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P. Gonçalo Portocarrero de Almada
2014: Ano bom … para quem?
A perseguição religiosa, o «ecumenismo de sangue» e a unidade dos cristãos

 

É costume, quando chega o fim do ano civil, desejar umas boas entradas e um bom ano novo. Contudo, para duzentos milhões de cristãos que, segundo o Le Figaro Magazine, de 21 de Dezembro de 2013, são perseguidos por razão da sua identidade religiosa, esses auspiciosos votos só muito dificilmente se concretizarão em 2014.

O Padre Georges Vandenbeusch, francês mas pároco nos Camarões, que foi sequestrado no passado 13 de Novembro por guerrilheiros do grupo Boko Haram, da Nigéria, onde permanece em cativeiro, é uma das muitas vítimas da intolerância religiosa. Segundo a mesma fonte, também estão presas as doze monjas gregas ortodoxas que, a 2 de Dezembro, foram expulsas, pelos rebeldes sírios, do seu convento de Maaloula e que, desde então, permanecem em cativeiro.

Também os cristãos do Médio Oriente são objecto de uma discriminação porventura não tão chamativa, mas não menos impiedosa. João Paulo II e Bento XVI manifestaram, várias vezes, o seu temor de que, se não cessar a sistemática hostilização dos cristãos palestinos por judeus e muçulmanos radicais, a presença cristã na Terra Santa pode desaparecer em breve. O Papa Francisco, que já anunciou a sua viagem apostólica aos Santos Lugares, em Maio de 2014, fez no mês passado, pelo Twitter, um dramático apelo: «Não nos resignamos a um Médio Oriente sem cristãos. Rezemos, todos os dias, pela paz!».

Dois observatórios mundiais – a entidade católica «Ajuda à Igreja que sofre» e a organização não-governamental protestante evangélica «Portas abertas» – estimam que 75% dos casos de perseguição religiosa no mundo tem, como alvo, os cristãos. As situações mais dramáticas ocorrem actualmente na Nigéria, na Líbia, no Egipto, no Sudão, no Iraque, no Paquistão – onde ainda permanece encarcerada Asia Bibi, condenada à morte por um alegado crime de blasfémia que não cometeu – e em certas regiões da União Indiana. O mesmo se diga dos países comunistas da Ásia, ou seja, da China, da Coreia do Norte e do Vietname. Também estão em análoga situação os cristãos do Mali, dos Camarões, da República Centro-africana, da Etiópia e da Síria.

Irmanados pela fé em Cristo, fiéis de várias denominações cristãs vivem já o «ecumenismo de sangue», que o Papa Francisco, numa recente entrevista ao diário italiano La Stampa, definiu nos seguintes termos: «em certos países, os cristãos são mortos porque usam uma cruz, ou têm uma Bíblia, e ninguém lhes pergunta, antes de os matar, se são anglicanos, luteranos, católicos ou ortodoxos».

A unidade dos cristãos é já uma realidade no comum testemunho do martírio desses nossos irmãos – católicos, ortodoxos e protestantes – que, no mundo inteiro, são perseguidos pela sua fé. E, se o sangue dos mártires é sementeira de cristãos, esse sangue é também sinal de esperança numa abundante colheita, na certeza da nova evangelização.

Em pleno oitavário de oração pela unidade de todos os cristãos, que todos os anos a Igreja católica cumpre, de 18 a 25 de Janeiro, festa litúrgica da conversão de São Paulo, rezemos mais fervorosamente pela questão ecuménica, tão cara ao Concílio Vaticano II. A unidade é possível não apenas se os irmãos separados se unirem à Igreja romana, mas se todos, também os católicos, nos convertermos de verdade a Cristo e n’Ele vivermos o mandamento da unidade, condição sine qua non da credibilidade e da eficácia apostólica da mensagem cristã.