Jornal Voz da Verdade

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24.02.2013

Especiais |

Quaresma

No deserto caminhar com esperan�a

A Quaresma recorda-nos a experi�ncia de deserto vivida pelo povo de Israel desde a escravid�o at� � terra daquele sonho que o animava e revitalizava. No deserto da vida de cada um e de todos, vivemos momentos de perplexidade provocada por uma austeridade cega.

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Os sinais da desesperan�a

Para al�m dos discursos de pendor justificativo de uns, derrotista de outros, imp�e-se-nos olhar para as pessoas, colocando-as no lugar que devem ocupar perante aqueles que conduzem os seus destinos.

O clamor das pessoas eleva-se de tom. Os discursos do Governo giram � volta de n�meros, estat�sticas, percentagens, avalia��es t�cnicas. Parece – e n�o ser�? – que as pessoas s�o apenas mais uma variante de um processo t�cnico que as secundariza em favor de um modelo de sociedade onde o “mamon”(dinheiro-riqueza, na B�blia) � o “deus” diante do qual todos se devem prostrar. Por outro lado, as vozes dos que se lhe op�em fazem-nos desconfiar se n�o estaremos a ser objeto de uma descarada demagogia. Escrevia Jos� Nunes Martins em i-online: “Vivemos uma crise de verdade… A demagogia � a ferramenta com que se alcan�a o poder, que justifica o n�o cumprimento das promessas eleitorais e se alimenta a vida e a credibilidade das oposi��es”. A demagogia, venha ela do governo, venha da oposi��o, n�o � o servi�o que ambos devem prestar ao povo que dizem representar. Como acreditar neles e olhar o futuro com alguma esperan�a, quando o dinheiro se torna mais escasso para garantir uma alimenta��o de base, os cuidados de sa�de se tornam menos acess�veis, o sonho de uma popula��o culta e educada se esvai, o natural apego � terra tem de ser vencido pela aventura da emigra��o, o leg�timo sentimento de independ�ncia proporcionado por casa pr�pria � destru�do pelo imprevisto das novas contas?

Como ter esperan�a quando a d�vida que cada cidad�o carrega anda � volta de 20 mil euros, fruto de uma d�vida p�blica do pa�s que se multiplicou por 20 nos �ltimos 40 anos, segundo os c�lculos do professor de Economia Pedro Vieira? Como ter esperan�a quando o n�mero de crian�as v�timas da mendicidade est� a aumentar, transformando-as por acr�scimo em v�timas de redes criminosas, segundo a conclus�o do Observat�rio de Tr�fico de Seres Humanos? A Caritas Europa alerta para os riscos das medidas de austeridade e afirma que a pobreza infantil anda ligada a essas medidas.

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Ver, pensar e agir com esperan�a

Basta abrir os olhos para come�ar a pensar. Por isso, a Comiss�o Nacional Justi�a e Paz, juntamente com as Comiss�es Diocesanas de Justi�a e Paz da maior parte das Dioceses de Portugal, apresentam um documento de reflex�o para esta Quaresma, � volta do tema “�tica nas Finan�as”.

Verificando o esfor�o que se vai pedindo �s comunidades para n�o fecharem os olhos �s necessidades mais urgentes, o documento real�a a necessidade de ir �s causas profundas dos problemas, n�o se ficando numa atitude “assistencialista”, mas caminhando numa linha de “assist�ncia social”, express�o que tem subjacente a no��o de dignidade humana do benefici�rio, a quem est�o associados “direitos indeclin�veis”. Tal vis�o conduz-nos a ver e a agir para inverter a “espiral recessiva” atrav�s de pol�ticas que garantam o progresso econ�mico que seja criador de emprego, o qual vai restaurar a dignidade, a liberdade e a autonomia da pessoa, que promovam uma mais justa distribui��o do rendimento e da riqueza. Perante o insucesso do modelo de pol�tica econ�mica seguido no ano de 2012 e a vontade de continuar com ele em 2013, o documento afirma que “O povo, as pessoas e as fam�lias n�o podem servir de objeto de experi�ncia de pol�ticas de sucesso altamente duvidoso”. Ao afirm�-lo as comiss�es afastam-se da “cumplicidade do sil�ncio”.

Bento XVI, no momento hist�rico da sua resigna��o ao cargo de Papa, nos lembra na mensagem da Quaresma que “a f� precede a caridade, mas s� se revela genu�na se for coroada por ela” E onde n�o h� justi�a nem uma nem outra se encontram. Consequentemente n�o podemos deixar morrer o sonho da dignidade, rejeitando o todo-poderoso poder financeiro e impedindo-o de criar uma nova escravatura que arrasta e submete a si as pessoas, at� para o bocado de p�o de que necessitam.

texto por P. Valentim Gon�alves, CJP-CIRP