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Cónego José Traquina, pároco de Nossa Senhora do Amparo de Benfica: ?Uma ?igreja na cidade? a fazer o bem? sempre?
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É uma das paróquias de Lisboa com maior número de população. A paróquia de Nossa Senhora do Amparo de Benfica comemora os 200 anos da igreja paroquial e o pároco, cónego José Traquina, considera que “Benfica cresceu a olhar para a igreja”. Encara a caridade e o acolhimento como evangelizadores e vê a pastoral juvenil como o grande desafio da Igreja.

A igreja paroquial de Nossa Senhora do Amparo de Benfica comemora este anos os 200 anos. Qual deverá ser a missão concreta de uma paróquia urbana?

A paróquia urbana é uma paróquia que tem a possibilidade de uma maior convergência das pessoas em volta do espaço onde elas se reúnem, a igreja. Esta é a grande diferença entre uma paróquia urbana e uma rural. No caso da paróquia de Nossa Senhora do Amparo de Benfica, de facto, o grande espaço de convergência é a igreja paroquial – temos ainda um outro espaço, onde as pessoas se reúnem, que é a capela de Nossa Senhora das Descobertas, dentro do centro comercial Colombo. Este espaço da igreja paroquial existe há 200 anos e corresponde à experiência de crescimento do próprio bairro, desta zona de Lisboa que é Benfica. É um local que foi crescendo a olhar para a igreja. De facto, a igreja paroquial de Nossa Senhora do Amparo de Benfica tem uma presença histórica, que está associada às pessoas que aqui vivem! É uma igreja que as pessoas gostam, estimam, amam! É um espaço com uma dimensão de acolhimento para a oração, para o silêncio, para as celebrações. E aqui entra a dimensão da comunidade! Não é só a beleza do espaço, mas a dimensão da comunidade humana que se une e reúne neste espaço celebrativo que é a igreja. Esta ‘igreja na cidade’ é então o espaço humano onde as pessoas são conhecidas, conhecem-se pelo seu nome, tratam-se por irmãos e sentem-se bem neste espaço que consideram seu. No fundo, a força e a graça da comunidade cristã, ligada à igreja paroquial, humaniza e ajuda a humanizar.

 

Na Carta Pastoral do Cardeal-Patriarca de Lisboa “A Igreja na Cidade”, de 2005, D. José Policarpo pede um diálogo constante com a cidade. Numa sociedade cada vez mais laicizada, como poderá a Igreja ser fonte de esperança na cidade?

A Igreja nasceu com Jesus, que a acompanha ao longo dos tempos. A todos! Não só aos sacerdotes, mas a todos os cristãos, que são as pedras vivas e a presença de Cristo ressuscitado! A esperança que têm estas comunidades é a de descobrirem uma vida que faz sentido. Vivem os mesmos problemas que as outras pessoas, mas descobriram na sua vida uma luz que faz com que a sua vida tenha sentido. E isso celebram-no e partilham-no em comunidade. E partilham em comunidade mesmo com aqueles que porventura não acreditam.

Mas reconheçamos também o sentido de missão que está ligado à comunidade e ao espaço da comunidade que é a igreja. A nossa igreja paroquial está aberta ao público 12 horas por dia: das 8 às 20 horas. É um esforço enorme para o conseguirmos. No conjunto de uma cidade como a de Lisboa – onde graças a Deus muitas igrejas estão abertas e são espaços lindos, com arte, com beleza, onde a pessoa entra e está o tempo que quiser a rezar, a ler, a meditar –, a igreja é um espaço onde a pessoa se refaz! A Igreja Diocesana, identificada nas igrejas paroquiais, oferece um espaço de silêncio, de abertura, de acolhimento, de onde as pessoas podem sair com mais paz do que quando entraram. Este é um bem que a Igreja faz à comunidade num sentido mais alargado, que corresponde à missão e evangelização, que é o saber acolher!

