Entrevistas |
Presidente do Conselho Pontifício para as Comunicações Sociais, arcebispo Claudio Maria Celli
?A Igreja deve entrar num diálogo profundo com a cultura digital?
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Presente em Portugal para participar nas Jornadas de Comunicação Social, o presidente do Conselho Pontifício para as Comunicações Sociais alertou para a necessidade de enfrentar o caminho que a cultura digital coloca à Igreja. Em entrevista exclusiva ao Jornal VOZ DA VERDADE, o arcebispo Claudio Maria Celli falou ainda da responsabilidade da Igreja na ajuda ao Homem de hoje, na procura da Verdade.

Quais os desafios que a Igreja enfrenta, actualmente, no que diz respeito à comunicação social?

A Igreja hoje deve enfrentar aquilo a que chamamos oficialmente a ‘cultura digital’. Aquela cultura originada pelas novas tecnologias. Porque as novas tecnologias não são apenas um instrumento, mas estão a dar origem a um ambiente de vida. Um ambiente de vida que muda a nossa maneira de viver. Muda, portanto, a nossa maneira de ser. E no campo da comunicação, creio que a Igreja, hoje, deve entrar num diálogo profundo, verdadeiro, respeitoso, com esta cultura digital. E isso considero ser o primeiro desafio. Porquê um desafio? Porque a missão da Igreja é aquela que existe desde a sua origem, ou seja, aquela de anunciar a Palavra de Deus, de anunciar o mistério de Cristo morto e ressuscitado, e vivo entre nós. No entanto, deve fazê-lo dialogando com o Homem de hoje, aproximando o Homem que hoje vive envolvido e está marcado por este ambiente típico criado pelas novas tecnologias.

 

Tendo em conta que o modo de comunicar está a mudar, de modo concreto, como deve fazer a Igreja para estabelecer este diálogo e levar a cabo esta comunicação?

Antes de mais, que seja seu dever conhecer esta nova linguagem. O Papa usa, a este respeito, um exemplo muito interessante. Diz que os primeiros cristãos deviam conhecer a cultura greco-romana para anunciar o Evangelho. Nós, hoje, devemos perceber e conhecer como funcionam e operam as novas tecnologias porque, inegavelmente, marcam o caminho do Homem e a sua maneira de ser. As novas tecnologias oferecem grandes oportunidades, o que significa oportunidade de conhecimento e de relação. Direi, mesmo, oportunidades para favorecer a comunhão ou a comunidade. Por isso, a Igreja, através do seu magistério qualificado, que é aquele do Santo Padre, faz uma avaliação positiva das novas tecnologias. Não é uma avaliação ingénua porque a Igreja e o Santo Padre estão conscientes dos limites das novas tecnologias, ou também das dificuldades que estas novas tecnologias criam. Por exemplo: um dos temas delicados é o de como proteger os menores na internet. Porque apercebemo-nos, a nível internacional, que a maior parte das crianças e dos adolescentes navegam sozinhos na internet, sem a presença dos pais. E isto é, para a Igreja, um tema pastoral muito profundo que a Igreja deve sentir como uma das suas grandes responsabilidades: ajudar os pais a fazer com que as grandes oportunidades oferecidas pela internet não sejam alteradas ou destruídas por aspectos negativos da própria rede. Por isso, é preciso ver em que medida nós formamos e educamos os nossos jovens a usar a internet de forma correcta.

 

A quem se deve dirigir o discurso da Igreja, no uso dos meios de comunicação? Àqueles que já estão dentro? Aos que estão fora da Igreja?

A Igreja tem, na sua missão, o dever de formar aqueles que são membros da Igreja. Mas deve permanecer válido o convite que o Senhor dirige, a todos nós, de anunciar a Palavra, o Reino de Deus a todo o mundo, a toda a criatura. E isto quer dizer que, hoje, as novas tecnologias oferecem à Igreja, sem dúvida, a oportunidade de poder aproximar todo o Homem que anda à procura de qualquer coisa. Eu creio que isto seja um dos temas delicados, porque o Homem, na sua dignidade, está, inegavelmente, ligado à procura da Verdade. O Homem, que não pode procurar a Verdade por vários motivos, é atingido na sua dignidade mais profunda. No entanto, neste ‘bombardeamento’ de imagens, de sons, de notícias, a Igreja deve ter um papel educativo no ajudar o homem e a mulher de hoje a saber orientar-se nesta procura da Verdade. E esta é uma das nossas responsabilidades. Depois, a missão fundamental da Igreja é o anúncio da Palavra de Deus. E é bom recordar que nós não somos seguidores de uma ideologia! Nós somos seguidores de uma Pessoa vivente que está ressuscitado, no meio de nós. Por isso, devemos ajudar o Homem a saber manter viva esta procura da Verdade. Nesse sentido, o papel principal da Igreja é aquele de ajudar os homens e as mulheres de hoje a prosseguir esta procura e a saber orientar-se de maneira eficaz.

 

Diante de todo o desenvolvimento tecnológico, dando-se primazia à comunicação virtual, não existe o perigo de pôr de lado o contacto pessoal?

