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O desafio do Reino face à pobreza e à fome
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A fome continua a ser uma chaga que desfigura e faz sofrer a humanidade numa altura em que o acesso a bens essenciais estaria ao alcance da família humana, desde que esse sentido de família existisse. No entanto, cerca de um bilião de pessoas convive com ela e as perspetivas não são animadoras. A concentração dos grandes grupos, com o único objetivo do lucro e transformando a pessoa apenas numa peça do sistema, pode com justeza chamar-se o que o Papa Francisco apelidou de “economia que mata”.

 

Dignidade e não esmola

O Santo Padre aproveitou a oportunidade da sessão anual do Conselho Executivo do Programa Alimentar Mundial (PMA), em Roma, no passado dia 13 de Junho, para lembrar essa chaga e denunciar os obstáculos criados à luta pela sua erradicação.  Chamou a atenção para o estranho e paradoxal fenómeno de os planos de desenvolvimento se verem obstaculizados por intrincadas e incompreensíveis decisões políticas, por tendenciosas visões ideológicas ou por insuperáveis barreiras alfandegárias, enquanto que esses obstáculos não são postos ao comércio e tráfico de armas que provocam a morte. Também se referiu à necessidade de “desnaturalizar” a miséria e a fome, não as considerando apenas como um dado entre muitos outros, prática que pode levar à indiferença perante o drama em questão.

Esta visita ao PMA ocorre no ano que marca o início do trabalho pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), uma nova agenda de ação baseada nas lições aprendidas com os Objetivos do Milénio (ODM), que se propõem eliminar a fome até 2030. Disse ele: “Enquanto se fala de novos direitos, o faminto aí está, na esquina da rua e pede o reconhecimento da cidadania, pede ser considerado na sua condição e receber uma alimentação de base saudável. Pede-nos dignidade, não esmola.”

 

Erradicar sim, mas não perpetuar

Mais do que falar impõe-se erradicar a pobreza e a fome, procurando identificar as causas para sobre elas atuar. Uma visão crítica da questão é sempre necessária. O último número do Boletim da AEFJN - Rede África/Europa Fé e Justiça chama a atenção para a facilidade com que se aceitam os estereótipos relativos à pobreza sem apontar os mecanismos que a provocam. Veja-se como nos media a ideia da pobreza é veiculada por imagens de pessoas africanas. No entanto, segundo os dados da FAO, num total de cerca de 868 milhões de pessoas subnutridas no mundo, 568 milhões vivem na Ásia; em África vivem 239 milhões, o que significa apenas um terço do total. Apesar disso, a propaganda ocidental continua a etiquetar a África como o continente subalimentado, deixando na sombra um dado importante: a Ásia, embora com um maior número de pessoas nessa situação, está a seguir um rumo mais libertador, rejeitando o modelo de desenvolvimento apresentado pelo FMI e pelo BM: é arriscado, mas é mais promissor. A África, pelo contrário, tem ficado prisioneira das ajudas internacionais, que acabam por consolidar os interesses dos grandes grupos económicos, que vão para lá canalizando umas migalhas, sob a capa de ajudas, mas provocando o colapso da economia tradicional, o desemprego e assim a dependência humilhante e a perpetuação da mesma. O caso das normas do comércio internacional no referente ao algodão, são apenas um exemplo disso.

 

O Reino de Deus e a sua justiça

Na mesma linha, as negociações entre os Estados Unidos e a União Europeia sobre os acordos TTIP (Parceria Transatlântica para o Comércio e o Investimento) são motivo de preocupação: visam não apenas o livre comércio, mas sobretudo o alargamento e o lucro das corporações, criando uma estratégia global para constituir um poder absoluto, ilimitado e sem rosto; perante esse poder os governos ficam manietados e os valores da cidadania, da democracia, da soberania e da liberdade são atirados pela janela fora; estamos perante uma Europa sem alma, aliciada por quem já a perdeu.

Um mundo diferente, com a pessoa no centro, é o que Jesus propõe aos seus amigos quando fala do Reino de Deus. Ele não deixou em herança uma doutrina religiosa; deixou sim, a partir da sua experiência como profeta, um novo horizonte para nos confrontarmos com a realidade, um novo paradigma para humanizar a vida. Olhar para o Crucificado sem olhar para os crucificados de hoje é infidelidade ao Espírito.

texto pelo P. Valentim Gonçalves, CJP-CIRP
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