Todos os meses cerca de 5 mil pessoas procuram fugir da Eritreia. Este é o país de África de onde saem mais refugiados rumo à Europa. Fogem de quê? Da repressão, da violência e da pobreza. No último relatório da Fundação AIS sobre a Liberdade Religiosa no Mundo denuncia-se que pelo menos 3 mil cristãos estão presos neste país por causa da sua fé.
A Eritreia é um dos países mais pobres do mundo. Mas também é um dos mais perigosos. Todos os meses, segundo as Nações Unidas, cerca de 5 mil pessoas, normalmente homens e rapazes, fogem da Eritreia. Na verdade, fogem de um pesadelo. O serviço militar, por exemplo, é obrigatório e pode durar tempo indefinido. É uma ameaça que paira na vida de todos. De facto, o serviço militar é quase como uma sentença de prisão. É um exemplo do poder arbitrário que o Estado exerce sobre os cidadãos. Neste país extremamente pobre falta quase tudo: até a verdadeira liberdade de culto. No último relatório da Fundação AIS sobre a Liberdade Religiosa no Mundo denuncia-se que pelo menos 3 mil cristãos estão presos por causa da sua fé. Este é um dos países que figuram no “quadro negro” da perseguição religiosa cuja situação se agravou ainda mais ao longo dos últimos dois anos. Como se fosse possível ser ainda pior…
Viver numa ditadura
Nunca se realizaram eleições na Eritreia, que ganhou a sua independência em 1993 à vizinha Etiópia após uma guerra de décadas. Uma guerra que, na verdade, nunca acabou na mentalidade opressora do Governo de Asmara. Daí a obrigatoriedade de incorporação nas fileiras militares, que pode durar anos a fio, quase sem limite de tempo. Essa é uma das razões por que fogem tantos jovens da Eritreia. Muitos ambicionam uma vida melhor, mais desafogada, livre, mas acabam nas mãos de redes de traficantes. Muitos saem da Eritreia com um sonho e acabam em campos de refugiados, em países junto à fronteira, com as vidas desfeitas, com esses sonhos transformados em lágrimas. A vida na Eritreia é muito difícil. O salário médio normalmente ronda os 50 euros por mês. Apenas. No entanto, 1 litro de óleo ou meio quilo de massa chegam a custar 6 euros. Sobreviver é extremamente difícil.
Lei do silêncio
O Padre Andrzej Halemba, responsável pelos projectos no Médio Oriente da Fundação AIS, conseguiu, recentemente, o visto das autoridades para visitar a Eritreia. A Igreja Católica é uma das quatro comunidades religiosas reconhecidas pelo Estado. Mas, apesar disso, há um enorme controlo das autoridades, estando os padres e bispos proibidos, por exemplo, de comentarem assuntos políticos e a própria Igreja está como que obrigada a auto-sustentar-se, pois não pode receber quaisquer fundos provenientes do estrangeiro. É neste ambiente policiado que se têm de ler as palavras prudentes do Padre Halemba. “A Eritreia está sedenta de Deus”, diz ele. “Posso afirmar que a determinação e espiritualidade deste povo, a sua ânsia pela Bíblia, são de facto impressionantes.” Apesar da enorme pobreza em que a esmagadora maioria da população se encontra, o Padre Halemba testemunhou que “as pessoas lêem qualquer coisa relacionada com a religião”.
Novas vocações
O ambiente fechado e a perseguição religiosa que se abate também contra os Cristãos, têm sido sementes, porém, de novas vocações. “Há muitas vocações, tanto para o sacerdócio como para a vida religiosa”, constata o Padre Halemba, acrescentando, por isso, que “o Cristianismo está a conseguir sobreviver a estes tempos difíceis”. O trabalho na área social é exemplo desse dinamismo. “A Igreja Católica é a única organização religiosa no país, cuidando de jardins-de-infância, escolas... além de dar apoio de diferentes modos à promoção da mulher, dando-lhes ferramentas para serem independentes. Esse é um trabalho muito marcante da Igreja porque, como é sabido – acrescenta este responsável da AIS –, muitos homens de meia-idade estão no exército e por essa razão as mulheres têm que cuidar sozinhas de toda a família. A Igreja Católica reconhece essa necessidade e está a tentar lidar com o problema, melhorando meticulosamente os cursos de higiene, culinária, bordados, costura e outros.” Apesar das perseguições, apesar dos cerca de 3 mil cristãos que se encontram detidos, os seminários continuam a acolher novos jovens em busca de uma vida de entrega a Deus e de serviço aos outros. O Padre Halemba afirmou mesmo que a constatação dessa realidade foi um dos “momentos mais emocionantes” da sua viagem à Eritreia. “É bom ver como muitas pessoas procuram ser catequistas ou ensinar a religião. Não é para eles somente uma fonte de sustento, mas uma vocação.” Quase isolados do resto do mundo, os padres e as irmãs que trabalham na Eritreia são, assim, um exemplo para todos nós.
Pedidos de ajuda
Um exemplo que se estende aos quatro bispos eritreus que, ainda há dois anos, em Junho, quando o país assinalou o 23º aniversário da sua independência, publicaram corajosamente uma carta pastoral – “onde está o teu irmão?” – em que condenaram o êxodo em massa dos jovens e criticaram a falta de liberdade religiosa no país. O mundo tem-se sobressaltado e indignado com os milhares de refugiados que buscam a Europa, tantas vezes em aventuras que terminam tragicamente nas águas do Mediterrâneo. Depois dos sírios – país em guerra civil desde há cinco anos – são os Eritreus a segunda nacionalidade mais comum a chegar à costa italiana. Fogem da prisão, da tortura, da pobreza e da perseguição. Fogem de um país que foi classificado como a “Coreia do Norte de África”. Fogem do medo e da morte. Quase ninguém fala deles, como se não existissem, como se fossem um povo fantasma. Eles pedem-nos ajuda. Pedem, pelo menos, para não serem esquecidos. Pedem, pelo menos, as nossas orações.
Pedro Vaz Patto
Impressiona como foi festejada a aprovação, por larga e transversal maioria de deputados e senadores,...
ver [+]
|
Guilherme d'Oliveira Martins
Há anos, Umberto Eco perguntava: o que faria Tomás de Aquino se vivesse nos dias de hoje? Aperceber-se-ia...
ver [+]
|
Pedro Vaz Patto
Já lá vai o tempo em que por muitos cantos das nossas cidades e vilas se viam bandeiras azuis e amarelas...
ver [+]
|
Guilherme d'Oliveira Martins
Vivemos um tempo de grande angústia e incerteza. As guerras multiplicam-se e os sinais de intolerância são cada vez mais evidentes.
ver [+]
|