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P. Duarte da Cunha
Sinal, Símbolo e Sacramento

Para conhecer bem a realidade e agir de forma adequada, os homens desde cedo perceberam que havia sinais e símbolos para ajudar a estar dentro da vida e aprofundar o conhecimento de tudo o que se vai encontrando no dia a dia. O cristianismo, porém, introduziu algo que supera quer o sinal quer o símbolo: o sacramento.

Um sinal é algo que aponta para uma realidade distinta de si, mas com a qual tem alguma relação. Quem o encontra é levado a pensar na realidade para a qual ele aponta. Um sinal não pretende explicar o que é a realidade, mas consegue apontar para ela e confirmar a sua existência ou onde se encontra. Um sinal pode ser, por exemplo, um efeito que indica a causa, como o fumo que indica que há fogo ou uma seta que indica a direção de uma cidade.

Um símbolo, por sua vez, é mais do que um sinal, porque não só indica a relação com algo que existe e é distinto de si como também pode representar e comunicar algum significado dessa realidade. Os símbolos não são acasos cujo significado cada um se inventa, mas são bem definidos pela cultura e por convenções para representarem sempre algo de definido e concreto. Um símbolo, no fundo, pela sua natureza, pode ser acompanhado de uma explicação do significado. A bandeira de um país, por exemplo, é um símbolo.

Etimologicamente symbolon vem do grego e quer dizer algo que une, que junta. Em várias culturas antigas havia a tradição de se procurar alguma coisa capaz de se dividir em dois quando se faziam acordos, de modo que cada uma das partes ficava com uma metade para indicar o acordo. Isto permitia, inclusive, que ao mostrar a sua parte se confirmava o compromisso. No uso corrente, podemos dizer que o símbolo é aquilo que, a partir de um acordo ou convenção, une um significado a um sinal ou a uma realidade e, consequentemente, comunica aos que conhecem o código desse símbolo o significado da realidade indicada.

Se pensarmos na questão religiosa, atendendo a que toda a realidade criada provém do Criador, podemos dizer que todas as coisas, porque existem, são sinais do Criador. São Boaventura (Itinerarium Mentis in Deum, cap. I, 2) chamava às criaturas vestígios de Deus. Para ele, todas as criaturas, corpóreas ou espirituais, porque recebem de Deus o ser, a força e a eficiência, apontam para a existência de Deus. Se há criaturas há Criador!

Os símbolos, por sua vez, na sua relação com o religioso têm uma história e surgem em culturas e momentos concretos para ajudar a perceber alguma coisa sobre quem Deus é ou o que Ele quer dos homens ou oferece. Por exemplo, a cruz, pela sua história, é mais do que um puro sinal, já que aponta para o sacrifício de Cristo, mas também ensina que Deus é amor e nos salva.

Sendo verdade que, em todas as sociedades, os símbolos são fundamentais para ensinar certas verdades, ou explicar a identidade dessa comunidade, para o cristianismo, que recebe a Revelação de Deus, é ainda mais evidente que os símbolos são fundamentais para nos comunicarem as verdades sobre Deus e sobre o Seu plano para nos salvar.

Contudo, o cristianismo não é só uma comunicação de conceitos. Jesus Cristo comunica-Se a Si mesmo e não apenas uma mensagem; de Jesus recebemos a Sua própria vida. Por isso, não falamos só de sinais ou de símbolos, mas de sacramentos. A celebração de um sacramento, apesar de incluir sinais e símbolos, é mais do que isso, na sua essência é a presença da realidade maior para a qual o sinal aponta e o símbolo representa: a Graça transformadora de Deus. O sacramento segue a dinâmica da Encarnação, pela qual no homem Jesus está presente e atua a divindade: no batismo a pessoa renasce, na confissão é perdoada, no matrimónio duas pessoas ficam vinculadas, etc. e, sobretudo, na Eucaristia o Corpo de Cristo está presente realmente no ato de Se oferecer ao Pai.

Se toda a liturgia está cheia de sinais e de símbolos, desde as obras de arte presentes às palavras ditas ou aos gestos realizados, na celebração dos sacramentos aquilo que o sinal indica e o símbolo procura explicar acontece neste mundo, no aqui e a agora da celebração, e modifica a pessoa que celebra. Um sacramento, de certo modo, pode ser visto como a síntese de um sinal com um milagre. O que acontece na natureza criada pela ação dos sacramentos não se explica por si só, nem apenas recorrendo ao significado dos símbolos presentes, mas requer por uma ação direta do Criador.

A Igreja é a realidade humana que se define, ela mesma, como sacramento, ou seja, “sinal e instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano” (LG 1), pois concretiza, através de toda a sua vida, mas especialmente dos sete sacramentos, a ação de Jesus na vida das pessoas desde que estas, pela sua fé, estejam abertas a essa ação divina.