Entrevistas |
Padre João Chagas, responsável pelo Sector Juventude no Pontifício Conselho para os Leigos, na Santa Sé
“Papa considera que os jovens são interlocutores protagonistas dos processos que vivem”
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O responsável pelo Sector Juventude na Santa Sé, padre João Chagas, em entrevista ao Jornal VOZ DA VERDADE, faz um balanço da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) no Rio de Janeiro, onde destaca os inúmeros frutos e projeta a próxima Jornada que será na terra natal de São João Paulo II.

 

Como descreve a sua função no Pontifício Conselho para os Leigos?

Este trabalho é uma expressão da solicitude do Santo Padre e da Igreja Católica em relação aos jovens. Não somente o trabalho da Jornada Mundial da Juventude mas também todo o trabalho da Pastoral Juvenil no mundo inteiro. Não somos nós que tomamos todas as iniciativas, mas acompanhamos o trabalho que é feito pelas conferências episcopais, pelas associações e movimentos internacionais. Costumamos também receber, no nosso dicastério, que é composto por diversos sectores, as visitas ad limina dos Bispos do mundo inteiro, onde todos temos oportunidade de dialogar com os prelados sobre o apostolado dos leigos e em especial relativamente àquilo que nos é confiado que, no meu caso, diz respeito à juventude. Também procuramos promover diversos encontros, tal como aconteceu, em colaboração com o Conselho das Conferências Episcopais da Europa, no Congresso Europeu de Pastoral Juvenil [realizado em Roma, entre os dias 11 e 13 de dezembro de 2014] e com o Fórum Internacional da Juventude que acontece periodicamente. Por vezes também somos convidados para participar em encontros nacionais e internacionais e assim vamo-nos fazendo companheiros de caminhada de cada realidade que trabalha com a juventude, no mundo.

 

Como se concretizou a sua entrada neste conselho pontifício?

No ano 2011, durante a JMJ de Madrid, eu era o responsável pelo grupo da Comunidade Católica Shalom e fiquei no palco da vigília junto do fundador da comunidade, Moysés Azevedo. O Cardeal Stanislaw Rylko, presidente do Pontifício Conselho para os Leigos, aproveitou o momento para falar, à parte, com o fundador da comunidade. Soube, passado algum tempo, que nessa conversa, o Cardeal Rylko tinha pedido um sacerdote da Comunidade Shalom que pudesse ajudar na preparação da Jornada Mundial da Juventude do Rio de Janeiro, em 2013. A comunidade decidiu indicar-me para fazer esse trabalho. De 2011 a 2013, colaborei no Sector Juventude do Pontifício Conselho para os Leigos fazendo a ponte com o Comité Organizador Local da jornada, no Rio de Janeiro. Nesse trabalho adquiri bastante experiência e depois da JMJ do Rio de Janeiro, o padre Eric Jacquinet, meu antecessor, foi chamado para voltar ao seu país, França, depois de 5 anos nesta função. Então, o Cardeal Rylko convidou-me para esta função, que assumi a partir de outubro de 2013.

 

De que forma está organizado o Pontifício Conselho para os Leigos?

O dicastério brota do Concílio Vaticano II e no próximo ano celebraremos 50 anos da Apostolicam Actuositatem, sobre o apostolado dos leigos. Com o Concílio dá-se um novo impulso ao papel dos leigos, a uma redescoberta da vocação universal à santidade que não diz respeito somente aos padres, religiosos, consagrados, mas a todos os batizados. O Pontifício Conselho para os Leigos acompanha esse trabalho de apostolado dos leigos no mundo de hoje. Para além do Sector da Juventude, existe também um sector que acompanha  toda a realidade das associações, movimentos e novas comunidades. Existe também um sector jurídico que segue todo o processo de aprovação Pontifícia dos estatutos dessas associações, temos o sector de desporto e também temos um sector que acompanha a realidade das mulheres e o que esse tema representa na Igreja e no mundo de hoje. Estes são os sectores principais.

 

Estamos entre duas Jornadas Mundiais da Juventude. Que balanço faz da JMJ do Rio de Janeiro, em 2013?