A missão prioritária da Igreja é aquela de criar uma verdadeira comunidade. Aquilo que nós anunciamos, conforme já disse, não é uma ideologia mas o que formulamos é uma proposta de vida. E uma proposta de vida não pode esgotar-se num contacto com um site na internet, por mais que este esteja bem feito ou seja inteligente. Aí, a pessoa poderá encontrar e captar certos aspectos da vida cristã, mas depois deve encontrar a verdadeira comunidade. Uma comunidade que a acolhe, que a sustém e a ajuda a perceber que a sua vida, como discípulo de Jesus, é aquela de partilhar o amor com os outros e de caminhar amando os outros, vivendo a própria vida com uma atitude de serviço e de amor partilhado com os outros. Isto é um desafio contínuo! Por isso, considero que uma coisa seja o aspecto primário da Igreja, e esse é aquele de criar uma comunidade de discípulos. Discípulos que vivem intensamente o Evangelho. Mas depois, a Igreja utiliza também estas novas tecnologias para fazer com que a Mensagem evangélica seja mais conhecida e aprofundada.

 

O Papa Bento XVI escolheu como tema do próximo Dia Mundial das Comunicações Sociais e 2012, o silêncio e Palavra como caminho de evangelização. Não haverá aqui um contra-senso?

À primeira vista existe um contra-senso. Porque é verdade que a comunicação é esta interlocução entre os Homens e o Homem e a comunidade. E para que este diálogo seja autêntico, porque não deve ser um monólogo, é preciso escutar. O verdadeiro diálogo exige a escuta. Por isso, acredito que o Papa quer sublinhar, com estas duas palavras – silêncio e Palavra –, a dimensão prioritária da comunicação. Porque é necessário que, quando um homem e uma mulher falam e comunicam com outra pessoa, devam saber acolher. E para acolher é preciso saber escutar. E o mesmo vale com Deus! Dizia um poeta inglês, que viveu muito tempo na América, que o homem procurava silêncio e encontrou apenas rumor, procurava comunhão e encontrou apenas solidão. E creio que esta seja uma das grandes nostalgias do Homem de hoje. Então, é preciso recuperar estes espaços de um silêncio que não é vazio, que não é ausência de palavra, mas é riqueza interior e capacidade de escuta e de acolhimento. E a palavra é a aquela com o ‘p’ minúsculo e com o ‘P’ maiúsculo. Por isso, o tema completo do Dia das Comunicações Sociais é: ‘Silêncio e Palavra: caminho de evangelização’. Com esta temática, o Papa quis aproximar-se ao tema fundamental do próximo Sínodo dos Bispos, dedicado à Nova Evangelização. Assim, Bento XVI quer, desta forma, convidar todos os operadores no campo da comunicação da Igreja, aos vários níveis, a aprofundar esta temática profunda, que tem um significado profundo, mesmo para quem é laico e não pertence à comunidade, e para quem faz parte dela. Devemos recuperar estes espaços que são garantia de autenticidade humana da comunicação.

 

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O Jornal Voz da Verdade é um meio de comunicação da Diocese de Lisboa. Qual deve ser o papel de um jornal diocesano?

Um jornal diocesano deve ter um papel de ajudar a viver a própria realidade de discípulo de Jesus Cristo no mundo de hoje. O capítulo 25 de São Mateus obriga-nos a recordar que a dimensão do discípulo é concreta, ligada ao fazer. Um fazer que pressupõe um ser. Mas este fazer é fundamentado por gestos de amor partilhado. Por isso, acredito que um jornal católico deve ser, antes de mais, um instrumento para fazer com que os discípulos sejam autênticos no seu serviço comunitário. No entanto, um jornal católico deve ter também a capacidade de saber estabelecer um diálogo com quem está fora, com quem não pertence à comunidade. Por isso, não terei dificuldade em ver também num jornal católico a capacidade de saber estabelecer um momento de encontro, de respeito. Mas um respeito benevolente, de simpatia com quem não partilha das nossas posições. Acredito que um jornal católico pode ser um instrumento de diálogo com quem partilha connosco o caminho da humanidade. Certos problemas não são apenas deles, ou nossos. São momentos partilhados. Há uma ‘ecologia humana’ que não é de ninguém, mas todos estamos interessados em que o Homem possa ter um caminho sempre mais verdadeiro e autêntico, e sempre mais profundamente humano. Porque como cristãos devemos caminhar juntos para que este mundo se torne numa casa cada vez mais habitável para o Homem de hoje.

 

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Internet está a mudar a comunicação

“As novas tecnologias estão a mudar não só o modo de comunicar mas a própria comunicação”, afirmou o presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, D. Manuel Clemente, no decorrer das Jornadas de Comunicação Social, realizadas em Fátima nos dias 29 e 30 de Setembro.

Mais de uma centena de profissionais da comunicação, leigos e consagrados, estiveram reunidos na Casa de Nossa Senhora das Dores para reflectir sobre a ‘Era digital: Revolução na Cultura e na Sociedade’, fazendo um percurso sobre aquilo que tem sido a evolução da tecnologia e na forma como esta é usada, ou não, pela Igreja. Sobre a forma como a Igreja usa os meios de comunicação, alerta o presidente do Conselho Pontifício para as Comunicações Sociais: “Há que saber privilegiar o que é o projecto fundamental, que não é ter um site bonito mas uma comunidade que vem de Deus, crê em Deus e ama Deus”.

A presença do tema ‘religião’ nos meios de comunicação generalistas e o modo como este é tratado foi também abordado nestes dois dias de encontro. “A desconfiança mútua existente entre os media e a Igreja” foi um aspecto apontado por Rosa Lima, jornalista do Expresso, num workshop com a presença de vários profissionais da comunicação. Destinado a responsáveis e profissionais ligados a gabinetes de imprensa das dioceses portuguesas, um outro workshop procurou reflectir sobre a vontade de se promover uma “relação mais estreita” entre si, aproveitando as potencialidades da era digital.

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