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Arcebispo Rino Fisichella, presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização: ?Nova linguagem para anunciar o Evangelho?
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O presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização, arcebispo Rino Fisichella, esteve esta semana em Fátima para falar aos bispos portugueses sobre a Nova Evangelização. À chegada a Lisboa, em entrevista conjunta e exclusiva ao Jornal VOZ DA VERDADE e Rádio Renascença, falou sobre os medos de uma Europa que excluiu Deus e precisa de ser reevangelizada.

O que significa hoje, com todas as mudanças operadas na sociedade, a Nova Evangelização?

‘Nova Evangelização’ é uma expressão que penso ter sido criada, profeticamente, pelo Papa João Paulo II, no ano 1979. Significa a capacidade de, diante dos grandes desafios que existem na história dos nossos dias, saber levar ao mundo, de maneira nova e mais eficaz, o Evangelho de sempre. Eu costumo usar uma expressão que é aquela que retoma o texto da Carta aos Hebreus: "Jesus Cristo é o mesmo ontem, hoje e sempre" (Cf. Heb 13,8). Portanto, o conteúdo da evangelização mantém-se sempre o mesmo. No entanto, é preciso entrar no interior das mudanças culturais que existem, sobretudo naquelas Igrejas da antiga tradição cristã, ou seja as Igrejas de todo o Ocidente, que estão inseridas nesta dinâmica histórica e que, claramente, provocam os cristãos de hoje a ser mais conscientes do grande papel que têm. Portanto, a Igreja conserva e mantém a sua missão de ser fiel ao mandamento de Jesus, o de levar o seu Evangelho a todo o mundo. No entanto, é necessário conhecer de maneira nova o lugar onde somos enviados e ter uma nova linguagem com a qual poder anunciar o Evangelho. Isto é, encontrar novas expressões a utilizar, novos sinais mas, no meu ponto de vista, também um renovado espírito missionário que deve possuir toda a comunidade cristã.

 

Se há muitos anos atrás eram os europeus quem partia pelo mundo fora para evangelizar, hoje parece ser a própria Europa a necessitar dessa evangelização. Quais são os problemas mais relevantes da Europa?

Certamente que a Europa é um grande desafio para a Nova Evangelização. Isto sem esquecer que a Nova Evangelização diz respeito, também, à América do Norte, à América do Sul, às Filipinas, à Austrália… Devo dizer que há pedidos constantes que chegam de países como a Índia. Mas na Europa penso que há alguns problemas vinculativos, imediatos. Aqueles a que o Papa Bento XVI chamou "os desertos do homem de hoje". Existem grandes desertos. O grande deserto é, antes de mais, o de um Homem que está, cada vez mais, só. O Homem europeu fechou-se num profundo individualismo. Não sente, sequer, a forte exigência da responsabilidade social. E isto como consequência de um sublinhar constante dos direitos privados e individuais. Portanto, estamos diante do grande paradoxo pelo qual cresce o interesse pelo direito individual e diminui a responsabilidade social. É um Homem que está só e não gera, não cria, não existe futuro diante de si. E não havendo futuro, não é, nem sequer capaz de poder exprimir-se a si próprio. É um homem que tem medo.

A Europa hoje vive, inconscientemente, uma situação de um medo profundo. É um medo determinado pela incerteza de uma profunda crise que não é apenas económica e financeira. Mas é uma crise que se manifesta nos hábitos e nos comportamentos das pessoas. É um medo que, por exemplo, está diante das pessoas que envelhecem e já não têm uma solidariedade, uma certeza do futuro. Diminui a certeza da casa, diminui a certeza dos jovens para se casarem, diminui aquilo que toma o nome de ‘welfare’ [‘bem-estar’], isto é, de todo o Estado social que, talvez na década anterior, tenha sido construído de forma muito rápida. A isto é preciso acrescentar a exclusão de Deus. O europeu excluiu Deus com a grande consequência de que já não reconhece a própria identidade. E, por isso, o grande esforço que a Europa deve fazer é o de reencontrar as próprias origens, e estas identificam-se necessariamente com a presença de um cristianismo que deu unidade e que criou progresso para estes países.

 

Neste contexto, parece que podemos incluir aqui o problema da secularização. Este é um tema que tem sido falado pelo próprio Papa Bento XVI. Como é que se pode combater esta tendência?

Em primeiro lugar devemos afirmar que a secularização é um fenómeno complexo. A secularização nasceu, também, com aspectos positivos. Não podemos esquecer que secularização significa, igualmente, o desejo de ter uma fé mais amadurecida, mais adulta, de não ter um relacionamento com Deus, única e exclusivamente na ordem de um agarrar-se, no último momento, a um Deus em quem nunca se pensa. Por isso, a secularização tem, também, aspectos positivos. No entanto, o problema está no secularismo que daí deriva que é o fenómeno extremo da secularização, e que, de certa forma também, é uma involução do processo, criando uma cultura da vida como se Deus não existisse.

