas surgem não porque a paróquia da Ramada tivesse muita viabilidade financeira… nesse ano havia as obras da igreja, mas nem por isso a paróquia deixou de partilhar! E essa continua a ser a nossa marca: dar o que nos sobra é fácil, mas dar o que nos faz falta é daí que nasce o perfume da caridade! Neste projecto ‘Paguê’, temos o regime de apadrinhamento de crianças, idosos e pessoas com deficiência e a verdade é que os grupos da paróquia partilham, pessoas individuais partilham, famílias partilham. É um projecto que foi crescendo, em atenção os desfavorecidos da Ilha do Príncipe e em colaboração com uma comunidade de Irmãs Servas da Sagrada Família. Através do nosso Centro Comunitário Paroquial, tivemos uma participação forte de técnicos em regime de voluntariado e criámos apoio domiciliário, a que chamámos ‘Cozinhas nas Roças’. Havia situações de dependência dos idosos e criou-se o ‘Lar de Betânia’, com 12 camas. Foi também criado um centro de fisioterapia e reabilitação e em 2005, quando entrei na paróquia e neste projecto, a minha preocupação foram as crianças, porque elas são o futuro. É uma aposta a 20 anos, porque um país sem educação e formação dificilmente conseguirá sair do marasmo a que a pobreza os legou. Criámos então uma rede de pré-escolar, edificámos o Colégio de Santa Teresinha na roça do aeroporto para 200 crianças, temos o Colégio João Paulo, na parte sul, para 120 crianças, o Colégio Sant’ana, situado na Roça de São Joaquim e que está em fase de finalização. Criámos ainda um ATL na cidade e temos agora também o Lar de São José, para órfãos. Mas todos estes equipamentos são feitos com que auxílios? Nós conseguimos algo que eu considero extraordinário. Eu acredito muito nas pessoas que trabalham no Governo Regional do Príncipe, de forma que nós fazemos a obra – além da gestão pedagógica, financeira e de manutenção – e eles comparticipam com o pagamento dos salários a todos os nossos funcionários. As obras são feitas com dinheiro de benfeitores e também de alguns projectos que vamos conseguindo, com fundações e empresas. Além da missão em África, a paróquia ajuda também ‘cá dentro’… No âmbito do projecto ‘Paguê’, criámos em 2008 a ONGD ‘Ligar à Vida’, que coordena não só o trabalho no Príncipe, mas também no Bombarral, no Oeste. Eu sou dessa zona e a carta de diagnóstico social mostra que é um concelho deprimido, com imensas carências. Não é só em África, é também aqui, entre nós, que há carências! No Bombarral temos a funcionar uma loja da solidariedade, um centro de acolhimento e de formação e acompanhamento parental e estamos também envolvidos na construção de um lar residencial para pessoas com deficiência. Na Ramada, a ‘Ligar à Vida’ tem um gabinete de inserção profissional, onde atendemos 600 desempregados, um gabinete de psicologia e um centro de actividades ocupacionais para pessoas com deficiência. Há cinco anos foi criado o Movimento Missionário da Paróquia da Ramada, um grupo que trabalhava tendo em vista a missão na Ilha do Príncipe, mas que agora alargou o seu campo de missão, certo? O dinamismo do Movimento Missionário da Paróquia da Ramada nasceu do espírito do ICNE (Congresso Internacional para a Nova Evangelização), de anúncio do Evangelho. A intenção de criar um movimento missionário é de animação paroquial e de intervenção comunitária. Aproveitando a experiência dos jovens, que partem ‘para fora’, a ideia foi procurar mostrar-lhes que também ‘cá dentro’ temos pessoas com necessidades. Há pessoas que não têm disponibilidade para ir dois meses para fora e desta forma garantem uma animação missionária durante o Verão, nas paróquias de Évora, Guarda, Malpica do Tejo, Fundão... portanto, fazem essa experiência para que depois ao longo do ano, com a força do Espírito, dêem seguimento na Ramada! São pessoas