No primeiro de um ciclo de quatro webinars, dedicados à ‘Família e Educação’, o Cardeal-Patriarca de Lisboa alertou os casais e educadores cristãos para a necessidade de apresentarem, “de uma maneira convincente”, o projeto matrimonial cristão. Na iniciativa organizada pela Pastoral Familiar do Patriarcado de Lisboa, ficaram testemunhos e algumas pistas para os desafios que se colocam, hoje, à educação dos filhos.
Como educar para a liberdade? Como educar na fé? Estão relacionadas? Estas foram algumas das perguntas que orientaram o primeiro webinar dedicado à ‘Família e Educação’. ‘Educar para quê?’ foi o ponto de partida da iniciativa que começou no passado dia 5 de novembro. Não houve respostas “milagrosas”, porque cada criança e cada pai ou educador são “realidades únicas”, mas como ponto de partida foi deixada uma certeza: “Os pais são competentes para educar os filhos, não porque sejam os mais especialistas em técnicas de educação, mas porque são quem mais os ama”, começou por referir o casal diretor da Pastoral Familiar do Patriarcado de Lisboa, Regiani e Tiago Líbano Monteiro. “A base da educação é o amor partilhado, a vida entregue ao serviço da Vida. Queremos ajudar os pais a assumirem, sem medo, o seu grande papel de educadores, conscientes das suas limitações, mas certos de que o seu amor fundado em Cristo tudo pode naqueles que lhe abrem o seu coração com simplicidade e humildade. E isto aplica-se também a todos os educadores”, afirmaram estes responsáveis, desejando que esta iniciativa contribua para o caminho sugerido para este ano pastoral, sobre Família e Educação, e que “sirva de base” para a Jornada Diocesana da Pastoral da Família, em fevereiro de 2021, e para a Festa da Família, prevista para 30 de maio. Fica também o “sonho” de, com os frutos deste ano pastoral, “conseguir montar uma ‘escola de pais’, que possa, nos próximos anos, estar disponível para todas as famílias”, revelou Regiani, na abertura do primeiro webinar que contou com mais de 800 inscrições, de 15 dioceses portuguesas.
O “ideal cristão”
Na sua intervenção, o Cardeal-Patriarca de Lisboa afirmou que existem “desafios muito grandes” na sociedade no que se refere ao “projeto matrimonial cristão, quer o que diz respeito à constituição da família, quer o que diz respeito à educação – ou seja, a transmissão de convicções, de cultura, de modos de viver”. O projeto matrimonial cristão, ou “o ideal cristão – como chama o Papa Francisco”, “sempre” teve desafios desde que “Jesus Cristo o apresentou”; mas, hoje, “por tantas contradições que são próprias da cultura ou da mentalidade contemporânea, ele precisa muito de ser reforçado”, sublinhou D. Manuel Clemente, enaltecendo o papel insubstituível das gerações de famílias que, “geração após geração”, “têm mantido esse mesmo ideal”. “Daí que a Pastoral Familiar – que é, sobretudo, a conjugação de esforços, de presença, de muitos casais e de famílias que vivem este ideal que Cristo lhes propôs – é a melhor maneira de responder a tantas perguntas que se põem, a tantos desafios que se colocam, a tantas dificuldades que é preciso ultrapassar”, afirmou.
O Cardeal-Patriarca alertou ainda para o facto de, hoje em dia, “muito do que à educação diz respeito” se passar “fora do ambiente familiar”. Por isso, segundo D. Manuel Clemente, neste contexto, “é necessário” que os casais cristãos, os pais cristãos, e os educadores “se reforcem mutuamente neste mesmo ideal para apresentarem de uma maneira convincente e, antes de mais pelo seu exemplo – porque não há nada de mais convincente do que o seu exemplo – o que é a felicidade, a possibilidade, a conveniência deste projeto matrimonial cristão e da transmissão educativa deste ideal, de pais para filhos e de geração em geração”, apelou.
A história de António
O orador deste primeiro webinar foi o assistente da Pastoral Familiar do Patriarcado de Lisboa, padre Duarte da Cunha. Na sua intervenção, que decorreu antes da ‘mesa redonda’ (ver caixa), o sacerdote pretendeu partilhar, a partir de dois textos, a história de um adolescente e “algumas pistas” sobre o tema deste ciclo de webinars, ‘Família e Educação’, sem pretender ser “um conjunto de receitas, até porque as realidades são tão diferentes umas das outras e as pessoas são todas únicas, quer os pais, quer os filhos”, sublinhou.
