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P. Gonçalo Portocarrero de Almada
Render da guarda na cartuxa de Évora

Outubro ficará na história da Igreja em Portugal por dois principais motivos: a entrada, para o colégio cardinalício, de D. José Tolentino Mendonça; e a saída dos monges da cartuxa de Évora.

Uma tão reforçada presença lusitana no sacro colégio – de que já faziam parte quatro prelados portugueses: D. José Saraiva Martins, D. Manuel Monteiro de Castro, D. Manuel Clemente e D. António Marto – é uma honra e uma acrescida responsabilidade para Igreja portuguesa. O novo cardeal, bem como o Patriarca de Lisboa e o bispo de Leiria-Fátima, participarão seguramente no próximo conclave, de que os outros cardeais portugueses já estão, por razão da idade, dispensados. Os três cardeais votantes não apenas têm garantida a sua participação nesse acto eleitoral, como também já são, por razão da sua condição cardinalícia, próximos conselheiros do Santo Padre no governo da Igreja universal. Se a púrpura de que se revestem é sinal da sua condição principal – ou principesca, como antes se dizia – é também um chamamento à unidade com o bispo de Roma. Aos reis de Portugal, porque foram sempre fiéis ao Papa, foi dada a graça de se intitularem fidelíssimos; aos cardeais lusitanos compete a patriótica missão de honrar essa distinção que, também agora, deve caracterizar a nação portuguesa.

Se foi festiva a notícia da elevação à púrpura cardinalícia de D. José Tolentino Mendonça, que suscitou um generalizado consenso, também para além das fronteiras eclesiais, por tratar-se de uma figura marcante da cultura portuguesa, o mesmo já não se pode dizer da saída de Évora dos monges da cartuxa. A sua presença, silenciosa e orante, era uma bênção para a cidade, para a diocese e para todo o país, que tanta necessidade tem de quem, pela via da oração e da penitência, sustente a acção da Igreja militante. Portanto, é com um sentimento de perda e, até, de antecipada saudade, que vimos partir os cartuxos, muito embora nos anime a esperança de que, na sua nova morada, não esquecerão a terra que os acolheu durante tantos anos, nem as suas gentes.

A pena pela saída dos monges da venerável Ordem de São Bruno, que se espera que seja apenas temporária, foi atenuada pela alegria de saber que uma nova comunidade, de religiosas do Instituto das Servidoras do Senhor e da Virgem de Matará, ocupará esse espaço, mantendo viva a sua tradição religiosa. Infelizmente, na Europa central, alguns conventos, à falta de consagrados, deixaram de estar afectos à sua originária missão espiritual, para se converterem em museus, livrarias, lojas e, até, hotéis e restaurantes.

Graças a Deus foi possível encontrar uma ordem religiosa contemplativa que ocupasse aquelas instalações, mantendo a função religiosa daquele espaço, como lugar de culto e de evangelização, agora na perspetiva de um novo carisma. Estas mudanças são também sinais dos tempos da Igreja neste terceiro milénio da era cristã: se algumas congregações religiosas, por escassez de membros, vêm-se obrigadas a diminuir a sua presença, outras há que, graças à abundância de vocações, se disponibilizam para ocupar essas instalações, mantendo viva a sua tradição religiosa.

Para além das novas congregações religiosas, como as Missionárias da Caridade, fundadas por Santa Teresa de Calcutá, também há muitas instituições eclesiais de leigos, que promovem apostolados adequados à sua preparação profissional, nomeadamente no âmbito do ensino e da saúde. Graças ao seu empenhamento, alguns colégios, que foram fundados por institutos religiosos, são agora geridos por leigos empenhados em proporcionar um ensino de qualidade, mantendo viva a sua inspiração cristã.

Na pluralidade dos seus carismas, a Igreja católica redescobre-se na unidade da sua fé e missão. Ultrapassado o espírito bairrista das ‘capelinhas’, tão contrário ao mandamento novo do Senhor e ao sopro do seu Espírito, a experiência da comunhão, sem confusão, no apostolado é também uma muito salutar vivência ecuménica.

 

foto por Agência Ecclesia/HM