Artigos |
Isilda Pegado
A Lei da Reprodução Artificial no bar de uma Faculdade de Direito

No bar de uma Faculdade de Direito acabam de se sentar à mesa 3 alunos, a Ana, a Rita e o Luís sendo a conversa, que os ocupa as questões que se levantam com a aprovação pelo Parlamento da alteração à Lei da Reprodução Artificial (ou Procriação Medicamente Assistida – PMA).

Ana – Ainda há menos de um ano quando falámos da Lei da PMA dizia o professor que a reprodução artificial é subsidiária da reprodução biológica. Destina-se a ajudar casais inférteis, e por isso só estes têm acesso a tais técnicas. Tal lei foi aprovada pelos partidos de esquerda (PS, PCP e BE) e agora estes vêm dizer que a lei aprovada é inconstitucional? Porque deve ser admitida a qualquer mulher que o deseje?

Rita – Mas a Constituição não foi alterada desde 2006! Porque é inconstitucional a Lei?

Luís – Dizem que essa lei impede as mulheres sozinhas (sem marido ou companheiro) de ter um filho. Também não percebo. Um filho de um só progenitor? Isto é, uma lei feita só para as mulheres. Nós homens não podemos ter um “filho só meu”.

Rita – Até neste aspecto a lei que agora pretendemos criar pode ser inconstitucional. Há aí uma verdadeira desigualdade. Mas não é isso que me preocupa. Como será nascer de um só progenitor?

Não ter pai, nem a família do pai? É muito estranho!!!

Ana – Eu passaria o resto da vida na busca desses meus familiares. A Constituição fala no direito à identidade pessoal, o direito à informação relativa à pessoa e família, o direito à identidade genética do ser humano, nomeadamente quando haja recurso à tecnologia, e ninguém diz isto no Parlamento? Está lá, eu sei, no art. 26.º e 67.º n.º2 da Constituição. A Constituição não dá garantias?

Luís – Pelos vistos é “pau para toda a obra”. Até a inseminação “post morten” se admite. A criança é “filha do morto”? acham que esta forma de fazer política ajuda verdadeiramente a construir a “Polis” ou irá destrui-la? Que cidadãos teremos no futuro? Eu li o “Admirável Mundo Novo” e acho que já estivemos mais longe.

Não quero ser “cota”, mas tenho muitas dúvidas. Acho isto tudo uma mentira.

Rita – Alguns dirão, “só faz quem quer”. Mas esse argumento é muito falacioso. Cada indivíduo não é propriedade de uma mãe ou pai. O ser humano é parte integrante da Sociedade. E a Sociedade tem o dever de zelar pela dignidade e felicidade de todos os indivíduos.

Não sei explicar muito bem. Mas o individualismo que se faz passar por uma liberdade e autonomia total, parece-me mais uma escravidão.

Eu gosto muito da família do meu pai e da família da minha mãe. Ainda que me faltasse um deles tinha sempre os meus tios, primos, avós.

Admitir que deliberadamente se faz nascer um indivíduo amputado de metade da sua hereditariedade, é muito estranho…

Ana – Isto não tem nada a ver com os direitos das mulheres. É outra coisa… Há como que a interferência, ou melhor, a modificação do que é o Homem. E por isso é como diz o Luís – Que “cidade” ou que sociedade estamos a construir? Que questões sociais se levantam? Porque aprendemos nós que o superior interesse da criança exige que esta tenha contactos alargados com pai e mãe? Esquecemos o superior interesse daquelas crianças que nasceriam com um só progenitor?

Luís – Está na hora da aula de Direitos Reais, temos de ir… mas podemos falar com o Professor de Família, ou de Direito Constitucional? Vamos?