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Pe. Alexandre Palma
Inverter o algoritmo

«Se gostou disto, então vai gostar também daquilo». Esta é lógica que preside à circulação de informação nas modernas redes sociais. É o eixo do algoritmo informático que as gere. Não é difícil perceber que assim seja. Deste modo essas plataformas ficam mais perto do seu objectivo: ampliar as suas redes; mas, sobretudo, manter as pessoas conectadas. Por isso dão ao seu utilizador, incansavelmente, aquilo que este já mostrou apreciar. É, por assim dizer, uma versão elaborada do mito de Narciso. Satisfazendo os seus gostos mais imediatos, seguram a atenção. Podem ser vídeos mas também produtos; podem ser informações de amigos mas também opiniões de desconhecidos. Em qualquer dos casos, o feed torna-se um espelho. Esse fluxo de informações personalizado torna-se apenas um reflexo do que o utilizador é, gosta e pensa. Não pretende ser nada mais do que isso. Mesmo se e quando o utilizador disso se não apercebe. Essa é uma sociabilidade de afinidades, quando não de clones. Mesmo se e quando o utilizador disso se não apercebe.

Há nisto qualquer coisa de contraditório: redes sociais que, ao fim e ao cabo, não sociabilizam. Porque a sociabilização supõe sempre sair de si próprio. E isto não como aviltamento do que cada um é, mas, pelo contrário, como capacitação para se ser mais. A identidade precisa do outro para se descobrir ou construir. Precisa dessa alteridade tanto para se consolidar (perante o outro, descubro quem sou), como para se relativizar (perante o outro, descubro que há outras formas de ser). Por isso, aonde nos conduzirão percursos e identidades fundados no semelhante, no igual, no mesmo?

Tendo a concordar com uma ideia que ouvi há pouco: precisamos de sistemas que não nos digam «se gostou disto, então vai gostar também daquilo»; precisamos de sistemas que nos digam antes «se gostou disto, então talvez nunca tenha ouvido falar naquilo». Precisamos, no fundo, de inverter o algoritmo destas redes sociais, para sermos expostos também ao novo e ao diferente. Meios que apenas nos ensinem o que já sabemos, que repitam o que já dissemos, que mostrem o que já vimos nunca nos poderão satisfazer. Porque eles entopem de redundâncias a nossa inclinação para ir além do que já sabemos e somos. Não estou já a falar apenas e só dessas redes informáticas. A sua lógica como que contaminou outras áreas do viver em sociedade, mas também em Igreja. Quando o nosso mundo é apenas habitado pelo semelhante, tornamo-nos mais incompetentes para lidar com a diferença, epidermicamente sentida como «micro-agressão». Pior, quando o feed da vida é um simples espelho de quem somos, inconscientemente assumimos que todo o mundo é como nós, pensa como nós, crê como nós, tem as mesmas questões que nós. Essa bolha de ilusão impede-nos de ver os outros como outros, mas também de nos vermos a nós próprios como verdadeiramente somos. Eis porque precisamos de um outro algoritmo. Um que nos sociabilize com a alteridade. Porque há sempre mais mundo para lá de nós.