Em final de ano litúrgico, no meio de uma avassaladora pandemia, que nos coloca perante imensas potencialidades e contundentes limitações, parece haver alguém a desejar mais uma frente de combate entre o poder político e o poder religioso. Nada mais espúrio e inútil. O bom senso, nomeadamente entre as nossas autoridades religiosas, dá-nos confiança: o importante é ultrapassar a pandemia e dar prioridade a tudo o que for necessário para defender a vida.
Os sinais que nos podem animar
Já temos algumas das habituais decorações natalícias, umas precoces, outras sem jeito. Prefiro referir-me ao sinal que o tempo litúrgico nos deixa, com o Domingo da Solenidade de Jesus Cristo Rei do Universo, e a celebração do Dia Mundial dos Pobres, no Domingo anterior, celebração essa que aponta para o núcleo da realeza de Cristo, tão popularmente apresentada no hino “Cristo vence, Cristo reina, Cristo impera”, embora por vezes escorregando impercetivelmente para uma visão terrena de poder perante outros poderes. O Papa Francisco afirmou que os “pobres estão no centro do Evangelho” e que “o Evangelho não se entende sem os pobres.” Por, isso o Dia do Pobre encaminha-nos para o Dia de Cristo Rei.
As palavras de Paulo aos Coríntios e especialmente o “esvaziamento” na Carta aos Filipenses, dão-nos a chave para o entendimento entre a pobreza e a realeza. Ele, sendo rico, aniquilou-se a si mesmo, fez-se pecado, a pior pobreza; por isso Deus O elevou acima de tudo, para que todos os joelhos se dobrem diante d’Ele, tornando-se servos dos outros, portadores de vida mais abundante, não de uma forma passiva, resignada ou “mumificada”, mas diligente como o servo que recebeu o talento e o fez render.
Uma vida vale porque serve a vida
A identificação com Cristo pobre ultrapassa qualquer análise material e nos leva a olhar para o pobre não como destinatário da esmola, mas a tomar uma atitude criativa que o ajuda a sair da pobreza. Como seria diferente se esta humanidade, que consegue viajar pelo espaço, fosse capaz de alterar a situação de fome de tão grande parte dos seus filhos; se as injustiças gritantes que lançam multidões na miséria fossem superadas; se o desrespeito pela dignidade de outros seres humanos, como algumas minorias étnicas, se tornasse inaceitável; se a total desproteção de populações inteiras perante o fanatismo e o terrorismo, como em Cabo Delgado, não parecesse um fatalismo; se o elevado nível de bem-estar de uns países perante a miséria escandalosa de tantos outros começasse a fazer parte do passado. O pobre identificado com Cristo vai identificando o seu rosto nos rostos sofridos dos irmãos e criando uma nova fraternidade, deixando claro que só o bem tem valor e permanece. Por isso Francisco afirmou: “quem não vive para servir, não serve para viver.” Ou como refere no n.º 36 da Fratelli Tutti: o “salve-se quem puder”, conduz a “todos contra todos” e isso é pior do que a pandemia.
Não a mentes “mumificadas”
O projeto da Economia de Francisco, iniciado com a sua carta aos jovens em maio de 2019, teve neste dia 20 de Novembro o grande encontro, em Assis. Procura abrir uma brecha numa dimensão que até ao momento parece inexpugnável perante a ditadura das leis do mercado, provocando a criação de riqueza, mas não desenvolvimento, nem justiça, nem fraternidade. O encontro quer afirmar que vale a apena procurar outras explicações e outras práticas, que ultrapassem as de uma “economia que mata”. O Prémio Nobel da Paz de 2006, Mohammad Yunus, dirigindo-se aos jovens de mais de 130 países afirmou que as finanças seguiram numa direção errada, tornando-se um instrumento para a concentração de riqueza. Recordou ainda que, nem mesmo perante a pandemia, foi possível levar os poderosos a concentrarem-se mais na salvação da vida de todos, em vez de se fecharem em interesses particulares. O Papa acredita que é possível arriscar novos caminhos, como acredita também essa multidão de empresários e estudantes de economia com menos de 35 anos – a Geração sub-35 – chamada a construir um novo sistema económico e financeiro. Por isso, a solenidade da Realeza de Cristo nos introduz num Advento de esperança por um amanhã mais feliz porque transformado pelo fermento do Reino.
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