que se encontram na Eucaristia ao Domingo e essa é a grande força missionária! A nível da Vigararia VIII, a paróquia da Ramada tem participado na Missão Vicarial. São acções de testemunho evangelizador que a Igreja não pode deixar de organizar, concorda? Este ano a Missão Vicarial foi em Frielas, no tempo da Quaresma. Nasceu também com o ICNE e ao nível da vigararia temos procurado continuar. Na vigararia, olhamos as necessidades da paróquia onde vai acontecer a Missão Vicarial e procuramos envolver as comunidades das 15 paróquias. Esta iniciativa é um despertar de algumas pessoas que estão adormecidas, de outras que estão na Igreja mas que andam calejadas e não se apercebem da sua beleza. Dentro da área social, sempre vivemos um espírito de partilha na vigararia. Neste momento chegámos a um ponto de alguma concertação da inteligência comum. Ou seja, o trabalhar juntos tem de passar um pouco mais da teoria à prática. Quem nos garante a unidade é o senhor Patriarca, mas a unidade também é visível nas expressões dos nossos gestos. E nesse sentido, estamos a ir num caminho de contenção de custos dos centros sociais paroquiais da vigararia, que têm 400 funcionários e mais de 3000 utentes. Neste momento, vamos caminhar durante um ano para uma entidade – que não sabemos bem ainda o que será – no sentido de perceber de que forma poderemos não só poupar, como também gerar recursos financeiros para as nossas instituições.___________________
Casa do Gaiato, Sãozinha e Florinhas
Em 2006, os Padres da Obra da Rua entregaram ao Patriarcado de Lisboa a Casa do Gaiato do Tojal. O Cardeal-Patriarca nomeou então o padre Arsénio Isidoro director desta obra do padre Américo. No entanto, a sua ligação à Casa do Gaiato já vinha de trás. “Isto nasce sempre de uma história. E a história que Deus faz connosco é a principal. Quando estava no seminário, o meu curso escolheu como padroeiro… o padre Américo. Na altura, conhecemos a pedagogia e a obra daquele pastor que dedicou toda a sua vida aos pobres e às crianças. Há cinco anos, o senhor Patriarca acolhe o pedido dos Padres da Obra da Rua e pede a mim e ao padre Ricardo Raínho, que também está na vigararia, para ficarmos responsáveis pela Casa do Gaiato”, conta o padre Arsénio, recordando ter encarado a nomeação “como uma nova missão para estar ao serviço dos que mais precisam”. Actualmente, a Casa do Gaiato do Tojal acolhe 75 crianças e jovens. Ainda em 2006, o padre Arsénio assume também o Instituto da Sãozinha, “que além de ter uma dimensão religiosa – decorre neste momento o processo de canonização da Sãozinha”, tem também “uma série de valências”, como o centro de dia, jardim-de-infância, a creche, apoio domiciliário e um centro de actividades ocupacionais para pessoas com deficiência. A Sãozinha tem ainda um lar para meninas em risco, que acolhe actualmente 30 raparigas e em concurso público está a ‘Casa da Sãozinha’, na Abrigada. Finalmente, em 2007, o padre Arsénio é nomeado presidente da direcção das Florinhas da Rua, uma instituição fundada pelo bispo, em 1917, que “tem por objectivo proteger crianças em perigo e apoiar famílias temporariamente incapazes de educarem os filhos”.
Diogo Paiva Brandão
A OPINIÃO DE
Guilherme d'Oliveira Martins
Há anos, Umberto Eco perguntava: o que faria Tomás de Aquino se vivesse nos dias de hoje? Aperceber-se-ia...
ver [+]
|
Pedro Vaz Patto
Já lá vai o tempo em que por muitos cantos das nossas cidades e vilas se viam bandeiras azuis e amarelas...
ver [+]
|
Guilherme d'Oliveira Martins
Vivemos um tempo de grande angústia e incerteza. As guerras multiplicam-se e os sinais de intolerância são cada vez mais evidentes.
ver [+]
|
Pedro Vaz Patto
Jamais esquecerei a forte emoção que experimentei há alguns dias.
Celebrávamos a missa exequial de...
ver [+]
|
EDIÇÕES ANTERIORES