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Isilda Pegado
Era uma vez - um bebé

A Mariana e o Carlos tinham 40 anos, casados há cerca de 5 anos, pensaram agora em ter um filho. Como tal não se estava a concretizar, recorreram às chamadas técnicas de (PMA) inseminação artificial. Na verdade, o Carlos tinha um problema que não lhes permitia ter filhos. Tiveram então de recorrer ao chamado “Banco de Esperma”. Isto é, adquiriram esperma que fecundou, em laboratório, os óvulos da Mariana e após formados os embriões foram implantados no útero da Mariana.

Técnica a que muitos casais estão a recorrer especialmente quando a idade já é avançada (acima dos 35 anos) para o primeiro filho. Foi o que lhes disseram no longo e penoso processo de PMA que iniciaram numa “unidade de fertilidade”.

Depois de várias tentativas, onde se perderam 3 embriões (bebés), finalmente a Mariana viu a sua gravidez progredir.

Porém, às 31 semanas o bebé quis nascer e como já tinham todo este historial de insucessos na reprodução artificial, foi mais prudente (segundo os médicos) deixar que o bebé nascesse.

Foi feita a cesariana, e o bebé nasceu e na sua condição de prematuro teve cuidados médicos especiais.

Ao fim de 2 dias o bebé começou a desenvolver um quadro clínico de doença rara, indefinida e muito preocupante. Temia-se pela vida do bebé.

Pelos médicos, foi então colocada a hipótese de uma doença de origem genética. Porém, a genética desta criança não era conhecida em 50%. Pois, os 50% dados pelo lado masculino tinham vindo de um “banco de esperma” com anonimato do dador. Os médicos que seguiam o caso sentiam-se numa “aflição” por não saber/poder ajudar aquela criança.

A lei permite que nestes casos seja conhecido o dador de esperma. Mas com o consentimento dos pais.

Os pais confrontados com esta necessidade de conhecer o homem que tinha dado parte da genética do filho, recusaram tal consentimento.

A equipa médica ficou ainda mais alarmada. Porque negavam aqueles pais a possibilidade de tratamento do filho? Que levava aqueles pais a, perante a hipótese de perder o filho, ou, saber quem era o pai genético deste, negaram esta opção? Porque não queriam aqueles pais serem confrontados com a realidade?

A “verdade” (falsa) que alimentaram ao longo de meses, de tratamentos, de clínicas de hormonas, etc., tinha um valor superior à vida daquela criança?

Onde está a dignidade da vida humana?

Os médicos, que no hospital se batiam de dia e de noite, pela vida daquela criança, que definhava hora após hora, colocavam estas e outras questões.

A enfermeira Joana, que foi assistindo a tudo isto em silêncio, até porque estas questões da Bioética têm sido fonte do seu interesse, a certa altura perguntou: “Dra. Ana, desculpe mas tenho de desabafar, afinal tratamos de pessoas, de bebés, ou de coisas? Lamento muito por estes pais, que para o resto das suas vidas terão de carregar estes dias de aflição e infelicidade. Porque negam eles a realidade? Porque estamos a assistir, com tanta frequência, a estes dramas?”.

A Dra. Ana, cansada e triste, disse: “Que mundo… há muito para fazer!”. E ambas, medica e enfermeira, de olhos no chão, seguiram o seu caminho.