Missão |
Maria Filomena Alves de Almeida, da Fundação João XXIII
“A Guiné faz hoje parte do meu ADN”
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Maria Filomena Alves de Almeida tem 55 anos de idade, dois filhos, quatro netos e “mais dois a caminho”. Frequentou a escola até ao “antigo 5º ano do liceu” e é atualmente corresponsável dos projetos na área de saúde e da educação da Fundação João XXIII e já esteve em missão na Guiné-Bissau mais de vinte vezes nos últimos doze anos.

 

Nasceu numa família pobre que tinha uma casa muito pequena. O seu pai “trabalhava à jorna” e era pescador e a sua mãe era costureira. “Para a minha mãe, o sonho era que os filhos estudassem. Infelizmente não havia possibilidades monetárias, na época o único liceu ficava a 18 km. A única alternativa  foi fazer a tele escola até ao sexto ano, que ficava a três km que fazíamos todos os dias a pé ida e volta. Acabando assim por não seguir os estudos, mais tarde fui fazer exames do nono ano em regime de auto proposta, arranjando para isso um trabalho na sede de concelho e pagando do meu salário a um explicador para ajudar”, conta-nos. Fez toda a catequese e recebeu os sacramentos, fez parte do grupo de jovens e foi catequista. “Foi neste grupo que tive os primeiros contactos e experiência de solidariedade”, diz-nos. Na sua casa “era praticado diariamente o ser solidário, o meu pai apesar de não ir à igreja, era muito solidário com quem tinha ainda menos que ele. Tínhamos sempre mais uma pessoa para comer, lavar a roupa semanal e para passar as festas. Confesso que na época as vezes ficava revoltada ter que lavar a roupa de outra pessoa que não era da casa, mas na verdade esse ensinamento que os meus pais me deixaram foi muito importante para todo o meu percurso de solidariedade”, partilha. No entanto, acabou por estar muitos anos afastada da vida religiosa ativa, por discordância com os métodos de ensino da doutrina cristã. Quando os seus filhos chegaram à idade adulta e começaram a frequentar a catequese e os escuteiros, voltou a ter contacto com a comunidade religiosa e com as atividades e, na mesma altura, volta a ter contacto com os mentores de jovens e com o grupo de trabalho de solidariedade com a Guiné. Por razões profissionais não pôde ir em missão mas foi sempre colaborando em campanhas.

 

A sorte que temos com as coisas boas que Deus nos dá

No seu percurso profissional foi durante algum tempo auxiliar de enfermagem no Hospital de Torres Vedras e chegou a pensar licenciar-se. No entanto, a falta de escolaridade e as poucas possibilidades económicas acabaram por a condicionar. Na mesma altura, conheceu aquele que viria a ser seu marido durante trinta anos (e de quem enviuvou há quatro anos). “Decidir constituir família foi uma decisão consciente de que esse sonho seria posto de parte e foi determinante para que os esforços necessários para continuar a estudar tivessem sido postos de parte”, partilha. Enveredou depois pela hotelaria, como forma de ter uma vida próspera e com capacidade para educar os seus filhos com melhores condições monetárias do que os seus pais. “Era neste campo que também tinha sempre trabalhado desde os 16 anos, passar de empregada a patroa foi uma dura aprendizagem mas, por outro lado, deram-me possibilidade económica para ajudar quem mais precisava à minha volta ou além-fronteiras. A consciência que da sorte que temos com todas as coisas boas que Deus no presenteia, juntamente com os ensinamentos que trazia de berço, sempre me fez ter presente na minha forma de estar o sentimento de solidariedade”, conta.

 

Mais de 20 idas à Guiné-Bissau em 12 anos!

Alimentou sempre o sonho de um dia ir a África numa missão de solidariedade. Realizou o seu sonho em janeiro de 2005, integrando o grupo de trabalho  Solidariedade com a Guiné, da Fundação João XXIII. Desse grupo faziam parte o Padre Batalha (presidente da Fundação), Jacinto Filipe e o seu irmão Francisco, com quem sente que foi uma honra ter partilhado duas semanas em missão. “Acredito que foi essa partilha, juntamente com a constatação ao vivo e a cores do trabalho e obra desta Fundação que me fez apaixonar pelo projecto e pelo povo, perceber a diferença que se faz com tão pouco. Até hoje continuo a acreditar que não podemos mudar o mundo, que tudo o que fazemos é uma pequena gota de água num imenso oceano, mas essa pequena gota é a pequena diferença na vida de muitas pessoas.” Na mesma viagem viveu uma situação que marcou para sempre a sua vida e percurso, numa visita ao Centro Materno Infantil de Ondame. Deparou-se com uma parturiente em árduo trabalho de parto que precisava de ser evacuada para o Hospital Central. “A decisão de ajudar esta mulher foi de imediato tomada por todo o grupo, sendo eu a eleita para acompanhar. A minha experiência de trabalho no hospital dava alguma segurança, mas a verdade é que os 60 km que nos separavam de Bissau, a velha ambulância com os buracos por baixo dos meus pés, as diversas vezes que tivemos que parar para tentar fazer o parto foram determinante e até hoje uma das experiências mais marcantes. Chegar à maternidade do Hospital Central em limite de urgência, perceber que se não se pagasse o kit de cirurgia não havia hipótese  de fazer a cesariana foi até hoje um dos maiores choques e sensação de impotência que vivi. Ter o poder de poder mudar essa realidade, só porque se pode comprar algo que aqui seria uma ida ao cabeleireiro e com isso poder salvar uma vida fez mudar tudo. Foi com este sentimento que voltei para Ondame e contei a minha experiência ao resto do grupo de voluntariado. Foi unânime que ajudar a reabilitar o Centro Materno Infantil de Ondame que se encontrava em auto gestão era a missão. De tal forma assim foi que duas semanas depois voltei à Guiné, com a Olinda Pedroso, em representação da Fundação, para assegurar a compra de medicamentos para um ano, assim como alguns donativos em dinheiro aos trabalhadores. Desde aí e até aos dias de hoje passei a integrar grupos de voluntários duas vezes  por ano, assim como as actividades do núcleo de trabalho Solidariedade Guiné da Fundação. Ao longo destes 12 anos já fui a Guiné em missão mais de 20 vezes sendo corresponsável dos projectos que vamos desenvolvendo na área da saúde e da educação. Há quem diga que a Guiné primeiro se estranha e depois se entranha... Acrescentaria que hoje faz parte do meu ADN”, partilha.

Trabalha hoje a tempo inteiro na parceria entre a Fundação e a ONG Aida, com quem desenvolvem o trabalho de evacuação de crianças para intervenções cirúrgicas ao abrigo do protocolo de saúde existente entre Portugal e a Guiné Bissau e, na data em que publicamos o seu testemunho, está de novo na Guiné-Bissau para mais uma missão.

texto por Catarina António, FEC – Fundação Fé e Cooperação
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