‘António’ é o adolescente protagonista da história contada pelo padre Duarte da Cunha. Acabado de fazer 16 anos, este adolescente revela um interesse por perceber “um bocadinho mais” do que se passa no “mundo dos grandes”. Ligado às redes sociais, mas com interesse em conteúdos informativos, António reconhece que não sabe tudo. “Afinal, como se podem conhecer bem as coisas que acontecem?”, questionou ele. O “amor à verdade” fê-lo procurar “estudar mais” e lembrou-se do que o seu professor de Filosofia disse sobre Santo Agostinho, no seu livro ‘Confissões’. Ele, “só quando descobriu Deus e percebeu que a verdade não é um sonho, é real, é que percebeu o que é a felicidade”. Lembrou-se também das conversas que tinha com o seu pai e que o inspiravam nesta busca. “O que mais mexia com o António era ver que o pai estava também ele sempre à procura da verdade”, contou o padre Duarte da Cunha.
Aos 16 anos, os pedidos para sair à noite ou aos fins-de-semana com os amigos eram, muitas vezes, recusados. O ‘não’ era sempre contestado e o argumento de que os outros pais não tinham a mesma resposta criava, na mãe, o “medo de estar a exagerar” e, ao mesmo tempo, a convicção de que “é preciso ajudar o filho a dosear as coisas que faz”. “O que dava mesmo segurança à mãe era o facto de ter estas coisas conversadas com o marido” e “antes de fazer ou de decidir fazer alguma coisa” terem pensado e discutido “entre eles”, acrescenta. Para os pais de António, esta era a melhor maneira de poder falar de uma “autêntica liberdade”, mesmo quando “as coisas eram complicadas”. “Agindo deste modo, eles sentiam-se livres e não desorientados. Era isso que queriam para os filhos: que fossem livres no sentido mais verdadeiro”. E o exemplo dos pais era essencial. “Os filhos percebiam o que os pais diziam porque viam que os pais estavam sempre empenhados em viver tudo com sentido”, partilhou o assistente da Pastoral Familiar de Lisboa.
Amar
A Marta “não saía da cabeça” de António. Aos 16 anos, a paixão pela rapariga despertou olhares, mas não só. Como viver da melhor maneira uma “maturidade afetiva”? Empurrado por conversas com os amigos, o adolescente “às vezes até tinha pensamentos menos puros, mas: ‘que fazer se as conversas dos amigos iam muitas vezes dar ali e ele acabava por imaginar coisas?’ A internet também não ajuda – até desajuda – porque faz os rapazes imaginarem coisas irreais e desejarem as raparigas só para terem prazer”, assinalou. Mas António gostava dela “quase como se fosse algo transcendente”. “Por isso, ficava com peso na consciência cada vez que tinha um mau pensamento e até se confessava disso”, conta. Decidido, um dia falou “em abstrato” desta história ao pai, que lhe respondeu: “Amar é querer o bem de uma pessoa, aliás deveria ser querer não um bem qualquer, mas o Bem maior. Se gostas mesmo de uma pessoa, é porque também gostas do destino dela e queres que ela o alcance. Podes gostar da companhia dela e ter prazer quando a abraças, mas o teste é quando tiveres de fazer, mesmo que isso te seja difícil, algo de verdadeiramente bom pela tua namorada”. As palavras ecoaram em António e Marta “reparou na mudança” e “gostou”. “Habituada a rezar”, Marta sabia que “a certa altura é preciso pensar na vocação e que o amor por um rapaz não pode ser visto fora dessa perspetiva”.
