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Isilda Pegado
As crianças e os Tribunais de Família
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1 – Foi aprovado pela Assembleia da República e entrou agora em vigor um conjunto de Leis que alteram, entre outros aspectos, o processo de Regulação das Responsabilidades Parentais, no caso de separação dos progenitores (Lei 141/2015).
2 – Não podemos ignorar que vivemos numa Sociedade onde, fruto das mais diversas circunstâncias, os pais de crianças de tenra idade se separam com muita frequência. As dificuldades daí resultantes são muitas, e na grande maioria dos casos de complexa resolução. Na verdade, está em causa a vinculação que se produz a partir de afectos, relações de sangue, interesses económicos, tradições, projectos de vida, etc. E, onde a parte emocional tem um papel determinante, como aliás é facilmente entendível.
3 – O papel de mãe e pai mesmo quando em coabitação, tem vindo a ganhar novas formas de exercício. Assim, pai e mãe contribuem na prestação de cuidados ao bebé ou à criança, partilham tarefas como o apoio escolar, as reuniões de escola, as consultas médicas ou as actividades extra-curriculares.
Por isso, no momento da separação de adultos é necessário pensar seriamente nas crianças, que não “pediram” essa separação. E, têm direito a ver continuadas estas relações de proximidade e partilha. A forma como, após a separação, é mantida essa vinculação é muito variada e depende de muitas circunstâncias envolventes. Não há modelos, há pessoas.
4 – Na sequência desta alteração de paradigma social, vem agora a lei privilegiar uma resolução de conflitos entre os pais através de uma Justiça de proximidade, de conferências, de intervenção do menor (quando em idade para ser ouvido e, que não seja, para escolher entre o pai e a mãe) e, apenas em última instância, o recurso a julgamento.
5 – É sabido que a lei, em parte, forma as mentalidades. Em consequência, temos um processo de resolução de conflitos na guarda de crianças que, mais do que julgar e decidir, é um limar de arestas, um encontro de vontades, um compromisso bilateral que se pretende alcançar...
É sabido que, já hoje muitas destas situações não chegam a Tribunal com conflito (pensa-se que mais de 50%) porque os pais são capazes de encontrar sozinhos o acordo de guarda e exercício das responsabilidades parentais, ou porque prévio à intervenção do Tribunal houve mediação familiar com sucesso, ou ainda, (e estes são seguramente mais de 40% dos caos) houve a intervenção de advogados que, no seu saber e experiência, conduziram ao entendimento dos pais, e apenas submetem a Tribunal a homologação do acordo.
6 – A nova lei optou por uma resolução de conflitos quase que “assistencial” mas, tal solução não pode ser desenraizada de toda a sua envolvente. Desde logo, implica muito tempo disponível dos Tribunais, isto é, mais meios humanos (magistrados e funcionários) para que os processos não se arrastem no tempo. A Justiça que não vem no tempo certo, é sempre injusta…
7 – Mas também, terá de ser assegurada uma proximidade geográfica das populações com os Tribunais. Facto que está longe de ser satisfatório. Não é admissível que a mãe de duas crianças, sem alimentos para os filhos, tenha de se deslocar a um Tribunal, no que despende 12,00¤ ou 18,00¤ em transportes públicos. E, atenta a falta destes, precise de 5 a 6 horas.
O art. 20.º n.º1 da Constituição da República Portuguesa diz: “A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos”.
8 – Quando se agitam os tempos, porque de mudança, há-de olhar-se aos mais carenciados, às gritantes situações silenciadas pela falta de meios que a boa ou má gestão de recursos públicos dita.
Os frutos do que fizermos agora, ver-se-ão a curto prazo, porque as crianças crescem e tornam-se adultos rapidamente.