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P. Duarte da Cunha
Discípulo Missionário - Pastoral evangelizadora

Quando andava no seminário, era costume – e bem – dizer aos seminaristas e aos padres que a pastoral da Igreja não podia ser só de manutenção, querendo com isso dizer, que a missão da Igreja toda, e dos padres em particular, não podia ser só o cuidar da fé dos chamados católicos praticantes, como se apenas quiséssemos que não se afastassem mais pessoas, mas deveria ser missionária, sair da sacristia, como se dizia e ir ao encontro de todos.

Na verdade, reduzir a pastoral a não perder mais fiéis pressupunha pensá-la como um esforço de retardar uma falência considerada inevitável pelos profetas do secularismo.

Muitos diziam que esta pastoral da manutenção era própria de movimentos ou realidades mais conservadoras dedicadas ao culto e à religiosidade popular. Depois fomos vendo que uma tal acusação era uma generalização injusta e que por vezes estas comunidades eram as que mais cresciam. Além disso, é importante dizer que também havia e há pastoral da manutenção de teor mais progressista. É um facto que se pode identificar a caridade em tantos chamados progressistas, mas também eles podem cair no perigo da pastoral de manutenção, quando caem no ativismo que não anuncia Jesus.

O segredo não é ser progressista ou conservador. Mas também não é ser morno, ou neutro, ou meio termo. A nossa preocupação deve ser o encontro com Jesus e a aceitação das consequências desse encontro.

As coisas foram ficando mais claras com o Jubileu do ano 2000 e com tudo o que, para o preparar e para o celebrar, se viveu. São João Paulo II, que já tinha dito na Encíclica Redemptoris Missio que a missão é próprio da identidade do cristão e não algo que se acrescenta à vida dos crentes, dizia no primeiro documento que escreveu logo após o Jubileu: “Ao longo destes anos, muitas vezes repeti o apelo à nova evangelização (...). Devemos reviver em nós o sentimento ardente de Paulo que o levava a exclamar: «Ai de mim se não evangelizar! » (1 Cor 9,16). Esta paixão não deixará de suscitar na Igreja uma nova missionariedade, que não poderá ser delegada a um grupo de «especialistas», mas deverá corresponsabilizar todos os membros do povo de Deus. Quem verdadeiramente encontrou Cristo, não pode guardá-Lo para si; tem de O anunciar.” (NMi 40).

Esta é a lógica, que também o Papa Francisco explica quando lança o repto de sermos discípulos missionários. Na Evangelii Gaiudium dizia: “Em todos os baptizados, desde o primeiro ao último, actua a força santificadora do Espírito que impele a evangelizar. (...) Em virtude do Baptismo recebido, cada membro do povo de Deus tornou-se discípulo missionário (cf. Mt 28, 19). Cada um dos baptizados (...) é um sujeito activo de evangelização, e seria inapropriado pensar num esquema de evangelização realizado por agentes qualificados enquanto o resto do povo fiel seria apenas receptor das suas acções. (...) Cada cristão é missionário na medida em que se encontrou com o amor de Deus em Cristo Jesus; não digamos mais que somos «discípulos» e «missionários», mas sempre que somos «discípulos missionários».” (EG 119-120)

Aquela dicotomia de que se falava há 30 anos e que nos fazia pensar que havia como que uma tensão entre a pastoral e a missão, não faz sentido. Na realidade, a vida da Igreja, a sua liturgia, as suas obras de caridade ou de educação, a sua presença cultural são sempre, ao mesmo tempo, alimento e anúncio da fé; pastoral e missão. É isso que o Documento sinodal de Lisboa (2016) que está agora a ser avaliado evidencia.

Todos na Igreja somos chamados a ser discípulos missionários, a querer conhecer melhor e amar mais Jesus Cristo e a querer que mais gente o conheça e ame, mas cada um tem a sua missão.

Aos “oficias” da Igreja (clero ou leigos que trabalham na Igreja) é pedido que alimentem a fé dos crentes com uma pastoral bem pensada e fiel ao Evangelho, aos leigos que trabalham no mundo é pedido que, no quotidiano, com os que encontram no caminho das suas vidas, crentes ou não crentes, testemunhem a importância de Deus na vida e se tornem convite: “vinde e vede”. Quanto mais a fé estiver viva e a pastoral alimentar essa fé mais a missão se expande e o anúncio do Evangelho toca mais pessoas.

Ainda há dias, contava-me um amigo que decidiu mandar uma mensagem a um colega a quem tinha morrido um familiar onde, além de dizer que estava disponível para o que fosse preciso, disse que rezava por ele e pela pessoa falecida. O amigo ficou comovido e ligou logo de volta agradecendo o facto de alguém lhe ter falado de oração dizendo que ainda ninguém lhe tinha dito isso desde a morte do familiar. Para chegar aos de fora, não é preciso esconder, mas antes mostrar, que a nossa fé se liga à nossa vida e à nossa morte! Mas não basta mostrar, é preciso testemunhar a fé num contexto de amizade.