 

A liturgia é também uma preocupação constante da Igreja. Segundo a Constituição Conciliar ‘Sacrosanctum Concilium’, de 1963, “a liturgia é o vértice para o qual tende a actividade da Igreja e, ao mesmo tempo, a fonte de onde dimana toda a sua força”. Como é que as paróquias podem sensibilizar os cristãos para a liturgia?

Estou convencido que nesta paróquia de Benfica estamos numa comunidade paroquial onde a celebração da Eucaristia é muito valorizada pelos fiéis. A prática cristã é grande, não só ao sábado e domingo – onde temos onze missas dominicais –, mas também nas quatro celebrações diárias. Estamos numa zona residencial, é claro, mas a presença na Eucaristia mostra uma sensibilidade à Igreja, que encontra naquela celebração a sua fonte. A grande animação de vida dos cristãos e a sua identificação encontra-se na celebração da Eucaristia!

Estou convencido que a larga maioria das pessoas que entram na igreja têm sensibilidade para a celebração da Eucaristia e reconhecem que ali está o vértice de toda a Igreja. Agora, isso não nos deve descansar em termos de educação, porque há sempre algumas pessoas que não estão educadas. Por exemplo, por vezes está uma missa a decorrer e há pessoas que insistem em colocar uma velinha, outras que procuram rezar à esquerda ou à direita para um determinado santo… O problemas é que há sempre gente que quer resolver individualmente a sua dimensão de fé! É a dimensão comunitária da fé que dá espaço para a afirmação individual, que tem outros momentos, mas há espaços que são comuns e esses têm que ser absolutamente respeitados. A meu ver, a reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, que trouxe à liturgia a língua portuguesa, foi uma vantagem muito grande para as pessoas participarem.

 

A crise económica e financeira fez com que a paróquia tivesse de aumentar a sua acção sócio-caritativa, criando novas valências de apoio aos mais carenciados como o Refeitório Nossa Senhora do Amparo. É a ousadia da caridade não sua forma mais pura, concorda?

Esta paróquia tem uma tradição de anos na organização da partilha. E como tal, quando surgiu esta dificuldade da crise, e também no contexto do projecto diocesano ‘Igreja Solidária’, conseguimos criar este refeitório que proporciona refeições diárias, até um máximo de vinte pessoas. Temos também apoio em alimentos a famílias em dificuldades, feito através de um grupo de pessoas voluntárias do centro social paroquial. Neste caso, não é apenas distribuído o que vem do Banco Alimentar, mas também o que em termos da paróquia vamos recolhendo. E nesta área entram não só os jovens, mas também os escuteiros mais antigos, da Fraternidade de Nuno Álvares. Todos os meses, 65 famílias recebem alimentos dados pela paróquia de Benfica! O que é uma coisa espantosa de generosidade!

 

A caridade é evangelizadora?

A caridade é não só evangelizadora, como é também o grande testemunho da Igreja. Ao longo dos anos, esta paróquia tem tido gestos continuados desse testemunho! A comunidade organizada faz com que as pessoas tragam os bens alimentares para a paróquia e os serviços os entreguem em nome da comunidade. A dádiva é algo que toca muito com o Evangelho!

 

A este propósito, fala-se muito em ter uma Igreja menos “clerical”, reforçando dessa forma o papel dos leigos. É a tal intervenção dos leigos…

É verdade! As pessoas são muito generosas! O laicado de Benfica é muito interventivo, apresenta muitos projectos e ideias novas. Obviamente eu tenho de estar ao corrente e ter conhecimento das iniciativas para presidir à caridade e à comunhão, mas dou-lhes muita força. Também aqui é preciso sensibilidade e uma educação, porque a pessoa tem tendência a ser individualista. Temos de sensibilizar as gerações pelo gosto e a alegria de dar.

 

Numa carta por ocasião do início do Ano Sacerdotal, D. José Policarpo pediu a realização de actividades específicas para crianças e jovens e a dinamização da pastoral vocacional. Que trabalho tem sido possível realizar com os jovens de Benfica?

