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Padre Stephan Rothlin, jesuíta suíço, residente em Pequim: ?Os padres da Igreja patriótica chinesa querem ser fiéis a Roma?
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Os padres da chamada Igreja oficial da China – ligada ao governo chinês – desejam a reconciliação com Roma. A garantia é deixada pelo padre Stephan Rothlin, jesuíta suíço, residente há muitos anos em Pequim. Nesta entrevista ao Jornal W, este sacerdote fala sobre a China actual e os problemas e desafios que a Igreja ali enfrenta.

Há quanto tempo vive em Pequim e que trabalho desenvolve por terras chinesas?

Vivo em Pequim há 11 anos, desde 1998. Neste momento sou secretário-geral do “Center for International Business Ethics”. Portanto, dou aulas de ética nos negócios e faço ainda consultoria a empresas.

 

Com é que vê a Igreja actualmente, especialmente a Igreja na China e em Pequim?

A Igreja é muito diferente na China. Há um movimento muito grande para todas as religiões, não apenas para os cristãos. Recentemente foi lançada uma obra sobre a história da Bíblia, e o que é facto é que as pessoas ficaram entusiasmadas a querer conhecer mais a Sagrada Escritura. Na Páscoa, muitos jovens estão a ser baptizados…

 

As notícias que temos recebido em Portugal é que a Igreja Católica na China está a crescer. Acha que o governo chinês tem ajudado ou será que não gostam do sentimento religioso?

A Igreja na China vive num certo sistema político. Na lógica desse sistema político, eles insistem que cada comunidade religiosa tem de estar registada. Mas a China não é um caso isolado. Também no Vietname há uma interferência do governo na questão religiosa. Mesmo tendo uma comunidade mais alargada do que no Vietname, a Igreja na China tem de lidar com um governo muito forte, que quer ter a certeza de que tem tudo sobre controlo.

 

Há diferenças na interferência do governo chinês na religião? Ou seja, em Pequim, em Hong Kong ou mesmo em Macau, o tipo de interferência por parte do governo é o mesmo?

Em Hong Kong e mesmo em Macau, há diferenças em relação a Pequim. Nestes locais – que se assemelham mais ao que acontece nos países europeus – a Igreja pode fazer o que bem entende. Os bispos, inclusive, são nomeados de Roma. Isso é algo que, como sabemos, não acontece na chamada Igreja oficial da China [a Igreja fiel ao Papa na China é conhecida como Igreja clandestina].

 

Qual é a relação entre a Igreja que é fiel ao Vaticano e a chamada Igreja oficial? Há alguma relação entre os cristãos, os padres, as instituições dessa ‘duas’ Igrejas?

Primeiro tenho de salientar que tudo é complicado na China. Mas o que temos de ter em conta é que mesmo na Igreja patriótica, a maioria dos padres quer ser fiel a Roma. Se formos a uma Igreja em Pequim, todos os padres rezam pelo Papa. É convicção do Papa que devemos seguir em frente – mas é claro que há algum ressentimento no clero chinês. Posso-lhe dizer que o bispo de Xangai passou 28 anos na prisão e agora ‘serve’ a Igreja oficial fiel ao governo. E a razão é simples: o governo está em todas as instituições e esse bispo acredita que desta forma pode melhor ajudar as cinquenta paróquias da diocese. Mas temos de reconhecer que o objectivo é sempre chegar à unidade.

 

O que considera mais importante da carta que o Papa Bento XVI enviou à Igreja da China, o ano passado?

Quanto a mim, o mais importante na carta [ver caixa] é que mostrou o grande afecto que o Papa tem pela China. Poderia também dizer o mesmo de João Paulo II, que tinha um grande amor pela China. A carta serviu ainda para mostrar um grande respeito pela cultura na China e mesmo para incentivar todos os fiéis chineses a uma perspectiva de reconciliação. Tal como acontece no Vietname, há bispos que foram ‘aprovados’ pelos dois lados: por Roma e pelo governo chinês.

