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Nuno Cardoso Dias
Senhor, fazei de mim um instrumento da Tua paz

Esta foi uma crónica particularmente difícil de escrever. E a culpa – não há como dizê-lo de outra forma – é do Papa Francisco.

Em primeiro lugar, porque deu-me tema para um jornal inteiro mas fê-lo de uma forma tão simples, tão nova e tão sincera, que poucos momentos depois de cada um dos seus actos já toda a comunicação social o espalha, com um renovado entusiasmo.

Nos últimos dias assistimos a novas atitudes de uma simplicidade e profundidade impressionantes. Na Rádio Renascença, Maria João Cunha enumerava 10 gestos inesperados de um Papa surpreendente. No último domingo juntou-se mais um, quando o Papa veio cumprimentar pessoalmente os fiéis, à saída da missa que celebrou. Este é o Papa que recusou usar ouro, que pede uma Igreja pobre e ligada aos pobres, um Papa que pede a bênção à sua Igreja e que faz silêncio com ela.

Em segundo lugar, porque escrevo-a no dia de São José, dia do Pai, no mesmo dia em que se celebrou em Roma a missa de início do ministério petrino do Papa Francisco. E naturalmente o nosso tempo precisa de bons pais e é importante falar disto. Precisa de bons homens, que sejam bons pais e bons maridos, à semelhança de José, com José por modelo e por patrono. E também aqui, o Papa Francisco, na sua homilia deixou muito pouco por dizer.

Começa por apresentar José como guardião de Maria e de Jesus: “Como realiza José esta guarda? Com discrição, com humildade, no silêncio, mas com uma presença constante e uma fidelidade total, mesmo quando não consegue entender. Desde o casamento com Maria até ao episódio de Jesus, aos doze anos, no templo de Jerusalém, acompanha com solicitude e amor cada momento. Permanece ao lado de Maria, sua esposa, tanto nos momentos serenos como nos momentos difíceis da vida, na ida a Belém para o recenseamento e nas horas ansiosas e felizes do parto; no momento dramático da fuga para o Egito e na busca preocupada do filho no templo; e depois na vida quotidiana da casa de Nazaré, na carpintaria onde ensinou o ofício a Jesus.”

Pede o Papa “por favor, a quantos ocupam cargos de responsabilidade em âmbito económico, político ou social, a todos os homens e mulheres de boa vontade: sejamos «guardiões» da criação, do desígnio de Deus inscrito na natureza, guardiões do outro, do ambiente; não deixemos que sinais de destruição e morte acompanhem o caminho deste nosso mundo! Mas, para «guardar», devemos também cuidar de nós mesmos. Lembremo-nos de que o ódio, a inveja, o orgulho sujam a vida; então guardar quer dizer vigiar sobre os nossos sentimentos, o nosso coração, porque é dele que saem as boas intenções e as más: aquelas que edificam e as que destroem. Não devemos ter medo de bondade, ou mesmo de ternura.”

E completa: “cuidar, guardar requer bondade, requer ser praticado com ternura. Nos Evangelhos, São José aparece como um homem forte, corajoso, trabalhador, mas, no seu íntimo, sobressai uma grande ternura, que não é a virtude dos fracos, antes pelo contrário denota fortaleza de ânimo e capacidade de solicitude, de compaixão, de verdadeira abertura ao outro, de amor. Não devemos ter medo da bondade, da ternura!”

Fica pouco por dizer. E eu, certamente, não sei melhor: “Guardar Jesus com Maria, guardar a criação inteira, guardar toda a pessoa, especialmente a mais pobre, guardarmo-nos a nós mesmos: eis um serviço que o Bispo de Roma está chamado a cumprir, mas para o qual todos nós estamos chamados, fazendo resplandecer a estrela da esperança: Guardemos com amor aquilo que Deus nos deu!”

Perante um Papa que escolheu chamar-se Francisco, por causa de Francisco de Assis, homem da pobreza e da paz, que faz um apelo tão forte à redescoberta da paternidade como guarda, a única coisa que posso é fazer o que ele pediu, e, nesta página, orar por ele – e por nós, a oração da paz tantas vezes identificada com São Francisco de Assis.

Senhor! Fazei de mim um instrumento da vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor.
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão.
Onde houver discórdia, que eu leve a união.
Onde houver dúvidas, que eu leve a fé.
Onde houver erro, que eu leve a verdade.
Onde houver desespero, que eu leve a esperança.
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria.
Onde houver trevas, que eu leve a luz.
Ó Mestre, fazei que eu procure mais:
consolar, que ser consolado;
compreender, que ser compreendido;
amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe.
É perdoando que se é perdoado.
E é morrendo que se vive para a vida eterna.