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P. Manuel Barbosa, scj
Aí está o Deus connosco!

Escrevo em quarto domingo do Advento, em que recebemos o jubiloso convite a acolher o Deus connosco. Recebereis estas notas no próximo domingo de Natal, dia com sublime apelo a celebrar o Verbo de Deus que vem morar entre nós.

Sabemos que tudo isso é permanente, pois a nossa vida cristã não é de episódios desfasados e preceituais repetições, embora por vezes façamos dela uma itinerância com interrupções. Todos os anos celebramos e vivenciamos este mistério, em renovada alegria e fecunda esperança.

Na solenidade do Natal encontramo-nos com Deus que vem ao nosso coração, disponíveis para acolher o seu abraço de amor. Muitas vezes, porém, vemos, e até colaboramos, no natal pagão do consumismo e do desperdício, das prendas obrigatórias e nem sempre sentidas, de tantos ritos e simbólicas que nos afastam do essencial. Refeições melhoradas em famílias e em comunidades, e cada vez mais em escolas e empresas, assim como o respeito pelas tradições familiares deveriam ser sinais humanos de união e paz nesta altura e ao longo de todo o ano; e para os cristãos, sempre ao redor do Deus que habita em nós e entre nós.

Contudo, estas azáfamas e correrias nem sempre, acho que até cada vez menos, confluem no acontecimento que se vive. As interrogações atingem-nos particularmente a nós cristãos, como leigos, padres, bispos ou consagrados. Celebramos o Natal, preparado no nosso coração à maneira pagã ou como verdadeiro encontro com Deus libertador, cuja proposta de salvação devemos escutar, acolher e anunciar? Entramos nas ondas do esbanjamento, da opulência e do desperdício, cometendo autênticos atentados e pecados a tantos pobres e excluídos de bens essenciais para viver ou sobreviver? E se calhar fazemos isso olhando para a simplicidade e a pobreza do presépio… Ou vivemos e promovemos, de modo autêntico, simples e alegre, solidariedade, serenidade e paz?

O «Deus connosco» não nos deixa alternativa. As figuras de Maria e de José aí estão para nos apelar ao olhar centrado em Jesus, à essência das coisas para quem prepara mesmo o Natal como deve ser: escutar os apelos de Deus, responder com um sim de disponibilidade total.

O «Deus connosco» está sempre a dar-nos sinais quotidianos. Não precisamos de correr atrás do extraordinário, pois Deus anda no nosso quotidiano, o Verbo está a morar entre nós, nas nossas famílias, nas nossas comunidades cristãs e religiosas. Percebemos mesmo isso e guardamos no nosso coração, como fez Maria? Se assim é, não há estorvos que possam arredar-nos do caminho que vale, que é andar com o Emanuel, o «Deus connosco».

O início da Carta aos Romanos, «magna carta do amor de Deus», que escutamos neste último domingo do Advento, saúda os «chamados por Jesus Cristo, todos os amados por Deus e chamados a serem santos, na graça e na paz de Deus nosso Pai e do Senhor Jesus Cristo». Que melhor convite podemos ter para acolher o Deus connosco, o «amor de Deus derramado nos nossos corações», como diz Paulo noutra passagem da mesma Carta? Se Deus mora no nosso coração, só podemos levar uma vida de graça e de paz, só podemos andar em caminhos de amor e de santidade. O convite é para todos, sem exceção nem aceção, e não apenas para alguns eleitos, como se pregou e assumiu ao longo de tantos séculos.

Já agora, a «Constituição sinodal de Lisboa», que o nosso Patriarca nos ofereceu a 8 de dezembro, fruto de dois anos de reflexão e oração a confluir na assembleia sinodal, pode bem ser recebida nas essenciais tonalidades que o Natal nos traz. Do mesmo modo, a preparação do «Centenário das aparições de Nossa Senhora», em Fátima, insere-se neste dinamismo de santidade e graça, de esperança e paz. Tudo a brotar do amor de Deus como marca das nossas existências peregrinas.

Santo e feliz Natal, com todo o nosso ser centrado no «Deus connosco», que aí está e assim permanecerá!