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Síria: quando o fim da guerra é a prenda mais desejada
Os olhos tristes de Magda
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São rapazes e raparigas que praticamente não sabem o que é viver em paz. São rapazes e raparigas de Alepo. São crianças apenas. Recentemente, a Fundação AIS organizou uma videoconferência para que algumas destas crianças pudessem dizer, de viva voz, a dirigentes do Parlamento Europeu, como é a vida nesta cidade mártir da Síria. Quais são os seus medos e sonhos. Neste Natal, há crianças que não querem brinquedos nem guloseimas. Apenas paz.

 

Quanto valem as palavras de uma menina de 10 anos? Ou de um rapaz de 12? Recentemente, no início de Dezembro, a Fundação AIS organizou uma videoconferência entre um grupo de crianças de Alepo, a cidade síria que tem sido palco de uma das mais ferozes batalhas na guerra civil que grassa neste país, e alguns altos dirigentes do Parlamento Europeu. Diane, Magda e Pir foram algumas das crianças que testemunharam como tem sido a vida no meio desta guerra, como é tão urgente a paz e como têm pedido, têm rezado, para que Alepo volte a ser uma cidade bonita, cheia de luz e de vida. Estas crianças falaram para Bruxelas mas, na verdade, as suas palavras são gritos de ajuda dirigidos a todos nós. E que dizem elas?

 

A história de Diane

Diane tem 10 anos. Tinha apenas seis quando se começaram a escutar os primeiros bombardeamentos, quando se ouviu pela primeira vez o silvo das balas, o desmoronar dos prédios, os gritos de dor em Alepo. Apesar de toda a violência que presenciou, não se nota nenhum sinal de ódio ou de vingança nas suas palavras. Apenas deseja viver em paz. Ela fez um desenho e descreve o que esteve a pintar. “Bom dia, chamo-me Diane. Saúdo-vos de todo o coração. Tenho 10 anos e cresci durante a guerra, o que me impediu infelizmente de viver uma infância doce e normal. Espero que Jesus nos proteja, para vivermos em Paz e que possamos ver o lindo sorriso de todas as crianças. Neste desenho, fiz uma ambulância que transporta os feridos e também os mortos. Foram atingidos por um míssil lançado pelos terroristas para matar os civis que não têm com que se defender. Há lojas e prédios destruídos, e os vidros partidos. Esta menina está a chorar porque a mãe perdeu uma perna, foi amputada. Como não podemos perder a esperança, desenhei uma pequena planta verde que indica a esperança, enquanto esperamos que chegue a Paz. Muito Obrigada.”

 

Situação dramática

Em Alepo, a videoconferência foi organizada por um grupo de sacerdotes e de irmãs cujo trabalho tem sido apoiado pela Fundação AIS. Também eles deram o seu testemunho de como têm sido trágicos estes dias, estas semanas e meses, estes anos de guerra. Birgitta Maourka é polaca e pertence à congregação das Franciscanas Missionárias de Maria. Birgitta diz-se “muito feliz” por poder estar ali, em Alepo, com aquele “povo tão sofredor, precisamente neste momento tão difícil”. Tal como as crianças, as suas palavras não escondem a tragédia de um quotidiano que se transformou numa armadilha de onde ninguém consegue sair ileso. “As famílias vivem uma situação dramática ao nível económico, com a carestia de vida, e ao nível de segurança, com as crianças que vão à escola e não sabem se voltam para casa, e os pais que levam os filhos à escola, vão trabalhar e quando regressam no final do dia não sabem se encontrarão a casa de pé, com os mísseis que caem por todos os lados, causando tantos mortos e tantos feridos. É toda uma geração de crianças que não conhece outra vida, que nasceu durante a guerra.”

 

Guerra “doida e feia”

Uma dessas crianças que não conhece outra vida é Pir. Tal como Diane, tem 10 anos. Tal como ela, já não se lembra de como era a cidade antes da destruição, nem se recorda dos tempos em que brincava na rua com os seus amigos. Agora, diz-nos, tem medo até de andar de bicicleta por causa da guerra “doida e feia” que lhe destruiu a infância. “Cresci durante esta guerra feia. Esta guerra feia roubou-me muitas coisas. Impediu-me a mim e a muitas outras crianças de ser como as outras crianças do mundo. Por exemplo, tenho medo de andar de bicicleta porque o medo e a destruição dominam a minha cidade. Espero que esta guerra doida e feia acabe para chorarmos a nossa infância perdida… por favor!” Todas estas crianças sonham ainda com um tempo de paz, com uma cidade intacta, com vidas normais. É o caso de Magda. “Sou uma menina de Alepo”, diz de si própria, escondendo a idade. As suas palavras, tal como as das outras crianças, deveriam ser ouvidas uma e outra vez por todos os responsáveis por esta guerra, pelos soldados que vão disparar uma vez mais as suas metralhadoras, por todos aqueles que vão ordenar mais um bombardeamento. Por todos aqueles que olham para esta e todas as guerras no mundo e contabilizam apenas mortos e feridos e conseguem falar em vitórias ou derrotas sem se importarem verdadeiramente com o sofrimento concreto de cada uma dessas pessoas, de cada uma dessas vítimas.

 

“Peço a Deus…”

Magda é apenas uma menina de Alepo. “Estou triste por causa da guerra. A maior parte dos meus amigos foram-se embora, estão feridos ou mortos. Desejo e peço a Deus que esta guerra acabe e que a Paz fique nos nossos corações e nas nossas casas.” Esta videoconferência aconteceu no início de Dezembro. Faltava quase um mês para o Natal. Em Alepo, o tempo tem um ritual muito próprio. É mais precioso. Uma hora ou um dia valem muito mais do que apenas sessenta minutos ou vinte e quatro horas, pois podem significar também mais uma hora ou um dia de vida. Desde então, desde que se realizou a videoconferência, a guerra continuou, reclamando mais vidas, mais sofrimento. Mais lágrimas. E isso dá ainda mais dramatismo às palavras, aos pedidos destas crianças. Neste Natal, em Alepo, Diane, Magda e Pir não pedem brinquedos nem guloseimas. Pedem apenas paz. E dizem-no de verdade. Rezam-no todos os dias.

texto por Paulo Aido, Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
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