Estamos a viver um período que começou no início dos anos 80, com um novo impulso, dado por João Paulo II, à pastoral juvenil do mundo inteiro, através de inúmeras iniciativas e documentos. A Jornada Mundial da Juventude surge neste contexto, depois dos encontros internacionais que João Paulo II convocou em 1984 e 1985. Muito teríamos para recordar... Este ano de 2014, por exemplo, celebrámos os 30 anos da entrega da Cruz da Jornada que foi feita em 1984, na conclusão do Ano Jubilar da Redenção. Pelo menos até 2017 – data em que vamos celebrar os 30 anos da primeira JMJ a nível internacional organizada fora de Roma, e que decorreu em Buenos Aires, na Argentina, em 1987–, celebraremos também os 30 anos de várias iniciativas de João Paulo II.

O tema da JMJ do Rio de Janeiro, ‘Ide e fazei discípulos de todas as nações’, foi expressão do mandato missionário que Jesus recebeu do Pai e que depois fez para cada um de nós. Os frutos são muitos. Recentemente recebemos a visita do Cardeal D. Orani Tempesta, Arcebispo do Rio de Janeiro, que partilhou connosco tantos frutos que a jornada deu, não só no Rio de Janeiro e Brasil, mas em todo o mundo. No encontro de avaliação que fizemos em abril, vimos que foi uma jornada que suscitou muito entusiasmo, muita alegria e muito ímpeto missionário nos jovens do mundo inteiro. Por exemplo, os jovens da Indonésia criaram um grupo chamado ‘Brain’ – resultado das iniciais de “Brasil” e “Indonésia” – que é um grupo de partilha daquilo que foram os frutos da JMJ. Os jovens da Bélgica, por exemplo, também continuam a cultivar a relação com a diocese que os acolheu, durante a semana missionária, no Brasil. A jornada põe em movimento a pastoral juvenil no mundo e não é um fim em si mesma.

 

Para todos estes frutos contribuiu a presença do Papa Francisco…

Sim. Vamos percebendo a jornada como um testemunho que vai sendo passado entre atletas. É interessante ver que cada Papa deu a contribuição própria para cada jornada e para a pastoral juvenil do mundo. Percebemos que o Papa Francisco, sendo argentino, sentiu-se muito em casa. Deu uma nova injeção de entusiasmo e alegria, visível na proximidade e empatia com os jovens. Foi uma jornada muito bonita que marcou.

 

Como prevê que decorra a próxima Jornada Mundial da Juventude em Cracóvia, em 2016?

Na mensagem do Papa Francisco para a Jornada Mundial da Juventude deste ano, que é celebrada a nível diocesano, anunciou que João Paulo II, canonizado em abril, se tornaria no patrono da Jornada Mundial da Juventude. A JMJ de Cracóvia, em 2016, será a primeira jornada celebrada após a sua canonização, e decorrerá precisamente na sua terra natal. Pessoas que ajudaram João Paulo II a organizar as primeiras jornadas dizem que quando se decidiu o local para fazer a jornada em Czestochowa, Polónia, uma das possibilidades era fazer a JMJ em Cracóvia e João Paulo II disse “ainda não”. Mas, tal como Santa Teresinha dizia que no céu iria trabalhar mais ainda e não descansaria, acreditamos que João Paulo II continua a fazer muito mais pela juventude e que agora quer receber os jovens de todo o mundo na sua casa, em Cracóvia, que é uma cidade onde tudo fala de São João Paulo II e onde podemos dizer que há uma mensagem fortíssima da Divina Misericórdia, seja através da vida de Santa Faustina, seja através de São João Paulo II. Acreditamos que será uma jornada marcante, de peregrinação. A jornada vai alternando entre momentos de peregrinação a grandes santuários e grandes centros urbanos, procurando transformar e santificar, como o Rio de Janeiro, Bueno Aires e outras cidades. Pensemos, por exemplo, que a última jornada foi realizada, praticamente na totalidade, em Copacabana, numa praia, mas fazendo daquele momento um lugar onde ressoa o chamamento de Cristo para os jovens, tal como no Mar da Galileia, por onde Jesus passou.

