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Nuno Cardoso Dias
Encarregados de educação: não se demitam (ou a igualdade entre os sexos além das teorias)

Desde o primeiro ano do primeiro dos nossos filhos que nos foi claro cá em casa que nenhum de nós estava disposto a abdicar do papel de encarregado de educação. As fichas de matrícula vêm sempre com espaço para um único nome do encarregado de educação e nós fizemos sempre o mesmo: partilhámos o espaço como partilhamos os filhos.

Por muito que isso irrite a escola – e algumas têm dificuldade em aceitar tudo o que escape à engrenagem – a realidade é que a escola não sai prejudicada, bem pelo contrário: sempre que contacta qualquer um de nós, já serve; sempre que precisa de uma autorização qualquer dos pais a pode dar. Ambos ficam abrangidos pelo estatuto de encarregado de educação o que facilita muito mais a participação dos pais na escola e a repartição entre ambos dessas incumbências.

Numa altura em que a igualdade entre os sexos é elevada à categoria de matéria escolar, a promoção do encarregado de educação único por parte da Escola desenvolve assimetrias na relação dos pais com os filhos e na assunção dos encargos da educação (da qual apenas um fica... encarregado). Significa isto que apenas um assinará os testes, apenas um receberá recados, apenas um autorizará visitas, apenas um reunirá com o Director de Turma. O outro pode ficar alheio – e progressivamente mais alheado - do desenvolvimento escolar do filho.

No entanto, perante a resistência da Escola e a inércia de tantos pais, não seria um capricho nosso querer impor-nos ao sistema?

No início deste ano tivemos uma pequena amostra de que não. Informava a professora que quando um pai que não fosse o encarregado de educação viesse buscar a criança à escola deveria trazer uma autorização do encarregado de educação. E faz sentido, porque há situações em que isto se justifica. O que não faz sentido, como confirmámos, é que os pais, que o são, se demitam de ser, ambos, encarregados da educação dos seus filhos. Não é capricho, é o que nós somos e que a Escola e o Estado tem o dever de aceitar.

 

Um passo na direção certa

Tem-se discutido nos últimos dias no Parlamento uma proposta do Grupo Parlamentar do PSD que prevê medidas de equidade fiscal para famílias numerosas. Foi grato ver que as medidas em causa mereceram grande consenso entre os diferentes grupos parlamentares, reconhecendo que o sistema fiscal português é injusto para com as famílias numerosas e que é importante introduzir fatores de ajustamento que permitam torná-lo mais justo.

Não se trata de beneficiar ninguém, mas apenas de refletir, nos impostos pagos, a realidade de cada família. Nos impostos sobre casas há que ter em conta que uma família maior precisa de uma casa maior, sem que isso seja um luxo nem um desperdício. Nos impostos sobre carros há que ter em conta que uma família maior precisa de um carro maior, sem que isso seja um luxo nem um desperdício. Nos impostos sobre o rendimento é preciso ter em conta que o rendimento que os pais trazem para casa se divide por mais cabeças e que as famílias têm despesas que lhe são essenciais, que o sistema fiscal está neste momento a ignorar.

As medidas são tímidas: no IMI os seus resultados dependem dos municípios, que serão a final quem perderá receita e nos impostos do Estado apenas se fazem recomendações ao Governo, cuja oportunidade e concretização teremos de aguardar.

Mesmo assim, um passo na direção certa é sempre um bom passo e é de valorizar a iniciativa de trazer este assunto à agenda. O consenso de todas as forças políticas quanto a esta matéria mostra bem que é necessário mudar o sistema e torná-lo mais justo. Esperemos que, a final, haja consequências práticas dos princípios e recomendações que agora se expressaram.