 

Mas será possível uma relação mais próxima entre o Vaticano e o governo chinês? Há notícias de que tem havido muitos avanços e recuos no diálogo…

Bom, da parte do governo chinês há a percepção de que a religião faz muito pela sociedade. Há esse reconhecimento. Por outro lado, o governo não gosta de ver uma organização internacional como a Igreja a ‘mandar’ dentro do seu país. De maneira, que o futuro é um pouco ambíguo…

 

O padre Stephan Rothlin dá uma disciplina de ética. Procura ensinar os seus alunos como professor ou como padre?

Nós nunca podemos colocar o nosso lado sacerdotal de lado, como num frigorífico. Eu ensino como professor, mas pode-se entender a minha missão como procurando o bem comum. Tal como a mensagem cristã da solidariedade, mas num contexto especial.

 

 

Informação complementar

As relações entre o Vaticano e a China

O governo chinês cortou relações com o Vaticano em 1951, dois anos após a subida do Partido Comunista ao poder. Segundo fontes do Vaticano, a Igreja Católica “clandestina” conta mais de 8 milhões de fiéis, que são obrigados a celebrar missas em segredo, nas suas casas, sob o risco de serem presos.

Aquando da realização em Pequim dos Jogos Olímpicos, no Verão de 2008, foi levantada a hipótese de uma visita de Bento XVI à China. O desejo foi expresso pelo bispo de Pequim que, em entrevista à televisão italiana RAI, afirmou que os católicos chineses amam e respeitam o Papa, reconhecem a sua autoridade e ficariam felizes em encontrá-lo. Contudo, esta é uma ambição “prematura”. Segundo referiu na altura o porta-voz do Vaticano, padre Frederico Lombardi, um eventual convite poderia ser sinal de disponibilidade por parte da China. No entanto, há ainda muitos problemas importantes que não foram resolvidos.

O padre Lombardi garantiu ainda que a Santa Sé tem a intenção e a vontade de continuar a levar por diante um diálogo leal e construtivo.

 

Carta do Papa à China deixa apelo à unidade dos católicos chineses

Em Junho de 2007, Bento XVI surpreende o mundo ao escrever uma carta dirigida à Igreja Católica que vive na China. Numa altura em que a Santa Sé procura reactivar as relações com a República Popular da China, Bento XVI dirige-se aos cristãos das duas Igrejas – oficial, obediente ao regime, e perseguida, obediente a Roma – na tentativa de aproximar cada vez mais as ‘duas’ Igrejas.

No documento “Carta do Santo Padre Bento XVI aos bispos, aos presbíteros, às pessoas consagradas e aos fiéis leigos da Igreja Católica na República Popular da China”, o Papa sublinha que não quer provocar interferências em assuntos políticos, assegurando, por outro lado, a disponibilidade da Igreja para o diálogo com as autoridades civis. Contudo, Bento XVI lembra que “a Igreja na China está chamada a viver e a manifestar a unidade”, numa “mais rica espiritualidade de comunhão”.
A carta papal reconhece a “situação de fortes contrastes que afectam os leigos e pastores”, devido, sobretudo, à Associação Patriótica Católica Chinesa, um organismo criado pelas autoridades comunistas que não reconhece o papel do Papa. “A pretensão de alguns organismos criados pelo Estado e alheios à estrutura da Igreja de se colocar acima dos próprios bispos e de guiar a vida da comunidade eclesial não corresponde à doutrina católica”, sublinha.
Sobre as ordenações de bispos sem o reconhecimento do Vaticano, “cujo número é muito reduzido”, o Papa declara que estes bispos são “ilegítimos, ainda que estejam validamente ordenados”, promovendo um acordo com o governo chinês para resolver algumas questões ligadas à nomeação de bispos, apontando que cada caso deve ser analisado individualmente.
O documento conclui oferecendo orientações de vida pastoral à Igreja na China, em particular sobre a importância da família, recordando ainda que todos os católicos chineses são missionários.

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