Artigos |
Guilherme d'Oliveira Martins
Tadeusz Mazowiecki (1927-2013)
Tadeusz Mazowiecki é símbolo da democracia polaca e da Europa contemporânea. Não o conheci pessoalmente, mas fui amigo de dois dos seus mais próximos companheiros, Jacek Wosniakowski (membro do CNC) e Bronislaw Geremek. Acompanhei a sua ação de perto. A vida e o pensamento deste homem permitem compreender como o fim da guerra fria e a queda do muro de Berlim puderam ser preparados. É verdade que a eleição de João Paulo II como Sumo Pontífice em 1978 suscitou a aceleração dos acontecimentos, mas sem a participação dos intelectuais e leigos católicos polacos nada teria sido possível. Mazowiecki foi um dos mais influentes políticos católicos no centro e no leste da Europa. Foi um dos mais determinantes discípulos de Emmanuel Mounier, que soube interpretar a defesa feita em 1932 na revista «Esprit» sobre a necessidade de os cristãos se associarem aos não cristãos na construção de uma sociedade aberta e solidária, livre e responsável, assente na eminente dignidade da pessoa humana. Tadeusz Mazowiecki nasceu em Plock (18.4.27), no coração da Polónia. Fez os seus estudos de Direito em Varsóvia, sendo profundamente influenciado pela doutrina social da Igreja. Começou por militar na associação política católica Pax, até ser dissolvida, participando depois de 1955 na criação do KIK (Clube de Intelectuais Católicos) e na fundação da influente revista «Wiez» (Elo), onde lança a reflexão que visa suscitar um ambiente capaz de contrariar a lógica totalitária. Assim, procura forçar uma evolução gradual das instituições.

 

Em 1961, é eleito para a Dieta como membro do grupo de católicos independentes do Znak. Compreende depressa que a abertura é débil e efémera. Em 1968, protesta contra a repressão dos estudantes, a vaga de antissemitismo orquestrada pelo poder e a invasão soviética da Checoslováquia. Conhece e apoia o jovem Adam Michnik, que acolhe na redação da revista «Wiez». Em 1970, rompe por a abertura ser impossível. Inicia-se um tempo difícil de provação e perseguições. Encontra Michnik no Comité de Defesa dos Operários (KOR), defende as vítimas da repressão e contribui para a criação das Universidades volantes. E chega o momento decisivo em que, em agosto de 1980, com Bronislaw Geremek, vai ao encontro dos grevistas dos estaleiros de Gdansk. Esse episódio mudará o curso dos acontecimentos. Com Lech Walesa, nasce o «Solidariedade» - o primeiro sindicato independente do mundo comunista. As vicissitudes são conhecidas. Na noite de 13 de dezembro de 1981, o general Jaruselski decreta o estado de sítio e o Solidariedade passa à clandestinidade. Mazowiecki é preso. Só será libertado ao fim de um ano. Desenvolverá então intensa atividade clandestina. Até 1989, criam-se condições que permitem a vitória eleitoral do «Solidariedade» e a nomeação de um católico como o primeiro Chefe do Governo não comunista no leste. O Solidariedade é legalizado. Apresenta-se às eleições de 1989. A vitória é esmagadora. Abre-se a porta ao que culminará na queda do muro de Berlim (novembro) e no fim do poder soviético (1991). Mazowiecki toma todas as precauções, para não pôr em causa a transição. O programa era: construir um Estado de direito, criar a economia social de mercado, fazer a Polónia sair da ruína e reunir-se à Europa. Importaria salvaguardar os passos graduais e seguros, o que levou os caricaturistas a representarem Mazowiecki como a tartaruga da fábula. Assim, recusa os ajustes de contas, o que o levará a ser crítico de alguns companheiros. Então o Solidariedade divide-se. Apesar da contenda, Walesa consideraria Mazowiecki o melhor primeiro-ministro e um político de excecional honestidade. Em «Un Autre Visage de l’Europe», (Noir sur Blanc, 1989, prefácio de Jean-Marie Domenach), Mazowiecki fala da necessidade de garantir que a política seja o lugar «onde respirar a verdade e poder fazer tudo pela verdade é um fator de liberdade». Trata-se do exemplo do cristão que não volta a cara às responsabilidades. Acreditou na força do «compromisso político» (v. Guy Coq, «Mounier: o Compromisso Político», Gradiva) e deixou-nos, como outros cristãos (Giorgio La Pira e Robert Schuman), a demonstração de que o combate à indiferença exige a entrega e a responsabilidade das bem-aventuranças.