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Henrique Joaquim
“Vou à procura da vida”

Como quase sempre, após várias semanas com imensas notícias sobre as mortes no mediterrâneo, parece agora termos ficado um pouco anestesiados. Contudo, e tratando-se de um assunto tão dramático, é importante continuarmos a refletir sobre esta tragédia que, sendo humana, exige a nossa atenção e ação.

É verdade que face à dimensão deste drama as altas instâncias, designadamente na Europa, têm manifestado vontade de tomar medidas de diferentes tipos. Contudo, não só se tem tardado em passar das intenções aos atos como parece estar-se muito aquém das medidas necessárias.

É bom notar que segundo a ACNUR - Agência da ONU para Refugiados, desde o início de 2015, já chegaram à Europa mais de 100 mil pessoas e a União Europeia tem planeado criar condições para acolher 20mil pessoas - apenas um quinto das pessoas que já chegaram.

Embora seja necessário ter em conta que se trata de um problema humanitário muito complexo torna-se pertinente perguntarmo-nos se estamos de facto a fazer o possível para acolher aqueles e aquelas que fugindo das condições desumanas procuram “a Vida”!

Independentemente da sua origem, a esmagadora maioria das pessoas nesta situação podem tecnicamente ser enquadradas no estatuto de refugiados.

De acordo com a Convenção de Genebra de 1951, um refugiado é uma pessoa que "receando com razão ser perseguida em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou das suas opiniões políticas, se encontre fora do país de que tem a nacionalidade e não possa ou, em virtude daquele receio, não queira pedir a proteção daquele país; ou que, se não tiver nacionalidade e estiver fora do país no qual tinha a sua residência habitual, após aqueles acontecimentos não possa ou, em virtude do dito receio, a ele não queira voltar."

Temos entre nós uma organização há vários anos a trabalhar no acolhimento destas pessoas, o CPR (Conselho Português para os Refugiados), mas que se tornará manifestamente insuficiente para que haja condições reais para acudir dignamente a todas estas situações. O CPR trabalha já no sentido de dinamizar/coordenar uma rede com outras organizações que, em conjunto, possam respostas adequadas.

Será que temos já uma consciência coletiva sobre este drama humanitário? Que condições terá cada um de nós, individual e coletivamente falando, para participar neste desígnio que permita resgatar cada uma destas vidas? Não haverá nas nossas organizações, nas nossas estruturas residenciais, capacidade de acolher algumas pessoas nestas condições?

Trata-se de um fenómeno que carece de respostas tecnicamente organizadas e estruturadamente humanizadas. Mas Portugal tem sido historicamente um exemplo no que se refere à proteção dos direitos humanos. Por várias vezes nos temos unido e dessa forma temos conseguido realizar sonhos tão grandes e espetaculares como foi o contributo determinante na autodeterminação de Timor!

Hoje temos outro grande desafio. Apesar do contexto difícil que vivemos a nível interno temos de certeza a capacidade de ir mais além.

É nas alturas da necessidade que do pouco se faz muito porque com o pouco de cada um, solidariamente partilhado, transcendentemente acreditado, o milagre pode sempre acontecer.