Neste contexto, o relativismo é uma consequência de ordem filosófica que entrou nos comportamentos, mas que nasceu antes do fenómeno da secularização tal como o conhecemos teologicamente. O relativismo de hoje tem as suas origens no niilismo de Nietzsche e por isso para o compreender precisaríamos andar muito para trás. Mas, no meu ponto de vista, este é um relativismo muito perigoso uma vez que entrou nos comportamentos. Por um lado, temos uma leitura filosófica, a desconfiança no poder chegar à verdade e sobretudo o dever teorizar que a verdade não existe e não pode ser alcançada; mas, por outro lado, isto entrou nos comportamentos, pelo que o relativismo se tornou num profundo individualismo, se tornou em emotividade como critério de juízo ético, mas sobretudo se tornou no sentimento de uma total autonomia e independência do homem de hoje, que não me parece ter muito futuro.

 

Embora o Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização seja o dicastério mais recente da Santa Sé, que balanço faz do seu papel e da sua missão?

Ainda passaram poucos meses. Primeiro foi preciso construir todo o Conselho Pontifício para a Nova Evangelização. Neste momento esse processo está concluído. Já se fizeram algumas iniciativas e a primeira foi aquela de realizar dois dias de estudo para clarificar o conceito de Nova Evangelização. Porém, devemos esperar que chegue o mês de Outubro de 2012, que é quando se realizará o Sínodo dos Bispos sobre o tema. Até lá, o trabalho do Conselho Pontifício será o de formular propostas para o Sínodo e não ainda propostas para toda a Igreja.

É preciso esperar o confronto que os bispos irão fazer, entre eles, no Sínodo. No entanto, isto não significa que não existam algumas iniciativas. Estamos a ver como podemos realizá-las, e por motivos óbvios não as posso aqui antecipar. Mas serão iniciativas que nos vão envolver de forma muito clara já partir do mês de Julho. Serão alguns sinais. E o primeiro sinal é o de que não se pode fazer Nova Evangelização sem novos evangelizadores. No entanto os novos evangelizadores já existem. Isto é, já há muitas realidades nas dioceses, nos movimentos, nas associações, entre os religiosos e religiosas e nas próprias paróquias, que têm como objectivo a Nova Evangelização. Por isso, a nossa primeira tarefa é fazer conhecer entre eles estas realidades, mas sobretudo dar um sinal de que a Nova Evangelização já se faz, há anos, na Igreja.

 

Quais é que podem ser essas novas formas de evangelizar a que se refere?

Eu penso que devem existir diversas formas de evangelização, dependendo das culturas, no interior das quais nos movemos. É certo que a evangelização, a Nova Evangelização, feita na Europa, não pode ser a mesma na tradição cultural que existe em Portugal e naquela que existe em França ou na Alemanha. Porque são situações culturais diversas. Precisamos de respeitar o contexto cultural, as tradições eclesiais que existem. Por esse motivo, o Conselho Pontifício tem como primeiro objectivo, ou um dos primeiros, aquele de comunicar, sobretudo, com as Conferências Episcopais e estar em relação com elas. Porque são elas que conhecem melhor a realidade cultural e eclesial e o modo como estas se podem conjugar. Mas, o Papa deseja sobretudo que, e está escrito na Carta Apostólica com a qual instituiu o Conselho Pontifício, nas Conferências Episcopais exista uma comissão ou uma realidade que, especificamente, deverá ocupar-se da Nova Evangelização. Mas devemos ter consciência de que mesmo quando fazemos Nova Evangelização na Europa ou na América Latina, ela não pode ser a mesma, porque os desafios são diferentes.

 

Também em Portugal a Igreja está empenhada neste desafio da Nova Evangelização. O que o que vem dizer aos bispos portugueses?

Foi com grande prazer que acolhi o convite que a Conferência Episcopal me dirigiu para passar dois dias dedicados à reflexão sobre a Nova Evangelização. Mas, antes de mais, irei ouvir aquilo que os bispos já há algum tempo realizam por cá, e depois, sentindo-me irmão entre irmãos, darei conta de algumas experiências que lhes podem ser úteis.

 

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Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização

Com Carta Apostólica, em forma de Motu Próprio, datada de 21 de Setembro de 2010, o Papa Bento XVI constituiu o Conselho Pontifício para a Promoção da Nova Evangelização, presidido pelo arcebispo italiano Rino Fisichella.

Cabe a este mais recente conselho pontifício aprofundar o sentido teológico e pastoral da Nova Evangelização, promovendo junto das conferências episcopais o estudo, a difusão e a actuação do magistério pontifício. Este dicastério é chamado, de modo particular, a favorecer a utilização dos mais modernos meios de comunicação para verificar de que modo estes podem ser instrumentos válidos de evangelização. É, ainda, chamado a individuar as formas mais coerentes para a promoção do Catecismo da Igreja Católica, considerado ensinamento eficaz para a transmissão da fé.

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