 

Tem recebido feedback da organização da JMJ de Cracóvia?

Diariamente. Estivemos lá no passado mês de outubro, por duas vezes, e temos contactos permanentes com o Comité Organizador Local. Os trabalhos estão a caminhar a todo o vapor. O Comité Organizador está a trabalhar com muito afinco, entusiasmo e dedicação. Sabemos que nos primeiros meses são trabalhos mais para lançar as bases, e por isso são menos visíveis, mas as coisas começam a aparecer e já temos alguns sinais que vão marcando um ritmo de preparação, como por exemplo o logótipo da jornada, que já foi lançado, e o hino oficial da jornada, que será divulgado em breve.

 

Com o impulso missionário dado pelo Papa Francisco a toda a Igreja, o que se pode esperar da juventude nos próximos tempos?

Por exemplo, na recente viagem do Papa Francisco à Coreia do Sul, um dos temas mais delicados que o Papa tinha para tratar era a divisão das duas Coreias. Tal como celebrámos a queda do muro de Berlim, ansiamos pelo dia em que cairão tantos muros que separam povos e nações. Francisco teve encontros com políticos e líderes religiosos, com tanta gente, mas decidiu tratar o tema da separação das duas Coreias precisamente no encontro com os jovens. Para mim, isso é um sinal muito forte porque o Papa não considera os jovens uns interlocutores de segunda categoria. Para ele, os jovens são interlocutores protagonistas dos processos que vivem e não somente sofredores das consequências dos acontecimentos. O Papa fala sempre desse novo protagonismo da juventude e até reforçou, nessa visita asiática, ao afirmar que os jovens não são somente o futuro mas o presente. Sempre me chama muito a atenção um parágrafo da regra de São Bento, grande influenciador da Europa e da formação do continente europeu. Ele dizia que nos processos de decisão do mosteiro, era sempre preciso escutar o irmão mais jovem porque muitas vezes daí viria uma palavra que ajudaria a resolver as situações mais difíceis. Acredito que seja muito importante nos processos de decisão das nações, dos povos e até mesmo dentro da própria Igreja, o lugar da juventude, não somente como perspectiva de futuro mas já no presente. Hoje, vemos que em todos os processos de transformação que acontecem no mundo, a juventude é protagonista. A voz da juventude é a capacidade que tem em sonhar a semente de esperança que é contida no coração de cada jovem.

 

Que mensagem poderia deixar aos jovens portugueses?

Em primeiro lugar, obrigado a Portugal por ter levado a fé. Se hoje estou aqui, foi porque um dia o Brasil recebeu o testemunho de Portugal, a chama da fé, que hoje somos chamados a restituir, de graça, o que recebemos.

Após a JMJ de Madrid, 2011, o Papa Bento XVI dizia que a Jornada Mundial da Juventude era um remédio para a fé cansada. Talvez em alguns lugares da Europa percebamos uma fé adormentada... mas a fé nunca morre! É muito mais uma questão de acordar, de um novo despertar para a experiência da fé.

 

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Perfil

O padre João Chagas tem 40 anos e é natural da cidade de Fortaleza, no nordeste do Brasil. Foi ordenado sacerdote em 2001 e tem 22 anos de vida comunitária como membro da Comunidade Católica Shalom, onde desenvolveu trabalho pastoral ligado à catequese, liturgia e juventude. Depois da ordenação como sacerdote, trabalhou no governo geral da comunidade, com o fundador, Moysés Azevedo, e passados dois anos foi enviado para Roma, onde se encarregou da abertura do escritório internacional que tinha por missão acompanhar os processos de fundação da Comunidade Católica Shalom, fora do Brasil. De entre os processos em que colaborou, destacam-se a abertura de duas casas em Portugal, nas dioceses de Braga e Setúbal. Entre 2007 e 2011, foi pároco na Diocese de Civita Castellana, perto de Roma, e é, desde outubro de 2013, o responsável pelo Sector Juventude no Pontifício Conselho para os Leigos, um dos dicastérios da Santa Sé.

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