Vê-los juntos, porque acolhidos, é o sonho do profeta, é o anseio do ser humano. Mas, nem os dias quentes anunciadores do Verão, nem os acontecimentos desportivos do passado fim de semana com a beleza do encontro, mas também com a violência gratuita, boçal e idiota, conseguem fazer-nos esquecer a situação agitada neste planeta; antes nos fazem lembrar um vulcão dando sinais de erupção iminente.
O fervilhar do mundo
É o caso dos “clandestinos” ou “ilegais” cruzando o Mediterrâneo com a Europa no horizonte, ou dos milhares de imigrantes do Bangladesh e da Birmânia cruzando o Índico na busca de um país que os respeite e os acolha. O instinto da sobrevivência, ou o risco de assumir a sua dignidade, leva a situações dramáticas como aquela que nos era relatada pelo “Público” de 18 de Maio, em que o desespero e a luta pelos últimos mantimentos existentes a bordo, terá sido a causa da morte de cerca de uma centena de passageiros.
A intensidade do fenómeno e a dramaticidade que os acompanha fez levantar os governantes europeus da letargia em que pareciam viver. Em boa verdade, a preocupação não é nova; é agora mais aguda e profunda. Quando Portugal assinou o Acordo Schengen e a Convenção de aplicação do mesmo, um jornalista do Público colocou-me três perguntas sobre as consequências dos acordos. Num clima de uma certa euforia, escrevi aquilo que me parecia mais provável e que agora se confirma: “As medidas previstas nesses instrumentos não vão atacar o mal nas suas raízes, mas apenas no periférico… Não resolverão os próprios problemas porque não há força que resulte contra multidões desesperadas em busca de trabalho ou de uma vida nova para que possam sobreviver. Por isso, os acordos estarão permanentemente inadequados – por mais voltas que lhes dêem; são portadores de patologia hereditária”.
Atenção à semente
A ganância pelos bens da terra e a sede de poder, deixadas à solta na cabeça das criaturas pensantes, levam a encontrar não só as explicações como também as justificações para tudo. Como no fenómeno do racismo. A sociedade agitada pelas injustiças, pelas desigualdades gritantes, pela superabundância de uns poucos e pela carência extrema de muitos outros, as convulsões sociais a forçarem os limites da estabilidade, deixam entrever que razões discretamente escondidas, agora dão um sinal de estarem vivas e dispostas a conquistar posições. As repetidas atuações violentas das forças policiais nos Estados Unidos contra cidadãos de cor, ou as imagens da polícia israelita atacando um soldado israelita etíope, deixam-nos perplexos. Quando há semanas apareceu a notícia de que o “Mein Kampf” (A minha Luta) de Hitler iria ser reeditado na Alemanha, levantou-se um burburinho de opiniões, uns a favor (como instrumento para um esclarecimento mais profundo da História), outros contra (porque “é demasiado perigoso para o público em geral” ou “porque é um guia para o Holocausto”). Não ficamos indiferentes quando lemos que o presidente de câmara de Beziers, eleito pela Frente Nacional, decidiu contar os estudantes muçulmanos das escolas da sua cidade. São manifestações da maneira como a pessoa reage perante o outro; alguns conseguem vislumbrar, para além das naturais diferenças, razões justificadoras da sua reação primária, irracional.
A nuvem do racismo
É mais fácil descrever o racismo do que ter a pretensão de defini-lo. Partindo da afirmação da superioridade de determinadas raças, temos a contradizê-la a convenção das Nações Unidas sobre todas as formas de discriminação racial, declarando que “as doutrinas da superioridade fundada na diferenciação entre as raças são cientificamente falsas, moralmente condenáveis e socialmente injustas e perigosas”. Relativamente à visão cristã dessa realidade, fica clara a incompatibilidade da perspetiva racista perante a paternidade de Deus e a fraternidade universal, que perpassam o anúncio dos profetas, o Evangelho de Jesus, o ensino dos apóstolos, e o ensino da Igreja, que outra coisa não pode anunciar. E porque de irracionalidade se trata, tomo a linguagem livre e carregada de simbolismo da jovem escritora santomense Goretti Pina, que a par da sua sensibilidade de artista acumula a experiência de uma estrangeira caminhando e procurando com outros ultrapassar dificuldades, a começar pelo preconceito:
“Racismo é o cinismo escondido na dor da ignorância. É ausência de amor no coração que nada alcança. É palavra sem mensagem. É atitude que dói, que mói, que mata !...Que corrói, que auto-engana. É nada !...” (A respiração dos Dias; Edições Colibri, p. 82).
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