O “compromisso social” também fez parte das interrogações de António. Juntamente com a sua namorada, concluiu que, frente à questão da Eutanásia, era preciso “fazer alguma coisa”. “Tinham uma palavra a dizer e não podiam pensar que a política ou os temas da sociedade eram para os outros”. Era também necessário “descobrir onde e como aprender coisas justas para não serem enganados e poderem fazer alguma coisa certa”. “Ele tinha herdado do pai aquela preocupação de não ser enganado”, contou o padre Duarte da Cunha. Para além do objetivo político, um desafio para visitar um hospital pediátrico, onde existem crianças sozinhas, levou António a ver o problema a complicar-se, mas a tornar-se “mais interessante”. A sua colega Maria fê-lo ver que “a política até podia começar por fazer alguma coisa, por exemplo, pelos mais pequeninos que ninguém visita”.
Ao jantar, António estava “entusiasmado” com o caminho feito. A iniciativa que nasceu “entre os amigos” foi partilhada com a família. “O pai e a mãe não esconderam a alegria” e “também eles tinham a sensação de que era preciso fazer alguma coisa”. Lembraram-se do desafio feito pela “tia Gui”: irem a uma reunião sobre a Eutanásia. O pai de António lembrou, “quase solenemente”, que “tudo o que se pode fazer para ajudar é bom, mas importante mesmo é tomar consciência de que não estamos neste mundo por acaso e falou da importância da fé, da oração e da santidade”. Ao apresentarem “Deus na vida” dos dois, os pais de António deram a entender aos filhos que “Jesus Cristo era mesmo importante” para eles. “Ele fez ver que a vida não pode ser um conjunto de caixas separadas, e que só quando todos os aspetos da vida estão unidos através da relação com Deus ela é mesmo Vida”, e mesmo perante o desânimo da irmã de António, sobre o seu futuro, os pais guardam duas certezas: “Cada um é como cada qual” e “eles sabem que podem contar connosco”, concluiu o orador deste primeiro webinar organizado pela Pastoral Familiar do Patriarcado de Lisboa.
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“Relação afetiva forte” e “exemplo” são essenciais para a educação dos filhos
Na ‘mesa redonda’, moderada pela jornalista Laurinda Alves, participaram os casais Marta e Mário Dias, com cinco filhos, da paróquia da Brandoa e membros do Caminho Neocatecumenal, e Maria e Luís Goes, que têm sete filhos e pertencentes ao movimento de Schoenstatt. Num formato que permitiu algumas perguntas das centenas de inscritos, foram partilhados alguns dos desafios na educação dos filhos. Sobre “educar para a liberdade”, os casais convergiram na ideia de que a imposição de regras, por si só, não é o caminho. “Sempre lutámos para criar com eles uma relação afetiva forte, capaz de ter vínculos verdadeiros” e “é importante deixá-los correr o risco e deixá-los tomar decisões”, afirmou o casal Maria e Luís Goes. No que diz respeito à educação na fé, este casal defende que é essencial conduzir os filhos para “trazerem Deus à vida do dia-a-dia” e responsabilizá-los pelas decisões tomadas, “com confiança”.
Para o casal Marta e Mário, a educação também nasce com o “exemplo” dos pais, ao torná-los “participantes” de todo o processo, afirmaram. Para este casal da paróquia da Brandoa, apesar de todas as contrariedades, a educação na fé faz-se também com a oração diária do ‘Shemá’ e das Laudes, em família, ao Domingo. Nos momentos difíceis, estas também podem ser vividas como ocasiões para “pedir perdão” aos filhos, partilhou o casal Dias.
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Sessões prosseguem nas próximas semanas
O ciclo de webinars sobre ‘Família e Educação’, do Setor da Pastoral da Família do Patriarcado de Lisboa, prosseguiu no dia 12 de novembro, e vai também decorrer a 3 e 10 de dezembro, sempre a partir das 21h30. Dirigida a pais, filhos e educadores, esta iniciativa é composta pelo Módulo 1, sobre ‘Pais e Filhos’, que decorreu nos dias 5 e 12 de novembro, com ‘Educar para quê?’ e ‘Serão os pais competentes para educar?’, e o Módulo 2, ‘Pais e Escola’, a 3 e 10 de dezembro, sobre ‘O valor dos adultos para as crianças e jovens’ e ‘Liberdade de Educação’. Em cada webinar, além da palestra haverá uma mesa redonda.
Pode acompanhar a transmissão através das páginas Facebook e YouTube do Patriarcado de Lisboa e da Pastoral Familiar de Lisboa.
Mais informação em http://familia.patriarcado-lisboa.pt
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