Mundo |
Nigéria: o regresso a casa após 30 meses de cativeiro
Lágrimas felizes
<<
1/
>>
Imagem

Outubro. Asabe mal queria acreditar que ia ser libertada. Durante 30 meses viveu num sufoco permanente às mãos dos terroristas do Boko Haram depois de ter sido sequestrada em Chibok, em Abril de 2014. A sua história e a das outras 276 raparigas raptadas como ela de uma escola cristã correu mundo. Ela foi libertada mas, infelizmente, para muitos outros nigerianos, a vida continua uma verdadeira prisão. E ninguém fala disso.

 

Na vila de Chibok não é possível esquecer o dia 14 de Abril de 2014 quando um grupo de terroristas do Boko Haram assaltou a escola cristã e sequestrou 276 raparigas. Foi como que o fim do mundo para todas elas. De repente, de um dia para o outro, estavam ali, nas mãos de homens armados, no meio da floresta, longe da família. Sozinhas. Asabe Goni era uma delas. Com o passar do tempo, dos dias, das semanas, Asabe foi perdendo a esperança de que alguma vez iria regressar a casa, à família, aos amigos, aos tempos onde tinha sido feliz. Quando soube, em Outubro, que ia ser libertada, nem queria acreditar que o pesadelo estava a chegar ao fim. Mas não era um sonho. Asabe foi libertada graças a negociações conduzidas pelo governo nigeriano e a Cruz Vermelha Internacional.

 

Regresso a casa

O reencontro com a família foi emotivo, cheio de lágrimas, de risos, de gargalhadas, de festas e de silêncios. Para Asabe Goni, os mil dias que passou no cativeiro são para esquecer, são um tempo que não quer recordar. Regressar a casa foi a melhor prenda que alguma vez poderia imaginar. Estar ali, com os pais, os irmãos, os amigos, voltar à igreja, foi um verdadeiro milagre. Nas poucas palavras que disse sobre o tempo de cativeiro, Asabe contou que já tinha “perdido a esperança” de voltar a casa. Perder a esperança é o princípio da derrota. Provavelmente, Asabe nunca mais vai conseguir esquecer as amigas que foram forçadas a casar com os homens do Boko Haram. Algumas até engravidaram. Ela só ia pensando no dia em que seria a sua vez. Todas foram obrigadas a decorar o Corão, todas foram obrigadas a dizer que renunciavam a Jesus, todas foram violentadas física ou mentalmente. Todas foram escravizadas.

 

Números trágicos

Asabe Goni foi libertada porque estava muito doente. Apenas por causa disso. Era já um estorvo para os islamitas do Boko Haram. Quando lhe disseram que ia partir, julgou que estaria a sonhar, mas depressa percebeu que o cativeiro estava mesmo a terminar. Mas não era para todas. A maior parte das outras raparigas de Chibok iriam continuar ali, na floresta, nas mãos dos homens do Boko Haram. A história destas meninas, destas raparigas, é apenas um exemplo da tragédia maior por que têm passado os cristãos da Nigéria. Desde 2009, quando começaram os ataques do Boko Haram, pelo menos 20 mil pessoas foram mortas e quase três milhões foram forçados a fugir das suas casas no que é considerada como uma das maiores crises humanitárias africanas dos tempos modernos.

 

Ódio religioso

Infelizmente, para muitos outros nigerianos, para muitos outros cristãos, a vida continua uma verdadeira prisão. E uma das maiores tragédias é que quase ninguém fala disso. Quase ninguém fala deles. Segundo D. Joseph Bagobiri, da diocese de Kafanchan, além do terrorismo do Boko Haram as populações têm sido também vítimas da violência dos Fulani, um grupo de pastores nómadas, quase desconhecido no Ocidente, mas que têm levado o horror a vilas e aldeias, destruindo tudo à sua passagem. “Só desde Setembro – diz este prelado à Fundação AIS – 53 aldeias foram queimadas, 808 pessoas assassinadas, 57 feridos, 1422 casas e 16 igrejas destruídas.” Só desde Setembro. Inicialmente, os Fulani eram um grupo de pastores nómadas que mantinham algum conflito com os agricultores da região. Nos últimos tempos, porém, tudo parece ter mudado. As armas artesanais que usavam foram substituídas por metralhadoras e parece haver um plano de ataque às comunidades cristãs, um plano de quem junta o ódio religioso, como o Boko Haram, aos que ambicionam as suas terras e propriedades. Como diz o Bispo Bagobiri à Fundação AIS, “ambos os motivos estão presentes, mas cada vez mais o aspecto religioso tem predominado e transformou-se em perseguição religiosa”.

 

Não esquecer

Asabe foi agora libertada do jugo do Boko Haram mas, provavelmente, nunca mais deixará de se sentir escravizada depois de tudo o que passou durante os quase mil dias na floresta às mãos dos terroristas. Ela foi libertada e as suas lágrimas foram, por isso, de felicidade. Mas quantas pessoas haverá ainda na Nigéria que vivem subjugadas pelo medo apenas por serem cristãs e de quem ninguém fala? Sábado à noite. Uma rapariga de apenas 10 anos aproximou-se de uma multidão que se encontrava junto a um vendedor de comida durante a noite da passagem do ano e fez-se explodir causando vários feridos em Maiduguri, no nordeste da Nigéria. A rapariga morreu instantaneamente. Para muitos nigerianos, para muitos cristãos, a vida neste país é assim, um medo constante. Uma prisão. Eles precisam da nossa ajuda, das nossas orações. Eles precisam de saber que não estão sós. Que podem contar connosco. Que podem contar consigo.

texto por Paulo Aido, Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
A OPINIÃO DE
Guilherme d'Oliveira Martins
Quando Jean Lacroix fala da força e das fraquezas da família alerta-nos para a necessidade de não considerar...
ver [+]

Tony Neves
É um título para encher os olhos e provocar apetite de leitura! Mas é verdade. Depois de ver do ar parte do Congo verde, aterrei em Brazzaville.
ver [+]

Tony Neves
O Gabão acolheu-me de braços e coração abertos, numa visita que foi estreia absoluta neste país da África central.
ver [+]

Pedro Vaz Patto
Impressiona como foi festejada a aprovação, por larga e transversal maioria de deputados e senadores,...
ver [+]

Visite a página online
do Patriarcado de Lisboa
EDIÇÕES ANTERIORES