A pastoral juvenil, e também vocacional, é nesta altura a mais desafiante. Penso que não é só na paróquia de Benfica mas em toda a Igreja. É um grande desafio porque as gerações mudam muito, os gostos dos jovens mudam muito e a certa altura os animadores de jovens ficam com dificuldade em acompanhar as crianças que de repente ficam jovens! Mas não podemos desistir desta pastoral! Da nossa parte, mereceu uma resposta ao desafio que o senhor Patriarca fez à catequese e reformulámos a catequese de Benfica, fazendo com que o crisma seja feito mais cedo. Isso vai permitir repensar uma pastoral juvenil mais cedo, para não estarmos num ritmo catequético normal com os jovens, quando eles gostam é de fazer outras coisas… Por isso, precisamos de dar espaço para novas actividades e temos também de ter gente preparada para os novos desafios com a juventude.

No que diz respeito a vocações, é uma preocupação. Da paróquia de Benfica temos apenas um jovem de 15 anos que está no Pré-Seminário. Mas acredito que outros poderão descobrir esta alegria de partilhar com jovens os seus horizontes. Esta é também uma área de sensibilização junto dos mais novos. A Igreja tem de dar a conhecer os seus espaços juvenis.

 

Durante o último Conselho Presbiteral foi sugerida uma reestruturação pastoral. Como vê o futuro das paróquias e das comunidades cristãs, nomeadamente ao nível da organização pastoral?

Naturalmente, a distribuição do clero é um desafio muito grande para o senhor Cardeal-Patriarca e para os senhores bispos. Nós estamos com uma diocese muito grande. Neste momento, é a maior do país, com dois milhões e trezentos mil habitantes. Havendo uma redução no número de padres, acredito que temos de ter os sacerdotes onde estão as pessoas. Trata-se de nomear os padres disponíveis para onde o desafio é maior. A tendência em Portugal é para cada vez se juntarem mais pessoas à volta de Lisboa, na periferia. E isto é um desafio enorme!

 

Até porque no futuro não vai ser possível cada paróquia ter o seu pároco em permanência…

Surge aqui a questão da Eucaristia, que é a questão mais rica e que as pessoas têm tido com muita facilidade. É de supor que no futuro, as pessoas não possam ter a Eucaristia com a mesma facilidade. Esse grande tesouro da Igreja vai sofrer uma redução, o que significa que os cristãos vão ter que organizar os seus horários e as suas vidas para poderem participar na missa. Não é estafando os padres, obrigando-os a celebrar mais missas, que o problema se resolve. Isto é o que se tem feito ao longo dos anos: o padre esticar até ao limite. O que traz também um desgaste espiritual, ao contrário do que as pessoas pensam.

 

 

 

Informação complementar:

Que significado tem a comemoração dos 200 anos da igreja paroquial de Nossa Senhora do Amparo de Benfica?

O primeiro sentimento que tenho na celebração dos 200 anos da igreja de Benfica é um sentimento de gratidão. Porque nós recebemos um património desta beleza que outros construíram. E não existe a igreja de pedras sem a igreja de pessoas. Houve fé que levou a este empenhamento no passado e um povo tem futuro na medida em que tem memória do passado. Só assim se rasga o futuro! Quando celebramos um aniversário é porque queremos viver… e nós queremos continuar a fazer caminho! E a fazer todo o bem que estiver ao nosso alcance!

 

Igreja paroquial de Nossa Senhora do Amparo de Benfica

Com o projecto do arquitecto do reino João Frederico Ludovice, iniciou-se a sua construção no ano de 1750, fazendo-se a sua inauguração no ano de 1809. O interior corresponde ao estilo neoclássico, de inspiração italiana. A pintura da abóboda, com abundância de títulos marianos, é obra de Diogo Pereira Cão (séc. XIX). O interior do templo sofreu algumas remodelações no ano de 1972.

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