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Iraque: cristãos vivem entre o medo e a esperança
A grande conspiração
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Passaram sete anos, mas para Linda Sabah foi como se tivesse sido há momentos, como se tivesse sido agora. Há imagens, recordações que nunca se esquecem. Há sete anos, Linda estava na Catedral de Bagdade quando um comando terrorista desferiu um dos mais cruéis ataques de que há memória…

31 de Outubro de 2010. Catedral de Nossa Senhora da Salvação, em Bagdade. Linda Sabah estava grávida. A Missa do Dia de Todos os Santos já tinha começado há muito. A Igreja estava cheia de fiéis que rezavam o Pai Nosso. De súbito, escuta-se um enorme estrondo e tiros. “Subitamente, vi-os entrar e matar o Padre Nasim com um tiro no pescoço. Fiquei em choque ao assistir. Nunca tinha presenciado um assassinato. O terrorista apontou uma arma à minha cabeça e disse-me para avançar…”. Foram momentos de terror que Linda nunca mais poderá esquecer.

 

“Comecei a rezar…”

A seu lado estava também a filha, Cristina, que lhe pediu para não se assustar, “por causa da bebé”. Os tiros sucedem-se. Há pessoas deitadas no chão, escutam-se gritos. “Caí no chão e várias pessoas se deitaram por cima de mim para me proteger, pois estava grávida de Katerina. Dispararam novamente. As senhoras que se tinham deitado sobre mim morreram. Olhei para Cristina mas ela morreu logo. Comecei a rezar…”. Linda Sabah sobreviveu a este ataque que vitimou mais de meia centena de pessoas, num dos actos mais bárbaros contra os Cristãos na história recente do Iraque.

 

Sentimento de medo

Passaram quase sete anos. A violência continuou. Desde então, milhares de pessoas perderam a vida. Aldeias, vilas e cidades foram ocupadas pelos jihadistas, que trouxeram sempre consigo histórias de subjugação, de terror e de morte. Nos últimos tempos, porém, as coisas parecem estar a mudar um pouco. No entanto, apesar das derrotas constantes que os jihadistas têm vindo a sofrer – com a reconquista, por exemplo, da cidade de Mossul, nas mãos dos terroristas, desde 2014 – ninguém ignora o sentimento de medo que se vive no Iraque. O que se compreende. Afinal, continua a ser raro o dia em que não há notícia de atentados, explosões, mortos e feridos. Na verdade, ninguém se sente verdadeiramente seguro em lugar algum. Nem na capital.

 

“Só nos apetece chorar…”

2017. Igreja de Santo André. D. Shlemon Warduni, Bispo auxiliar do Patriarcado dos Caldeus da Babilónia, conhece bem esta igreja de Bagdade. “Era uma igreja paroquial. Havia mais de 200 famílias. Agora acho que há talvez dez famílias ou menos. Era um lugar lindo. Agora não há nada…” A comunidade cristã vive desassossegada há muito tempo. “Só nos apetece chorar”, diz o bispo. “O Cristianismo está aqui desde há 2 mil anos, desde o Apóstolo São Tomás. E agora querem expulsar-nos das nossas aldeias, casas e igrejas”. Para muitos cristãos, que perderam tudo o que tinham na ofensiva jihadista de Agosto de 2014 – especialmente os que viviam na Planície de Nínive – o futuro é agora um lugar incerto. A maior parte desta comunidade teve de fugir para a região de Erbil, onde a Fundação AIS lançou uma gigantesca campanha de ajuda humanitária. Ainda estão registadas por lá cerca de 14 mil famílias, ou seja, aproximadamente 90 mil pessoas.

 

Futuro incerto

O regresso a casa para estes cristãos significa reabrir feridas insuportáveis. Mas ficar em Erbil é aceitar o exílio no próprio país. Na Planície de Nínive, a Fundação AIS, juntamente com outras organizações, está profundamente empenhada na reconstrução dos povoados cristãos. Isso é essencial para que o regresso a casa seja possível. Mas essa reconstrução é uma tarefa gigantesca que só será possível com a generosidade dos benfeitores e amigos da Fundação AIS. Como diz o Patriarca D. Louis Sako, que já esteve em Portugal a convite da Fundação AIS, “o futuro é incerto e isso é psicologicamente muito pesado para as pessoas”.

 

Grande perigo

Sempre que Linda Sabah olha para a sua filha, Katerina, agora quase a fazer sete anos, lembra-se da sua outra filha, Cristina, assassinada a tiro, a seu lado, na Catedral de Nossa Senhora da Salvação, em Bagdade, e do rosto das mulheres que se atiraram para cima de si, protegendo-a e ao bebé que trazia consigo. Todas elas morreram, todas elas foram também assassinadas. A história de Linda Sabah é também a história de todos os cristãos iraquianos, que vivem entre o medo e a esperança. D. Shlemon Warduni não tem dúvidas de que muito se está a decidir nesta região do globo. “Há uma grande conspiração contra os Cristãos no Médio Oriente. Foi aqui que o Cristianismo começou há 2 mil anos e cortá-lo pela raiz é um grande perigo. Temos uma história de muitos milhares de anos e se agora cortamos a raiz, onde estamos e de onde somos, perdemos as referências.” Os Cristãos iraquianos precisam da nossa ajuda, da nossa solidariedade, das nossas orações. Eles precisam de saber que não estão sós. Que não foram – e nunca serão – abandonados.

texto por Paulo Aido, Fundação Ajuda à Igreja que Sofre
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